O que pode levar um dos mais sérios técnicos do futebol europeu a abandonar um projecto tão promissor em seis meses? Uma pergunta misteriosa que só Dick Advocaat saberá responder. O técnico holandês anunciou a sua saída do cargo de seleccionador belga, meio ano depois de tomar controlo dos Diabos Vermelhos. Com uma das melhores gerações da sua história, qual é o real futuro da Bélgica?
A quarta posição obtida na qualificação para o próximo Mundial diz muito sobre o actual momento da selecção belga.
Uma das históricas do futebol europeu vive há mais de uma década momentos complicados. Sem uma grande geração capaz de suceder aos Scifo e Wilmots dos anos 90, os belgas foram perdendo importância na cena internacional. E cairam posições no ranking da UEFA até tropeçarem com a mediania. Atrás de Turquia, Bósnia e Espanha, a Bélgica adormecia no meio do nada. Mas com os olhos postos no futuro. A escolha de Dick Advocaat para seleccionador era uma boa nova. O holandês, técnico de primeiro nivel, deixava o Zenith para encabeçar o processo de rejuvenescimento dos Diabos Vermelhos. Afinal, há poucas selecções no Mundo com um potencial tão grande para a próxima década. Olhando por alto para os seleccionáveis do conjunto do oeste europeu, há cerca de 20 jogadores que já são ou estão muito perto da elite. Um vácuo geracional que gerou uma colheita de primeira. Mas será suficiente?
Perdemos a conta aos nomes. Da baliza ao ataque há poucas posições onde a futura Bélgica não tem várias opções de primeiro nível.
Desde Logan Baily e Silvio Potro nas redes a uma defesa que conta com Kompany, van den Borre, Dedryk Boyata, Vertonghen, Alderweirld, Vermaeelen, Van Buyten, Lombaerts ou Pocognoli. Lembrando a força ofensiva de Lukaku, Dembelé e Mirallas e o talento do meio-campo de Hazard, Witsel, Defour, Fellaini, Radja Nainggolan, Carcela ou Marteens. Uma colheita de inveja com uma média de idades que ronda os 23 anos. Ou seja, com toda a década pela frente. Um projecto saboroso, sem dúvida, que muitos técnicos invejariam. E no entanto, meio ano depois de pegar no leme desta equipa de jovens lobos, Advocaat decide partir. Fala-se numa oferta milionária da Federação Russa, interessada em repetir com o holandês parte do sucesso logrado pelo seu compatriota Hiddink. Afinal Advocaat é bem conhecido em terras russas e deixou saudades. Mas será isso justificação? Será a Rússia uma formação com o mesmo potencial que esta equipa belga? Provavelmente não. Há, certamente, algo mais atrás desta decisão que deixa aberta uma apetecida vaga que agora começa a soar a prenda envenenada.
Não foi por acaso que numa das suas convocatórias o agora ex-seleccionador se tenha queixada de Fellaini, um dos simbolos desta nova vaga, estrela em tons afro do Everton. Como também haveria queixas sobre o comportamento violento de Witsel, a falta de compromisso de Lukaku ou até mesmo do exemplar Hazard. A geração de talentos belga, apenas similar à colheita espanhola de 99 (por onde andavam Xavi e companhia) ou à Sérvia de 2005, tem uma cara oculta. Uma das caras mais rasteiras do mundo do futebol. E isso pode cortar pela raiz um projecto que tinha tudo para ser ganhador. Verdadeiramente ganhador.
Desde 1986 que a Bélgica não logra as meias-finais de uma grande competição. No México viveu o culminar da sua geração de ouro que começou com van Himst e terminou em Scifo. Depois de uma longa seca (1 Europeu desde 1984 e 1 Mundial desde 2002), parecia que os jovens lobos e o experiente Advocaat tinham tudo para formar uma equipa de primeira. Não será assim. E de grandes esperanças, agora os jogadores belgas passarão a ter uma perigosa sombra sob as suas cabeças. Uma sombra de irresponsabilidade que terão de emendar no relvado. A partir de Setembro começa a corrida contra o tempo. Contra a história. Contra as versões mal contadas. Uma corrida que terão de ganhar. Seja com quem for.
Há vários anos que não se assistia a tantos sprints emocionantes no final de uma larga maratona. Espalham-se pelo mapa deitado do continente com forma de mulher e colocam frente a frente alguns dos colossos desportivos do futebol actual. As principais ligas da Europa vivem em suspenso. O futebol europeu arranca para as últimas quatro semanas sem reis e com muitos pretendentes para as coroas vazias.
Enquanto as pequenas ligas do continente como Portugal, Escócia, Bélgica ou Grécia já têm (ou estão prestes a ter) o campeão consagrado, pela primeira em largas temporadas não há ainda um vencedor anunciado entre o top 5 das principais ligas futebolisticas da Europa. Nem uma tem um rei coroado à falta de um mês para o final oficial de uma temporada que para muitos acaba antes. Entre as 3 jornadas (que faltam em Inglaterra e Alemanha ) e as cinco (casos de Espanha e França), há ainda mais dúvidas do que certezas. Mais candidatos do que coroados. E ao contrário da última temporada, onde só Bordeaux em França, o Wolfsburg alemão e o Manchester United tiveram, efectivamente, de sofrer até ao fim, para já ninguém pode sair à rua para celebrar. Exceptuando o caso francês, as restantes ligas pautam-se por um equilibrio inusual, com vantagens que não ultrapassam os três pontos. Uma jornada, portanto. A emoção está garantida e desmente a teoria daquelas que atacavam os principais campeonatos europeus pela falta de emoção que transpareciam. São as pequenas ligas que, cada vez mais, vivem de vencedores antecipados. Em Portugal o cenário repete-se este ano com o SL Benfica que segue os passos do FC Porto e prepara-se para festejar bem antes do fim da prova. Na Escócia o Glasgow Rangers está a apenas um jogo do titulo, enquanto que Anderlecth na Bélgica e Panatinaikhos na Grécia, já celebram o trofeu conquistado sem grandes problemas. Neste grupo só a Holanda, sempre a contra-corrente, espera uma decisão de última hora. São 90 minutos de infarto que separam os adeptos do Twente da história. E os da Ajax da esperança.
Em Espanha o improvável duelo entre Barcelona e Real Madrid continua depois do correctivo aplicado pelos azulgrana ao eterno rival no clasico de há quinze dias. O actual campeão tropeçou no duelo com o rival local, o Espanyol, e viu o clube merengue reduzir a desvantagem com que saiu do clássico para apenas um ponto. Tolerância zero para os comandados de Guardiola, mais pendentes de revalidar o ceptro europeu, e que poderão sofrer como poucos as consequências do vulcão islandês que deixou a Europa em suspenso. Sem pressão e kilometros nas pernas, os jogadores blancos vão atacar até ao final sabendo que o calendários os benificia duplamente. Nos rivais internos e na ausência de Quartas-Feiras europeias. Afinal de contas, Cristiano Ronaldo pode acabar mesmo por ultrapassar Messi.
Se em Espanha a diferença é de um ponto, a situação não é diferente em Itália e Inglaterra. Com a particularidade de que, aqui, os campeões seguem na segunda posição. Na Premier League, quando tudo parecia decidido, o último fim-de-semana voltou a revelar o lado mais emocionante da prova por excelência do Velho Continente. A superioridade do Tottenham (que dias antes tinha também ganho ao Arsenal) frente ao Chelsea, e a sorte dos Red Devils de Ferguson no duelo com o eterno rival reduziram para 1 ponto a diferença de quatro. À falta de três jornadas o clube de Londres tem tudo para vencer e um plantel na máxima força. Só que terá ainda de ir a Anfield Road. E ninguém esquece que o Manchester United já provou várias vezes saber apertar até ao último suspiro e em Old Trafford continuam a sonhar com o histórico Tetra.
No país da bota a situação é bem distinta. A AS Roma fez história ao voltar à liderança de uma prova que desde 2001 tem sido dominado pelas equipas do norte, especialmente de Milão. O Inter de José Mourinho, actual Tetracampeão, tropeçou demasiadas vezes e desperdiçou uma imensa vantagem. Agora tem três encontros para recuperar o ponto de atraso para o conjunto giallorrosso. E um duelo europeu que será a sua máxima prioridade. Todo o país está, indubitavelmente, ao lado do clube da capital. Mas isso nunca foi um problema para o técnico sadino.
Se as grandes ligas se decidem por um ponto, as duas provas mais emotivas dos últimos anos continuam a dar um particular ar da sua graça. Alemanha e França, que entre si vão, merecidamente, decidir um dos finalistas da próxima Champions, vivem os seus particulares e confusos duelos. No caso germânico a luta pelo titulo pode reduzir-se a dois, mas realmente há quatro equipas com possibilidades de levar o troféu para casa. O Bayern Munchen lidera a prova com mais três pontos que o Schalke 04, que por sua vez tem Werder Bremen e Bayer Leverkusen muito próximos. Uma luta onde já não entram Wolfsburg e Sttutgart, que por estas alturas na época passada partilhavam a liderança. O conjunto bávaro tem tudo para se sagrar, uma vez mais, campeão. Mas as ambições europeias podem complicar, e muito, a luta pelo titulo da Bundesliga. Situação similar vive o Olympique Lyon, que depois de sete titulos consecutivos, parece de novo afastado da vitória na Ligue 1. O clube lionês segue no terceiro posto mas corre mesmo o risco de estar fora da máxima prova europeia, dez anos depois. Culpa do notável Montpelier, que continua a aguentar o segundo posto e, acima de tudo, da época excepcional do Olympique Marseille de Didier Deschamps. O conjunto da Cote D´Azur está bem perto de voltar a celebrar um título, 17 anos depois do escândalo Tapie. São cinco pontos de avanço para cinco jogos por disputar. Uma luta onde ainda está o actual campeão, o Girondins de Bordeaux, que depois de apostar tudo na prova rainha da Europa percebeu que deixou demasiados pontos pelo caminho. A vitória no jogo em atraso com o Vallenciennes atira o conjunto gascão para o terceiro posto. Mas o Bicampeonato parece já, missão impossível.
As ligas europeias caminham apressadamente para o seu final. A última semana de provas domésticas do Velho Continente é a de 16 de Maio. Mas na semana anterior já se conhecerão vários campeões. Nas próximas quatro semanas vão-se revelar, a pouco e pouco, os novos reis da Europa. Duelos demasiado apertados para deixar pistas sobre os eventuais campeões. E que demonstram que, em ano de Mundial, ninguém quis abdicar de lutar até ao final. Afinal, as grandes Ligas continuam a ser as que deixam o futebol europeu em suspenso até ao final. Como num filme de Alfred Hitchcock.
Em Portugal o trabalho de Lazlo Boloni foi muito para lá da conquista do último título conquistado pelo Sporting. Preparou uma nova geração de talentos que foram posteriormente lançados pelos seus sucessores. Na Bélgica o romeno repetiu o feito. Resgatou da mediania um histórico como o Standart de Liege e explorou ao máximo a sua cantera. Entre as estrelas que foi lançando para a arena está o promissor Medhi Carcela.
Ao viajar ao mundo dos jovens talentos belgas o fácil seria ficar pelas duas grandes estrelas com idade ainda de júnior do actual campeão belga. Alex Witsel e Stefen Defour foram, efectivamente, peças-chave no estilo de jogo ofensivo instalado por Boloni no clube de Liege. E determinantes na reconquista de um título que escapava há demasiados anos. Mas este ano Defour esteve quase sempre lesionado e uma entrada violentíssima de Witsel valeu-lhe uma larga suspensão. Sem o seu fiel de balança, e com a concentração quase exclusivamente colocada na Champions League, a época do clube de Liege foi de mais a menos. De tal forma que Boloni acabou por pagar na pele o péssimo lugar na Júpiter Pro League. O técnico que encetou a revolução do clube e que lançou algumas das mais excitantes promessas do futebol europeu pagou cara a falta de resultados. Mas, tal como sucedeu em Alvalade (onde fez estrear, entre outros, Cristiano Ronaldo) a semente do seu trabalho ficou. Para além de Kevin Miralles (agora a jogar em França) e dos já citados Witsel e Defour, fica na retina o notável médio de origem hispano-marroquina. Carcela é o verdadeiro produto do “melting pot” em que se está a converter a Bélgica. Filho de pai espanhol e mãe marroquina, o jovem deu, num espaço de meses, o salto entre a equipa júnior do Standard até à selecção principal dos Diabos Vermelhos.
Carcela é um médio extremamente ofensivo. Jogando pelo eixo ou descaindo ligeiramente para o flanco esquerdo, utiliza a velocidade e o remate como principais armas. Joga habitualmente atrás de um ponta-de-lança mais fixo – Mbokani – e com a dupla Defour-Witsel nas suas costas. Na selecção compete directamente com outra das mais requisitadas promessas do futebol europeu, o jogador do Lille, Éden Hazard. Esquerdino, flecte habitualmente em diagonais perigosíssimas como pode perceber a defesa hábil do Arsenal no épico encontro entre ambos os colectivos na fase de grupos da Champions League. Por essa altura já Boloni tinha confirmado o médio de apenas 20 anos como titular indiscutível, chamando à atenção do novo seleccionador belga, o holandês Dick Advocaat. Semanas depois foi a vez de este dar a oportunidade a Carcela estrear-se pela selecção principal sem nunca ter passado pelas equipas de formação.
Até agora o médio apontou já seis golos na prova principal do futebol belga e dois mais na taça local. Na Champions League fez parte do onze base do conjunto belga mas foi na passada edição da Supertaça, com dois golos certeiros, que começou a coleccionar galões junto dos adeptos.
O seu futuro, aliado ao dos seus inseparáveis colegas de formação, está inevitavelmente longe de Liege. Os grandes da Europa têm o trio debaixo de olho e a ausência das provas europeias que ameaça o Liege poderá obrigar o clube a vender as suas pérolas. Mais importante ainda, o trabalho revolucionário de Advocaat à frente da selecção belga poderá reservar-lhe um papel importante no ressurgimento desportivo de uma das grandes potências futebolísticas do Velho Continente há muito adormecidas.
As comparações com Didier Drogba tornaram-se inevitáveis. É provavelmente a carreira jovem mais surpreendente de todo o ano. Com apenas 16 anos Romelu Lukaku é hoje a mais cobiçada pérola do Velho Continente. Valores astronómicos rodeiam o jogo que provou ser uma autêntica força da Natureza.
Romelu Lukaku está nas bocas de meio mundo. A sua precocidade parece não ter limites e não há gigante europeu que não tenha enviada a sua oferta milionário ao Constant van der Stock. Mas, de momento, o Anderlecth mantém-se imutável. E o jogador concentrado. É a sua primeira época como profissional. Apesar da sua estreia oficial ter ocorrido em Maio do ano passado, no final da liga belga, só este ano Lukaku foi promovido à equipa principal do Anderlecth. O culminar de uma história de sonho de um jovem que conta com 16 anos recém-cumpridos e uma vontade férrea de engolir o mundo.
Lukaku é filho de um internacional congolense mas nasceu em Bruxelas em Maio de 1993. Faz parte de uma geração de jovens promessas da formação belga que tem despertado o interesse dos grandes europeus. Mas o seu caso é especial.
Descoberto por um olheiro do FC Bruxels, aos 13 anos enquanto jogava pelo Lierse, o jovem Lukaku começou a treinar com a equipa juvenil do modesto conjunto da capital da Bélgica. Em 68 jogos pela equipa juvenil apontou 68 golos e tornou-se no máximo goleador do futebol de formação belga. Rapidamente foi convocado para os sub-19 do seu país com apenas 15 anos. E chamou à atenção dos responsáveis do Anderlecth. Estes não hesitaram em contratá-lo por uma boa maquia - os números nunca foram divulgados - e começaram por colocá-lo a jogar na equipa dos juniores. Em três anos o jovem actuou em 88 jogos e apontou 126 golos. No final de 2009 foi promovido à equipa principal do Anderlecth para treinar com o conjunto de titulares. Já começavam a chegar as propostas mas o clube apressou-se a oferecer-lhe um contrato de três anos. O avançado assinou sem problemas e uma semana depois estreava-se na Liga Jupiter Belga. Não marcou mas na semana seguinte voltou a jogar como suplente e desta vez sim, apontou o seu primeiro golo como profissional. E tornou-se no mais jovem goleador da liga belga.
Este ano a sua ascensão foi meteórica. Aos 16 anos não é ainda titular mas é sempre a primeira opção do actual lider da liga belga. Actuou já em 15 jogos e apontou 9 golos. É um dos melhores marcadores da liga e na passada semana fez história ao apontar o seu primeiro golo nas provas europeias. Um golo diante do Ajax, curiosamente a base da formação europeia, que o tornou no terceiro mais jovem goleador da prova, ultrapassando outro prodigio que despontou este ano, o basco Iker Muniain. Um golo que valeu ouro para o seu clube e que o catapultou de novo para as primeiras páginas. O Chelsea procura nele o sucessor do marfilenho Drogba, enquanto que Barcelona, Inter, AC Milan, Arsenal, Man Utd, Bayern e Real Madrid já fizeram saber que estão interessados na pérola belga. Ainda internacional sub-21, o novo seleccionador belga, Dick Advocaat, já fez saber que conta com ele para a anunciada revolução que abrirá passo a outras promessas como Witsel, Defour, Dembele, van den Borre, Kompany e companhia.
Possante e alto (tem 1m92), o jovem Romelu Kukaku é o protótipo de touro de área que revoluciona qualquer jogo. Incapaz de domar pela defesa, descai habitualmente no flanco onde pode utilizar todo o poder explosivo que o transforma numa máquina goleadora. Os seus números são perfeitamente anormais para a sua precoce idade. O futuro pertence-lhe por completo. Lukaku é um nome de ouro a reter para o depois de amanhã!