Sexta-feira, 26.10.12

A exibição de autoridade do Shakhtar Donetsk frente aos campeões da Europa é a prova definitiva de que na Ucrânia se começa a acreditar que o clube laranja está cada vez mais próximo da elite continental. Depois de um arranque de época memorável, Mircea Lucescu encontrou a fórmula certa para emendar os erros da temporada passada na Europa. Este Shakhtar não só será responsável pela eliminação precoce de um favorito (Juventus ou Chelsea) mas também um candidato a surpresa da época nos palcos europeus.

 

Sem Jadson, muitos perspectivavam, este Shakhtar seria menos Shakhtar. 

Afinal, o jogador brasileiro tinha sido alma e arte durante os últimos anos, protagonista absoluto das grandes noites dos homens de Lucescu e responsável dos seus piores resultados. Quando Jadson não aparecia, a equipa sofria demasiado. Agora, sem ele definitivamente, decido a provar em São Paulo a Mano Menezes que merece ir ao Mundial, os homens de laranja jogam como nunca. 

Lucescu encontrou no seu 4-2-3-1 o equilíbrio necessário para criar uma equipa fiável a todos os níveis. As exibições internas não permitem avaliar o potencial real do clube. Em nono lugar no ranking UEFA, a liga ucraniana é uma competição pouco competitiva, dominada de uma forma ditatorial pelos jogadores de Donetsk na última década com relativa facilidade. Nem Dnierp, Kharkiv ou Metalurg têm conseguido dar o salto, de forma definitiva. E quanto ao Dynamo Kiev, em constante metamorfose, joga cada vez mais o nome do que que qualidade de onze com muitos talentos individuais mas pouca coesão colectiva. A derrota por 4-1 no duelo entre ambos deixou claro as diferenças. O Shakhtar disputou doze jornadas da liga. Venceu as doze. Tem doze pontos de avanço do segundo classificado e cada vez mais corre na imprensa local a anedota que só faltaria o clube ser campeão...a doze jornadas do fim, tal é a superioridade.

Mas a Europa continua a ser o problema, a afirmação definitiva de um clube que venceu a Europe League com autoridade, em 2009, mas que na Champions nunca logrou passar dos Quartos de Final. Frente ao Tottenham, primeiro, e na passada época num grupo surpreendente em que acabou no último lugar, depois de perder em casa com o FC Porto, as desilusões têm sido, de certa forma, o motor para Lucescu procurar renovar-se de forma constante. A derrota com os dragões foi a última em casa desde então. E o Chelsea sofreu na pele essa autoridade com que os homens de Donetsk encaram cada jogo diante dos seus.

 

Lucescu entregou ao arménio Mkhitarayan a batuta da equipa e este deu o passo em frente que o confirma como um dos melhores jogadores do continente europeu.

Aos 23 anos já ninguém duvida do seu tremendo potencial. Com Jadson no onze nunca encontrou o seu lugar. Actuava de interior e perdia a liberdade criativa que fez dele uma promessa aos 17 anos na liga arménia e chamou a atenção de vários olheiros europeus. A sua liderança no ataque é evidente e fundamental. Contra a Juventus superou Pirlo com facilidade no mano a mano que mantiveram pela posse de bola. Na última terça-feira deixou a Juan Mata, um dos protagonistas indiscutíveis do ano até ao momento, em má figura. O jogo foi dele. Deu e recebeu, distribuiu e rematou. Não fosse a exibição memorável de Petr Cech e a vitória podia ter sido maior, muito maior. E justa.

Com o arménio na posição 10, Lucescu fez rodar as tropas brasileiras que dão ao Shakhtar a criatividade absoluta que os transforma numa equipa diferente. Fernandinho foi gigantesco na ponte entre o ataque a defesa, deixando a Hubchsmann as tarefas mais defensivas, tapando as subidas constantes dos laterais, o incombustível Srna pela direita e o ucraniano Rat pela esquerda. No baile ofensivo, Mkhitarayan trocava de posição constantemente com o talento genuíno de um Willian que grita por reconhecimento internacional e Alex Teixeira, a enésima descoberta dos olheiros ucranianos, sempre hábeis a recrutar as surpresas que despontam no futebol brasileiro. Na frente, Luiz Adriano actuava como um nove capaz de jogar de costas para a baliza, movendo-se entre linhas, trocando posições com os colegas, destroçando uma defesa onde Ivanovic, Terry e Cole sofrem cada vez mais com rivais móveis, como se viu com o Atlético de Madrid na Supertaça Europeia.

Esse circulo rotativo de jogadores, que engoliam Obi Mikel e Lampard (Óscar depois), foi a grande arma da vitória ucraniana que com este triunfo se consagra como o grande favorito a carimbar primeiro o apuramento para a próxima fase. Sete pontos, aos quais se pode juntar uma vitória na Dinamarca, a chegar a dez, habitualmente os necessários para seguir em frente. Os 3 da Juventus, incapaz de vencer, e os 4 do Chelsea, parecem já distantes nestas contas e agora a ambição de Lucescu é dar definitivamente o salto. Por qualidade futebolística o Shakhtar é, actualmente, uma das oito equipas do futebol europeu. Com um banco de suplentes que inclui a Ilsinho, Eduardo, Devic, Dentinho, Douglas Costa, Gai e Chygrinski, a ambição é legitima.


A vitória do Shakhtar também deixou evidente que, apesar do brilhante inicio de temporada do Chelsea na Premier League, vencendo com autoridade os rivais que se lhe atravessam pelo caminho, é uma equipa em processo de reconstrução. A equipa ainda está incomoda a ter a iniciativa de jogo e a atacar para dar a volta ao marcador contra rivais que dominam muito melhor os distintos processos de jogo. O génio de Hazard, Mata, Óscar e Ramires é evidente da mesma forma que Torres continua a ser um handicaap, mais do que uma solução, mas o que Di Matteo terá de fazer é garantir uma maior autoridade com a bola nos pés ao mesmo tempo que mantém a solidez defensiva que se tornou trademark do clube e ajudou a vencer, definitivamente, a Champions que Abramovich tanto queria. A mesma com que sonham em Donetsk, um sonho ambicioso mas não tão irreal como se possa imaginar. 



publicado por Miguel Lourenço Pereira às 11:23 | link do post | comentar | ver comentários (2)

Sábado, 16.07.11

Nas sondagens e listados oficiais sobre os grandes treinadores da história ele nunca aparece. Não surpreende. O desconhecimento na era da globalização é maior do que possa imaginar e o nome de Maslov continua a ser um mistério para muitos. O homem que definiu o futebol contemporâneo morreu sem nunca ter passado pelo passeio da fama, mas 50 anos depois o seu legado é cada vez mais evidente. Talvez nunca tenha havido um treinador tão influente na história do jogo...

A última vez dói sempre mais. A de Viktor Maslov como treinador do Dynamo Kiev deve ter doido mais ainda.

Narra Jonathan Wilson no seu essencial Inverting the Pyramid, que o técnico moscovito foi despedido no hotel de concentração do Dynamo Kiev aquando de uma viagem a Moscovo para defrontar o Spartak local. No final do jogo a equipa saiu do estádio num autocarro rumo ao aeroporto. Ninguém falava. A meio caminho o autocarro parou diante de uma estação de metro. Maslov foi convidado a sair. Baixou pesarosamente as escadas e acenou aos seus jogadores. Chorou. Nunca o tinham visto chorar.

A cena é real e significou um ponto final na carreira do mais influente treinador do futebol moderno ao serviço do clube que serviu de balão de ensaio para os seus esquemas futebolísticos. Maslov ainda viria a vencer uma Taça da URSS com o Torpedo de Moscovo, dois anos depois,  e um campeonato com os underdogs arménios Ararat Yerevan, mas a saúde débil já o minava por dentro. Em 1976 morreu na mais absoluta mediocridade e ninguém se lembrou dele durante anos até que alguns estudiosos começaram a analisar o jogo de trás para a frente e descobriram que este treinador a quem os jogadores chamavam carinhosamente de "Avôzinho", como é tão comum na Rússia a quem se tem um imenso respeito, tinha sido o mentor das grandes metamorfoses tácticas do beautiful game.

Maslov era, de certa forma, o oposto moral e emocional do seu sucessor em Kiev, o mítico Valery Lobanovsky. O que o ucraniano fez, partindo do principio cientifico, já Maslov o fazia, partindo do sentido comum que sempre orientou a sua carreira. Um técnico diferente a todos os niveis, o moscovita era conhecido por ser um dos entusiastas do modelo de auto-gestão. Consultava os jogadores para tudo e por várias vezes viu o capitão de equipa recusar que um jogador fosse substituído quando ele já tinha indicado ao suplente que se preparasse para entrar. Anos mais tarde, depois das acusações de falta de disciplina, os seus próprios jogadores vieram a público defendê-lo. Tratava-se apenas de uma mensagem que a equipa em campo recebia e respondia com a tranquilidade de que o jogo se ia resolver com os onze titulares. E sempre foi assim. Os seus registos em Kiev foram históricos e apesar da influência que detinha junto do Partido Comunista Ucraniano - que lhe permitia, entre outras coisas, recrutar vários jogadores de clubes mais pequenos com benefícios estatais - a forma como montou uma equipa capaz de desafiar o poder moscovita transformou para sempre o futebol soviético e estabeleceu as bases do que viria a ser o longevo mandato de Lobanovsky.

 

Pressing. Marcação à Zona. 4-4-2.

Palavras chave no vocabulário futebolístico de hoje mas que só existem no vocabulário desportivo a partir do momento em que Maslov as passa de um ideário em papel para o terreno de jogo. Durante os dez anos que medeiam a sua viagem ao Mundial da Suécia de 1958 e o zénite da sua equipa de Kiev, o técnico colocou em prática os conceitos que hoje fazem parte da bíblia de qualquer treinador.

Quando começou a treinar o Torpedo de Moscovo (na altura liderado pela estrela soviética Eduard Streltsov) decidiu aplicar o ideário táctico que viu na espantosa equipa do Brasil de Zezé Moreira. Entendendo, como poucos na altura, que o sucesso brasileiro dependeu, mais do que  Garrincha, Pelé e Vavá, no jogo de Didi e no posicionamento de Zagallo. Ao voltar a Moscovo começou a ensaiar um jogo de toque no meio campo abandonando progressivamente o ritmo vertiginoso do WM. O 4-2-4 foi o seu primeiro sistema táctico - um caso de precocidade na Europa - mas foi, sobretudo, o seu conceito de pressing, que revolucionou por completo a sua forma de analisar o jogo. Observando o espaço que os defensores deixavam a Streltsov, Garrincha ou Kopa, começou a trabalhar o treino de pressão. O seu quarteto defensivo, mais do que esperar pelos rivais, tinha instruções de avançar sobre eles, reduzindo o tempo de manobra do contrário. Com isso melhorou significativamente os registos de golos sofridos do conjunto moscovita, antecipando em muitas ocasiões oportunidades claras de golo. O seu sistema de pressing provocou um aceleramento do jogo e obrigou, por outro lado, a ter um meio-campo capaz de temporizar e controlar os registos de posse de bola com discrição. Maslov procurou durante toda a sua carreira a versão soviética de Didi, o homem que parava o jogo do Brasil quando todos aceleravam. No duro e rígido futebol soviético a sua missão era complicada e essa mutação táctica levou muitas vezes a situações em que a sua defesa se via forçosamente descompensada.

Em 1964, depois de oito anos em Moscovo, aceitou o desafio de orientar o Dynamo de Kiev ucraniano. Aí encontrou as armas que precisava para colocar em prática o sistema que vinha idealizando há muito. Para tal teve de livrar-se de algumas das estrelas da companhia (entre as quais o aclamado Valery Lobanovsky) e a principio a sua presença sofreu com a eterna desconfiança dos ucranianos face a um treinador que tinha feito toda a sua vida desportiva em Moscovo. Mas rapidamente a relação entre técnico e equipa atingiu níveis de imensa cumplicidade e quando Maslov começou a mexer as peças do xadrez, a equipa seguiu-o entusiasticamente. No seu primeiro ano abandonou o 4-2-4 brasileiro e inventou o que hoje conhecemos como 4-4-2. Dois anos antes dos Wingless Wonders de Alf Ramsey, o russo abdicou do jogo de alas, a quem acusava de não terem critério para funcionar no jogo colectivo, e colocou um playmaker puro (o seu Didi) atrás do duo de pontas de lança com três homens no apoio directo atrás de si. Para aprofundar ainda mais o seu sistema de pressing (que apurava com sessões de treino intensas, inusuais à época) começou a desenvolver um sistema de marcação à zona que obrigava os jogadores a estarem atentos ao espaço e não ao homem. Quando um jogador passava pelo seu marcador, para evitar um desgaste físico desnecessário e um desajuste táctico, este simplesmente deixava-o para o homem seguinte. A conjugação do pressing a meio campo, do trabalho de marcação implacável e, sobretudo, da temporização do jogo com a bola no pé, encurtando o espaço, Maslov definiu os conceitos que Rinus Michels adaptaria no seu Ajax e que entrariam no vocabulário comum como "Futebol Total". Com o seu Dynamo Kiev logrou os melhores registos, vencendo duas ligas soviéticas e desafiando os potentados europeus, apesar de ter caído, no seu melhor ano, frente ao Celtic de Glasgow que se sagraria campeão europeu depois de um duplo encontro intenso.

 

Se na marcação à zona o conceito foi emprestado (e aperfeiçoado do exemplo brasileiro) já a pressão alta e o 4-4-2 são exclusivos absolutos do homem que não foi entendido pelo seu tempo mas que, a médio prazo, abriu o caminho para a evolução táctica que o futebol iria forçosamente seguir. O ritmo de jogo e a ocupação dos espaço, hoje verdadeiro obsessão, era algo tido como supérfluo até que Maslov entendeu todo o seu potencial. A sua influência só se pode comparar a Jimmy Hogan e Herbert Chapman, definidores dos modelos de jogo continentais e britânicos nos anos 20. Enquanto o mundo se debate entre Mourinho e Guardiola, Sacchi e Cruyff, Menotti e Michels, Ramsey, Shankly, Busby e companhia, a verdade é que todos eles são um pouco melhor treinadores porque um dia o "Avôzinho" decidiu inventar o futebol moderno!



publicado por Miguel Lourenço Pereira às 14:16 | link do post | comentar | ver comentários (6)

Quarta-feira, 09.03.11

muito tempo que o futebol ucraniano começou a mandar sérios sinais de que se prepara para liderar o grupo da chamada "segunda divisão europeia". O apuramento histórico do Shaktar Donetsk recupera a herança da escola ucraniana do Dynamo Kiev lobanovskiano e deixa várias pistas para entender porque é que a Ucrânia tem de começar a ser levada mais a sério no seio do futebol europeu.

 

 

 

No final da próxima Primavera o mundo do futebol vai estar muito pendente do que suceda na Ucrânia. E não é graças a nenhuma equipa local.

O Europeu de Futebol 2012 será a consagração definitiva (e oficial) da rapidíssima evolução do futebol ucraniano desde o desmembramento da União Soviética. Se a Rússia cumprirá o seu sonho de albergar um Mundial seis anos depois, a associação com os vizinhos polacos permitirá aos ucranianos receberem a elite europeia em alta. Os problemas organizativos e de infra-estruturas eram esperados, até pelo próprio Michel Platini, mas a organização do torneio - o último com 16 equipas - espelha bem o crescimento do leste europeu, dessa segunda divisão a que pertencem também russos, romenos e gregos (e igualmente Portugal, Holanda, Suiça, Bélgica e Escócia do outro lado do continente) e que começa a ganhar outro pedigree nos palcos europeus. Uma realidade que não é nova mas que parece cada vez mais cristalina.

E o Shaktar Donetsk tem muita culpa nesta transformação. Ou melhor, o seu dono, o milionário Rinat Akhmetov.

Numa época em que o Dinamo Kiev parecia estar disposto a fazer da liga do recém-criado estado ucraniano o seu couto privado, surgiu este pequeno clube da segunda cidade do pais para contrariar o monopólio do exército de Lobanovsky. Na história da URSS o Shaktar não deixou marca ao contrário do seu grande rival, líder em títulos nacionais, taças e provas europeias conquistados durante os cinquenta anos que durou o bloco soviético. O Dynamo de Kiev, particularmente a partir dos anos 70, não só asfixiou todo o futebol ucraniano mas também serviu de farol para todo o leste europeu. Falhou o grande titulo (a Taça dos Campeões Europeus que Steaua e Estrela Vermelha, equipas do bloco conseguiram vencer) mas definiu uma era e um estilo. Em 1999 esteve perto de fazer história, como campeão ucraniano, e conseguiu chegar às meias-finais onde disputou, até ao último segundo, o acesso à histórica final de Barcelona com o Bayern Munchen. Depois, o abismo. Do Dynamo e da Ucrânia. que falhou sucessivos apuramentos para Euros e Mundiais até 2006 quando dispunha de uma geração de primeiro nível. Isto é, até chegar o homem dos milhões da SCM Holding e um dos herdeiros da oligarquia soviética. 

 

Em 1996 Akhmetov comprou o Shaktar Donetsk e declarou publicamente que iria fazer tudo para quebrar o monopólio do rival de Kiev.

Demorou seis anos. Em 2002 o clube laranja chegou ao primeiro titulo dos cinco que sumaria nos anos seguintes, incluindo o da passada temporada. O dinheiro de Akhmetov foi investido no plantel mas, essencialmente, na melhoria das infra-estruturas do clube. Criou uma Academia inaugurada em 2000 para os jovens ucranianos que procuravam uma alternativa à estrita escola do Dynamo. Os resultados começaram a surgir poucos anos depois e hoje a base do futebol jovem ucraniano depende em muito do labor dos técnicos jovens do Shaktar. Chygrinski, Krystov, Rakytitsky, Rat e Pyatov são exemplos dessa seiva de talento que aliada à sábia prospecção do mercado brasileiro, serviu para montar uma equipa segura atrás e criativa à frente. Mircea Lucescu, o mais prestigiado entre os técnicos romenos, foi encarregue a partir de 2004 de montar um clube ganhador, não só a nível doméstico. Mais uma vez, quase a um ritmo preciso de relógio suíço, o staff técnico demorou apenas cinco anos em cumprir o prometido. A vitória em Istambul da última edição da Taça UEFA frente ao Werder Bremen confirmaram o ressurgir do futebol ucraniano e a entrada do Shaktar na elite europeia. Pela porta grande.

A vitória sobre o AS Roma - depois de vencer um grupo onde pontificava o Arsenal - foi apenas a consagração aos olhos do ocidente do imenso potencial do futebol ucraniano. Vitória na Cidade Eterna e humilhação aplicado no novo e belíssimo Donbass Arena, inaugurado para ser uma das estrelas do próximo Europeu, assente num esquema táctico fluido e extremamente dinâmico. A força do leste (Srna-Chygrinski-Rakytisky-Rat-Hubschmann-Mkhitaryan) e o talento da esquadra brasileira (William-Jadson-Douglas-Adriano) suplantaram o querer mas não poder dos italianos. Futebol rápido, criativo no último terço e profundamente disciplinado na medular, não é surpresa que o Shaktar tenha conseguido o seu melhor resultado de sempre na Champions. Surpresa é que não vá mais longe ainda.

 

 

 

A ascensão do Shaktar é apenas a ponta do icebergue. Com o Dynamo Kiev aparentemente ressuscitado na Europe League (uma nova boa geração, um ritmo competitivo alto de Schevchenko, numa segunda juventude) há uma série de novas equipas na Liga ucraniana prontos para imitar o sucesso dos laranja. Com a ajuda dos seus próprios mecenas - todos ávidos de seguir o exemplo de Akhmetov e preparados para capitalizar o mediatismo do próximo Euro - Dniepr, Metalurg, Metalist, Karpaty e Chornomorets estão na linha da frente para mostrar que a liga ucraniana está preparada para assumir a liderança da "outra Europa".



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Segunda-feira, 24.01.11

Durante largas décadas o lado de lá da "cortina de ferro" foi um poço de mistérios e suspense que escondia surpresas inquetantes que deixavam sempre demasiadas perguntas no ar. Mas nenhuma realidade soube ser tão constante e enigmática como a aventura cientifica de um canalizador de Kiev que transformou o clube local no alter-ego desportivo do Bloco de Leste.

 

 

 

Nos dias cinzentos e obscuros da União Soviética era dificil escapar ao centralismo imposto por Moscovo.

No mundo desportivo, a realidade não era de todo distinta e o futebol soviético cresceu com alguns êxitos pontuais de clubes de terras distantes da praça vermelha (Lituania, Geórgia, Arménia, Ucrânia), mas eram as entidades da capital, bem distribuidas entre o poder dominante, quem impunha o ritmo de uma competição de que se sabia muito, muito pouco no Ocidente. O dominio quase asfixiante da capital chegou ao fim nos anos 70 e durante os últimos quinze anos de vida do império soviético, Moscovo tornou-se na excepção, em vez de se manter como a regra.

O motivo de tamanha desfaçatez com as autoridades do regime, um regime já de si caquético e a fraquejar claramente, começou a desenhar-se numa sala deserta da Universidade de Dniepre. Nas tardes de 1971, um antigo canalizador tornado treinador e um professor universitário com formação de cientista astrofísico passavam horas a procurar encontrar a fórmula cientifica certa para tornar um jogo conhecido pela sua imprevisibilidade, num facto consumado de rigidez matemática e cientifica.

Juntos, e durante anos, desenvolveram as suas teorias que depois foram passadas à prática. Programas computorizados, testes psico-técnicos dignos de cosmonautas e uma politica férrea de disciplina - tanto desportiva como humana - moldaram o grande caso de sucesso do futebol de leste europeu: o Dynamo de Kiev.

 

O aprendiz de canalizador em causa era Valery Lobanovsky. O seu ajudante, mentor do projecto que transformou o clube ucraniano no santo e senha do futebol soviético, o professor Anatoly Zelentsov. Juntos criaram o ideal do desportista comunista, mecanizado até ao limite.

Os treinos do Dynamo de Kiev não eram iguais aos das restantes equipas soviéticas. Antes de cada época o professor Zelentsov fazia os jogadores passar uma série de testes fisicos e psicotécnicos para controlar ao máximo a margem de erro que estes podiam cometer em cada jogo. Lobanovsky defendia que uma equipa que tivesse no final dos 90 minutos uma margem de erro entre os 12 e 15% seria invencivel. O problema estava em chegar a esses números, aparentemente sobre-humanos e, principalmente, incapazes de ser contabilizados e estudados. Os programas de dados, totalmente computorizados, estudavam as abilidades naturais dos jogadores e as suas reações ao treino fisico e psicológico. Os jogadores tinham não só de saber onde se movimentar como também eram forçados a memorizar todos os movimentos dos seus colegas. Como jogadores de futebol americano, os homens de Kiev sabiam durante os 90 minutos onde estaria cada um dos seus colegas a cada momento. Não havia espaço para a improvisação neste projecto. Mecanizados, adestrados e fisicamente preparados, os atletas de Lobanovsky tornaram-se máquinas no tapete verde. E passaram a dominar mais do que o futebol soviético.

No primeiro ano ao serviço do clube pelo qual jogou - em 1974 - Lobanovsky levou para casa o titulo, apenas o quarto do clube em quarenta anos de história. Venceria o troféu mais oito vezes até 1989. Pelo meio também ficaram as conquistas na Taça da URSS (seis no mesmo período) e os triunfos na Europa. Se o modelo parecia claramente funcionar no mercado interno (só uma bela geração do Dynamo Tiblissi e a habitual corrupção interna que permitiu pontuais vitórias do Dynamo e Spartak de Moscovo quebraram o reinado dos ucranianos) foi na Europa que Lobanovsky provou a eficácia da sua teoria. Em 1975 o Dynamo de Kiev, liderado pelo veloz e brilhante Oleg Blokhin, o primeiro jogador ucraniano a vencer o Ballon D´Or, destroçou os rivais até sumar a sua primeira Taça das Taças. Onze anos depois, em Lyon, repetiu a dose, com um claro 3-0 frente ao Atlético de Madrid. Um veterano Blokhin agora acompanhado pela geração mágica, moldada desde a raiz pelo técnico e liderada por Igor Belanov, consumou o triunfo europeu num ano dominado totalmente pelas equipas do Bloco de Leste. Faltou apenas a Taça dos Campeões, perdida em duas meias-finais, em 1977 e 1987, caindo aos pés de Borussia Monchenlagdbach e FC Porto, duas equipas onde primava...o virtuosismo individual.

 

 

 

O projecto de Lobanovsky não encontrou eco apenas no seu clube local. Seleccionador soviético durante dois periodos distintos, o técnico transformou uma titubeante selecção numa potencia mundial com performances brilhantes em 1986 e 1988, onde se sagrou vice-campeã europeia. Uma equipa composta, quase exclusivamente, por jogadores do seu Dynamo. Com a queda do Muro e a chegada da perestroika os atletas do velho lobo saltaram a cortina de ferro apenas para falhar totalmente no futebol ocidental. Nem Zavarov (Juventus), nem Mikailichenko (Sampdoria), nem Aleinikov (Rangers) nem mesmo Belanov, Ballon D´Or em 1986, (B. Monchenlagdbach), sobreviveram ao regime dictatorial e cientificamente calculado do seu mentor. Num futebol dinamico, colectivo mas com esboços constantes de individualismo, eles eram um grão de areia no meio do oceano. E naufragaram estrepitosamente. Tardou dez anos ao técnico em recriar um esboço do seu projecto original. Mas os Shevchenko e companhia já eram productos do futebol ocidentalizado. O experimento cientifico ficou escondido por debaixo dos ares da cortina, das pedras do muro, da bruma do tempo...um tempo onde foi soberano.



publicado por Miguel Lourenço Pereira às 14:18 | link do post | comentar

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