Segunda-feira, 02.06.14

Pelé disse que podia ser o seu sucessor. Num torneio juvenil ofuscou Del Piero e Verón. Para muitos era a maior promessa do futebol moderno, o protótipo do jogador ideal. E de repente, do nada, Nii Lamptey desapareceu do radar. Esta é a história de um dos maiores fracassos da história do futebol.

Treze clubes. Dezoito anos. Tantos sonhos desfeitos.

Aos dezassete anos Nii Lamptey era a grande sensação do mundo do futebol. Cinco anos depois o seu nome tinha caido no esquecimento. O que se passou a seguir foi uma soma de desencontros que transformaram a precoce estrela ganesa num jogador fantasma. No símbolo perfeito da jovem promessa que nunca chega a mais. Por muito boas cartas de recomendação que traga debaixo do braço.

Nii Lamptey foi um dos maiores fracassos da história do futebol porque se lhe exigiu um nível de excelência que o jovem ganês nunca teve. Em 1991 espantou o Mundo com uma série de memoráveis exibições no Campeonato do Mundo de sub17 que se disputou em Itália. Para muitos era o principio de uma grande carreira. Acabou por ser o fim antes de tempo. Nos campos italianos Lamptey jogou contra jovens da sua idade, sem a pressão de ser uma referência do protótipo ideal de futebolista africano, o jogador do século XXI segundo Pelé. Nunca a melhor pessoa para prever o futuro do que quer que seja. Nesse torneio juvenil o Gana saiu triunfador depois de bater a Espanha na final. Não surpreende muita gente que dessa selecção espanhola nenhum jogador tenha dado o salto à fama. Os grandes jogadores da competição cairam no principio da competição. Alessandro Del Piero, Juan Sebastian Verón, Leandro, Mauricio Gallardo, tudo futebolistas referenciados mas na sua fase de formação. No meio deste circuito de futuras, mas ainda anónimas, estrelas, o nome de Lamptey brilhou mais alto. Ganhou o prémio ao melhor jogador do torneio o que raramente é bom sinal para o futuro. A partir desse momento tudo o que alguém predice que fosse passar não aconteceu.

 

Lamptey chegou a Itália com um contracto assinado no ano anterior com o Anderlecht.

O clube belga, com boas relações com vários olheiros africanos, tinha-o descoberto quando despontou no campeonato do Gana com apenas quinze anos. Á época os clubes belgas não podiam alinhar jovens com menos de dezassete anos mas o impacto mediático de Lamptey foi tal que a lei foi alterada e o jovem tornou-se no mais precoce futebolista da história do futebol belga. Em 1993, com apenas dezanove anos, Lamptey trocou o clube de Bruxelas pelo PSV Eindhoven. Chegava para substituir o mito Romário que tinha acabado de assinar pelo Barcelona. Não durou uma temporada no clube. Os seus golos acenderam os campos da Eredevise e chamaram a atenção da Premier League. Apareceu o Aston Villa em cena e contra toda a expectativa, Lamptey aceitou abandonar o clube campeão holandês pelos Villains. Foi o principio do fim. Com o dinheiro ingressado pela transferência o emblema de Eindhoven foi contratar ao Brasil uma jovem promessa chamada Ronaldo Nazário.

Em Birmingham, por outro lado, Lamptey foi incapaz de manter a qualidade das exibições dos anos anteriores. Vitima de um contrato leonino com o seu empresário, o italiano Antonio Caliendo, o jovem jogador ganês não tinha qualquer voto na matéria no que à sua carreira dizia respeito. Vitima de abusos por parte dos pais, incapaz de ler e escrever, Lamptey era um boneco partido nas mãos de um titere desejoso de sacar o máximo lucro possível. Nos anos seguintes Lamptey continuou a ser convocado regularmente para os jogos da selecção do Gana(foi medalha de bronze nas Olimpiadas de 1992 e de prata no Mundial sub20 de 1993) mas cada ano que passava era forçado a actuar por um clube diferente. Passou por Coventry, Venezia, Santa Fém Ankaragucu até que chegou ao União de Leiria. Apenas sete anos depois de ter tido o Mundo aos seus pés o jogador que Pelé tanto admirou passou a maior parte da temporada no banco do velho Magalhães Pessoa na capital do Lis.

Lamptey tinha vinte e cinco anos e metade da sua carreira tinha passado como um cometa por um buraco negro. A restante não correria melhor destino. Quebrado o contrato com o seu agente, Lamptey viu-se só num mundo apenas interessado na próxima grande estrela. A morte do seu filho mais novo apenas contribuiu para aumentar a sua progressiva depressão. Cansado do futebol, mudou-se para o continente asiático onde passou os cinco anos seguintes a jogar em equipas de segundo nível, mais interessadas em contar com uma antiga grande promessa do que no seu valor real como futebolista. Da Ásia, Lamptey voltou a casa, ao continente africano, jogando pelo histórico Assante Kotoko antes de acabar a carreira na África do Sul. Quase duas décadas depois de tudo ter começado.

 

Na infância, Lamptey passou noites a dormir nas ruas para não ter de voltar a casa onde sabia que lhe esperava, invariavelmente, uma série de abusos reiterados por parte de um pai alcoólico e uma mãe depressiva. O futebol parecia ser a sua única tábua de salvação. Agarrou-se a ele com todo o desespero de um náufrago. Mas nesse mundo de interesses que sempre rodeia o desporto-rei, tornou-se em presa fácil de interesses paralelos e na epitome perfeita da necessidade constante de criar génios futuros a um ritmo cada vez maior. Todo o talento que Lamptey tinha não foi suficiente para triunfar. Faltou tudo o resto. O futebol não viveu verdadeiramente tudo o Lamptey tinha para oferecer porque decidiu exigir dele antes que fosse algo que não estava destinado ser. E assim acabou a história maldita de uma promessa que realmente nunca o foi. A do maior fracasso da história do futebol recente.



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Domingo, 28.10.12

O triunfo do Benfica com golos de dois portugueses que têm sido actores mais do que secundários nos planos de Jorge Jesus reabre a questão de qual é o verdadeiro problema do futebol nacional. Jorge Jesus e os restantes técnicos das equipas de topo pode funcionar como uma boa resposta, particularmente quando afirma sem complexos, mais do que a sua habitual incapacidade comunicativa, que este tipo de jogadores para a prova nacional "vai dando". Um atestado de incompetência ao futebolista português que não deve surpreender. Há uma década que os jogadores nacionais são tratados assim.

 

Ao mesmo Gil Vicente que foi uma das revelações da passada temporada, graças ao brilhante trabalho de Paulo Alves, o FC Porto não conseguiu vencer com uma equipa que ainda tinha Hulk.

Esse mesmo conjunto de Barcelos acabou derrotado, sem grandes problemas, por um 3-0 contundente com dois marcadores surpresas. Não foram nem Rodrigo nem Cardozo, nem Nolito ou Gaitán. Os golos de Luisinho e André Gomes não foram fruto da casualidade. Pela primeira vez na época, talvez pela primeira vez desde que relançou a carreira de Fábio Coentrão, Jorge Jesus apostou em jogadores portugueses de perfil baixo e obteve lucros. Dois jogadores que, sem ser mediáticos, estiveram à altura das circunstâncias num terreno complicado de visitar e que responderam com golos e qualidade de jogo, algo que tem faltado a uma equipa que não termina de se encontrar. Jesus não se decide pelo modelo de jogo a seguir, depois da saída de Witsel, e muito menos pelo onze titular. Uma rotação constante e talvez excessiva que não permite encontrar um ritmo colectivo comum, talvez consequência dos erros das épocas passadas, épocas em que o Benfica esgotava o balão de oxigénio até metade da época e depois revelava-se incapaz de cumprir os objectivos. Afinal de contas, em três épocas, o técnico tem apenas um título de liga para presumir depois de ter contratado quase meia centena de jogadores.

Jesus, que é um conhecedor profundo da realidade do futebol português, habituado a viver até há bem pouco tempo no universo dos clubes que lutam para sobreviver, deveria ser o primeiro a saber a avaliar a real capacidade de um jogador nacional. No entanto, salvo Fábio Coentrão, a sua gestão como treinador do Benfica levou o último clube a contratar um estrangeiro entre os grandes a deixar de alinhar com portugueses provocando em algum momento da sua gestão a saída de Nélson Oliveira, Carlos Martins, Hugo Vieira, Mika, Ruben Amorim, Eduardo, César Peixoto, Nuno Gomes ou David Simão. Para o seu lugar, dezenas de jogadores estrangeiros com perfil suspeito que, na maioria dos casos, não passam seguramente para a posteridade do livro de honra do clube. 

Jesus não é diferente da maioria dos treinadores portugueses. André Villas-Boas, Vitor Pereira, Domingos Paciência ou Jesualdo Ferreira, para centrar-nos nas figuras de topo, não foram propriamente amigos do jogador português, relegando-os demasiadas vezes para um segundo plano mediático e desportivo injustificado. Como consequência dessa realidade, hoje a liga portuguesa continua a ser um oásis de oportunidades para as jovens promessas que procuram, como outros jovens do país, sucesso noutras paragens. Os casos de Bruno Gama, Paulo Machado, Vieirinha, Salvador Agra, João Freitas, Danilo Pereira estão aí e não há nenhum plantel de um grande português que possa presumir de ter, nos seus 25 jogadores, atletas melhores e mais bem preparados do que estes para ter um papel importante na equipa. Agora e amanhã.

 

Se Jesus não acredita que André Gomes, Luisinho, André Almeida ou Miguel Rosa têm um real potencial de futuro mas encontra-o em Melgarejo, Ola John, Enzo Perez ou Bruno César, parece claro que a realidade dificilmente mudará nos próximos anos.

As equipas B têm dado os primeiros passos para recuperar o tempo perdido e começam a ver-se as diferenças entre a gestão do Sporting, forçado tantas vezes a recorrer à prata da casa (apesar da última gestão presidencial ter mudado a política, para pior), que lidera a Liga Orangina, para a do FC Porto, que há muitos anos que deixou de procurar manter o espírito do dragão em casa e procura nos negócios sul-americanos lucro para manter a estrutura gigantesca criada à volta da sua SAD viva. O Benfica, encontra-se no meio, com jogadores de potencial para explorar mas com um treinador, que apesar do apoio da imprensa, tem-se mostrado incapaz em três anos de o fazer com jogadores nacionais potenciando a sua inevitável saída para outras partes. 

Num exercício oportunista de pura retórica, poderia formar-se um onze de jogadores nacionais só com futebolistas lusos descartados ou sem tempo de jogo entre os três grandes para descobrir que Mika, Luisinho, Tiago Ilori, Tiago Ferreira, Nuno Reis, João Mário, Sérgio Oliveira, André Gomes, André Almeida, Bruma, Hugo Vieira, Castro, Nélson Oliveira, Adrien, André Martins ou Ricardo Esgaio estão aí, à espera da sua oportunidade.

Em 1991, quando Portugal venceu o seu segundo Mundial de sub-20, numa tarde inesquecível para o futebol português, a maioria dos jogadores presentes no estádio da Luz já tinha disputado minutos com a primeira equipa do seu clube. Uma época de crise que forçou os clubes a virar-se para a prata da casa. Antes da lei Bosman, antes da liberalização do mercado, sim, mas com um olho agudo numa geração de jogadores que teve oportunidade de mostrar o que valia. Nem todos chegaram longe, muitos ficaram logo pelo caminho e uns tornaram-se Luis Figo e Rui Costa e outros Paulo Alves e Fernando Brassard. Mas o facto de terem tido a oportunidade significou que a base do sucesso da Geração de Ouro se fez à base de minutos nas pernas em jogos competitivos, não de retóricas falsas e oportunistas. 

Os realmente bons emigraram cedo, os que tiveram nível para permanecer nos clubes de topo fizeram parte da história da liga portuguesa na década seguinte e houve, inevitavelmente, aqueles que a história esqueceu. Se a situação não se alterar rapidamente, esta lista hipotética de 16 jogadores, uma equipa na sua essência, pode seguir esse caminho.

Jesus teve o mérito de colocar os jogadores em campo mas retirou-se a si mesmo o prazer do sucesso ao criticar o seu real valor e - com ele - o valor da liga portuguesa que é, no fundo - apesar de na sua cabeça o Benfica ser um candidato a vencer a Champions League - o seu objectivo real. Aquele que tem falhado nos últimos anos apesar de ter tido todas as condições para fazer bem melhor. As suas palavras, honestas na sua essência, não deixam de espelhar o que se passa nas entranhas do futebol de um país que teve uma selecção finalista num Mundial de sub-20 para agora não contar com nenhum jogador dessa equipa como, e já nem dizemos titular, suplente regular nas suas formações de topo. Enquanto o Braga se "nacionaliza", com jogadores nacionais descartados pelos grandes (Viana, Amorim, Micael, Coelho, Beto), os grandes mergulham no mercado para procurar soluções que encontrariam mais baratas dentro de portas. Mas sem paciência, sem tempo e sem vontade de remar com um objectivo comum (basta ver o número de jogadores estrangeiros nas equipas B, especialmente na do FC Porto), há pouco mais que se possa fazer.

 

Portugal, que sobrevive com a mesma geração há largos anos sem poder apresentar alternativas válidas, sofre com a cegueira dos dirigentes e técnicos dos seus principais clubes. Há uma geração de futebolistas que, com minutos nas pernas, como demonstra Pizzi na Corunha, pode dar um salto qualitativo importante que permite uma renovação sustentada à medida que os Moutinho, Ronaldo, Pepe e companhia se comecem a aproximar da idade limite. Nomes com potencial não faltam e aos 16 citados poderiam juntar-se mais uma dezena de jogadores espalhados pelo estrangeiro ou por equipas portugueses de menor perfil. Falta confiança, faltam jogos, faltam erros, faltam momentos que definem carreiras para inverter a tendência. Os golos e exibições de Luisinho ou André Gomes são uma boa notícia para quem acredita que nada está perdido. As palavras de Jesus uma arma útil para os pessimistas que pensam que, apesar da qualidade, o futebolista português está condenado ao ostracismo. Tal e qual como o país e as suas gentes.



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Domingo, 12.08.12

Foi o homem que marcou o golo decisivo que confirmou o regresso do West Ham United à Premier League. Oito anos depois de estrear-se na máxima competição inglesa, o avançado português está de regresso para provar definitivamente o seu valor. Foram oito anos de expectativas, desilusões para mergulhar agora numa ressurreição inesperada.

 

Foi colega de equipa de Nani no Real Massamá mas a carreira de ambos mudou radicalmente no dia em que o Sporting contratou o actual extremo do Manchester United enquanto Vaz Tê preferiu marchar para Inglaterra e assinar com o Bolton Wanderers. Prometeram fazer dele uma estrela, um sonho que qualquer jovem alimenta. Que dizer de um rapaz que aos dois anos deixou Lisboa para viver na Guiné-Bissau de onde o pai era natural e que aos 11 anos voltou à capital portuguesa, passando as horas com a bola nos pés no cimento frio dos subúrbios da cidade. O Bolton oferecia-lhe mais do que o clube leonino e à primeira vista parecia a melhor opção. Mas não foi.

Enquanto Nani amadurecia em Alcochete, até se tornar num dos melhores jogadores portugueses da década, Vaz Tê passou de grande promessa a maior desilusão. 

Estreou-se pela primeira equipa em 2004. Tinha apenas 17 anos. Contra o Middleslbrough na Premier League. Parecia um inicio entusiasmante mas a ilusão desfez-se. No ano seguinte, ainda com 18 anos, participou em 30 jogos pelo Bolton, sete como titular, e começou a representar as selecções de formação portuguesas, primeiro a sub-19 e mais tarde a sub-21. Mas depois chegaram os empréstimos, parte da cultura da gestão inglesa de jovens promessas. E com os empréstimos chegaram as lesões, as desilusões e o protagonismo inicial foi-se perdendo. Primeiro ao serviço do Hull City, depois com os gregos do Panonios. Sam Allardyce tinha deixado o Bolton, ele que apostara nele no inicio, e o novo staff técnico não parecia interessado em recuperá-lo. A sua carreira parecia sofrer o mesmo destino de tantas outras: o esquecimento.

 

Em 2010 o jogador desvinculou-se oficialmente do Bolton. Ninguém parecia interessado em contratá-lo e acabou por rumar à Escócia onde jogou uma época com o Hibernians. Depois voltou a Inglaterra para disputar o Championship com o Barnsley. Em nenhum dos casos chamou a atenção e relembrou o jogador que podia ter sido. Mas havia um homem que não se tinha esquecido do que Vaz Tê era capaz.

Sam Allardyce era técnico do recém-despromovido West Ham United. Sem dinheiro para investir aproximou-se de Vaz Tê no mercado de Inverno e desafiou-o a mostrar o que realmente valia com a camisola dos Hammers. Amor à primeira vista define perfeitamente esta história até agora. O dianteiro português renasceu e realizou uma época inesquecível.

Apontou dez golos e realizou cinco assistências em quinze jogos. Encaixou às mil maravilhas no esquema de ataque dos londrinos e quando a época chegou ao seu final, e o West Ham United foi forçado a disputar os play-off para lograr a promoção, Vaz Tê deu a sua melhor versão. No jogo decisivo, em Wembley, frente ao Blackpool, marcou o segundo e decisivo golo. O golo que permitia aos Hammers voltar à elite. O golo que o reconciliava consigo mesmo.

 

Ao lado de Carlton Cole, outro goleador maldito, o dianteiro português é a grande esperança dos adeptos do West Ham para a próxima época. Será a primeira temporada completa ao serviço do clube e se mantiver o mesmo rendimento que deu nos cinco meses da temporada passada, ninguém descarta que, mais cedo que tarde, Ricardo Vaz Tê cumpra o velho sonho de ser internacional pela selecção portuguesa. Face ao deficit crónico de goleadores, a ressurreição do dianteiro é uma das melhores noticias para o futebol nacional. A oportunidade está aí.



publicado por Miguel Lourenço Pereira às 11:02 | link do post | comentar | ver comentários (6)

Segunda-feira, 19.03.12

O futebol espanhol vive a sua era mais dourada e a rapidez com que se descobrem novas pérolas no país vizinho há muito que se transformou num case-study profissional. Mas é em Lisboa que vive e deslumbra talvez o avançado espanhol com maior projecção futura. Rodrigo rompe as regras e desafia os cânones, une os dois lados do “charco” e, sobretudo, eleva o futebol à condição de arte imaculada.

 

Nelson Rodrigues, um dos mais certeiros filósofos futebolisticos brasileiros, explicava a facilidade que os seus conterrâneos tinham em controlar a bola com o fascinio brasileiro pela dança. Essa paixão pela herança negra da capoeira, pelo ritmo trepidante do samba metamorfoseou-se num futebolista incapaz de estar quieto, hábil de pés, rápido nos gestos e sublime no movimento. Essa escola centenário produz com espantosa regularidade novos talentos mas o traço distinctivo continua a ser o mesmo.

O que faz de Rodrigo um caso especial é que à sua herança genética brasileira, demasiado evidente na forma como encara o rival e pisa a bola, está também a sua formação europeia, a sua cultura colectiva à espanhola que aprendeu em Vigo e Madrid e que o transformam num jogador colectivo com rasgos individuais espantosos. Uma mistura sempre dificil de conseguir, especialmente nesta era de re-fordização do futebolista, e que o transforma ainda mais num caso raro. O papel de Rodrigo no terreno de jogo não se prende a nenhum dispositivo táctico. A sua facilidade de dar e receber permite-lhe mover-se com total liberdade pelo tapete verde sem sentir-se preso a nenhum esquema. Rápido, intuitivo e com um sentido posicional tremendo, a forma como encara a baliza é só uma consequência da sua maturidade como futebolista e não apenas a causa do seu sucesso. Os seus golos, tantas vezes espantosos pela sua audácia, transpiram o mesmo controlo interior com que trata cada lance, cada passe, cada corrida nunca dada por perdida. Nele vemos reflectido o espelho perdido da glória passada e a imagem do protótipo romântico do futuro.

 

O crescimento futebolistico de Rodrigo está associado ao do jovem Thiago Alcantara. Ambos aprenderam a caminhar e a dar os primeiros pontapés na bola juntos e durante anos foram parceiros inseparáveis nos niveis de formação do Celta de Vigo. Quando chegou a hora de decidir, Thiago preferiu migrar a La Masia. Rodrigo optou pela Fabrica de Valdebebas.

Desde então percebeu-se que a sua relação era a metáfora perfeita da forma como as canteras dos dois maiores clubes espanhóis são espelho da importância que estes dão à sua formação. Thiago foi mimado e educado para entrar na primeira equipa desde que começou a dar nas vistas na equipa juvenil. Rodrigo brilhou talvez mais ainda nas suas etapas de formação em Madrid. Mas nunca teve minutos nos séniores e foi despachado com surpreendente facilidade. O Benfica aproveitou o brinde (o mesmo sucedeu com Javi Garcia) e conseguiu o passe do dianteiro por uma infima parte do seu valor actual. Mas a adaptação não foi fácil e depois de um empréstimo pouco fructifero ao Bolton Wanderers muitos pareciam tentados a vender o jovem talento. Jorge Jesus acabou por inclui-lo no plantel e depois de um brilhante Mundial sub-20, o hispano-brasileiro deu-lhe razão. Apesar da explosão de Nolito, da classe de Gaitan e da preponderância de Aimar, o conjunto encarnado não tem um jogador nas suas filas com a mesma qualidade individual e potencial de crescimento como Rodrigo.

O seu papel na boa temporada do clube da Luz é inequivoco e a sua facilidade de associação com a linha avançada do meio-campo encarnado espelha bem a sua cuidada e esmerada formação na escola espanhola que tão bons jovens jogadores tem apresentado ao Mundo.

 

Parece evidente que o nivel de Rodrigo significa que dificilmente o Benfica o conseguirá segurar para o próximo ano. Em Espanha o seu nome começa a ser reclamado pela imprensa para La Roja e vários clubes de primeiro nivel europeu sonham com os seus serviços. A passagem por Portugal pode revelar-se curta, mas fundamental na sua afirmação profissional. O que parece evidente é que o futuro de Rodrigo, como o do seu amigo Thiago, não parece ter limites.



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Segunda-feira, 05.03.12

Na fechada sociedade espanhola, onde o nacionalismo profundo ainda funciona como arma de arremesso e defesa, várias vezes a frase “se não fosse espanhol” refere-se a nomes nacionais que não conseguem, fora de portas, o mesmo impacto mediático. Poucas vezes têm razão, mas com Iker Muniain é preciso fazer uma excepção. A explosão e génio do jovem basco é seguramente um desses momentos que no futuro será recordada em perspectiva como o principio de algo verdadeiramente grande!

 

Muitos lembram-se do primeiro jogo de Raúl, em Zaragoza.

Ou do aparecimento de Fernando Torres do nada num Atlético de Madrid em ebulição. Há certamente mais gente que jure a pé juntos ter visto o primeiro jogo de Andrés Iniesta do que a que realmente viu. Iker Muniain começa a entrar nesse capitulo de lendas e mitos do futebol espanhol. Com 19 anos tem todas as condições para ser um dos jogadores mais desiquilibrantes do futebol europeu. Espanha seguramente será demasiado pequena para a memória futuro da sua aventura futebolistica.

Num país que aprendeu a glorificar o futebol de toque curto, o tiki-taka idealizado por Andrés Montés e levado à prática pelos homens de Aragonés em 2008, começam a escassear os génios rebeldes, irreverentes e profundamente verticais. Muniain é o último filho dessa escola que em Barcelona, por exemplo, significa a diferença entre o jogo de Lionel Messi e a orquestra que o rodeia. Muniain transmite as mesmas sensações do argentino, a mesma precocidade e o mesmo crescimento táctico ao lado de uma orquestra que Bielsa, como Guardiola, ajudou a montar. Com Ander Herrera, Oscar de Marcos, Javi Martinez e Fernando Llorente, o jovem extremo, falso avançado, vendedor de sonhos, transformou San Mamés num dos locais obrigatórios de passagem para os amantes do futebol puro de ataque. As suas trepidantes diagonais, desafiando cada defesa para um duelo de espada com hora marcada, rasgam as tácticas mais maleáveis e desafiam a pura lógica. A sua chamada à selecção principal, na convocatória que será a ante-camara do próximo Europeu, não é só justa e tardia, como também elucidativa do seu impacto real num plantel que, com o alemão, é actualmente o mais exigente do Mundo.

 

Sobre as origens e expectativas que despertava Muniain nos seus principios, escrevemos aqui, em 2008.

Passaram três anos e a promessa fez-se certeza, o descaro fez-se confiança e os minutos transformaram-se em titularidades inquestionáveis. Muniain ajudou a revolucionar o estatuto de um Athletic Bilbao em baixa e a relançar o impacto social de um clube que é, efectivamente, o terceiro grande de Espanha.

No palco europeu tem transformado a sua classe em arma decisiva e o próximo duelo, frente ao Manchester United, parece mais equilibrado do que nunca graças a ele. Talvez porque os Red Devils, salvo Wayne Rooney, não contem com um jogador tão apaixonante como ele. Talvez porque o seu estilo de jogo lembra, cada vez mais, o de grandes heróis pretéritos da Premier League. Se em Espanha o estilo de Muniain ainda é olhado relativamente de lado – por contraposição à calma de Iniesta, Xavi, Silva e companhia – em Inglaterra o seu estilo de jogo encaixa perfeitamente com o ideário local. Não é por acaso que, mais de 100 anos depois, San Mamés continua a ser um campo iminentemente britânico, tanto na forma como na essência.

Dentro desse espectro moral o crescimento desportivo do número 19 do Athletic Bilbao levanta as mesmas dúvidas que, em algum momento, passam pelos nomes que destacam na “Catedral”. O mesmo passou a Julen Guerrero, no seu flamante aparecimento. A vontade de um clube que apenas emprega jogadores bascos em manter a sua maior estrela já ficou evidente nos sucessivos acossos a Fernando Llorente. Dificilmente o clube mudará a sua posição com Muniain com quem o riojano forma uma dupla letal o que implica um aumento considerável do seu preço de mercado e a possibilidade real de que nos próximos anos o extremo se mantenha como rojiblanco. Uma realidade que o próprio jogador não parece desdenhar, sabendo que em San Mamés tem a tranquilidade necessária para ir sempre um pouco mais além a cada jogo, sem o peso dos focos mediáticos que acossam outros dos grandes nomes da cantera espanhola.

 

O público espanhol tem certa tendência em cair no excesso de vitimismo, mas a verdade é que na Europa se escreveu muito menos sobre Muniain que sobre Gotze, Hazard, Balotelli, Neymar, Thiago ou Whilshere, talvez o sexteto de jovens promessas internacionais mais fascinantes. E, no entanto, vendo-o jogar, é dificil acreditar que o basco está longe desse nivel máximo de expectativa e certeza. Muniain está claramente entre a elite do futebol mundial e como sucedeu com os grandes nomes saídos da formação espanhola, o seu estatuto de estrela da próxima década parece, definitivamente, assegurado.



publicado por Miguel Lourenço Pereira às 12:09 | link do post | comentar | ver comentários (3)

Sexta-feira, 13.01.12

algo nos pés dos jogadores canários que se assemelha à calma das ondas quando se aproximam das ilhas que África perdeu há tantos milhões de eras atrás. A areia fina escorre pelos pés e dá forma à chuteira, a bola desliza suavemente a cada golpe e o momento de génio, mesmo antes da decisão, permite guardar na posteridade um riso no olhar. Nessa escola perdida e imemorial, a de Silva e Valeron, vive agora o talento de Jonathan Viera, um filho da areia com os olhos perdidos no tempo.

Aos 22 anos para muitos surpreende que um génio consumado como Viera ainda durma tranquilamente na sua casa de familia em Las Palmas.

Afinal será verdade esse mal-dito bem castelhano que faz referência ao que de fora é melhor, ao de casa desconfiar? Poucos motivos mais há para entender que nenhum dos 20 clubes da Liga BBVA tenha decidido a arriscar-se aos pés de um jogador chamado a marcar uma era nessa evolução histórica do futebolista canário. Desde há várias décadas que das ilhas atlânticas saem jogadores distintos, de fino corte, capazes de romper com o expectável. Assim era Juan Carlos Valeron quando na Coruña, esse outro rosto do Atlântico, se emergiu em figura superlativa do futebol técnico made in Spain. Assim é, agora, esse génio indomável David Silva, a quem Mourinho não quis, a quem Guardiola não confiou e que em Manchester começa a causar um impacto tão lendário no City como Cantona logrou com o United há vinte anos atrás.

Viera pertence a essa escola, não precisamos de mais de 15 minutos para sabê-lo com certeza (aos 10 já o desconfiávamos), e isso significa que no seu jogo vem o bom e o mau, as noites perdidas em festas nas ruas quente de Las Palmas e os golos e passes impensáveis que destila cada vez que sobe ao relvado. A sua história não é tão diferente dos demais.

Depois de uma infância como estrela consumada do futebol juvenil da ilha de Las Palmas, aos 16 anos Jonathan Viera ingressou definitivamente nos quadros da UDLP, passando a fazer parte da equipa B onde começou a despontar às poucas semanas de aterrar. Sem grande velocidade nas pernas, é a visão de jogo e o poderoso remate que surpreende a mais concentrada defesa que lhe permitiram destacar sobre os demais. Em dois anos tinha cumprido com a sua formação e foi ascendido, inevitavelmente, à equipa principal. As ilhas viviam a euforia do regresso à Liga, com o Tenerefe, mas o clube de Santa Cruz não tinha um jogador com ele o destino dos azulones tornou-se inevitável. O de Viera começava a desenhar-se.

 

A partir de 2010-11 a sua presença na primeira equipa dos canários tornou-se regular e fundamental.

O clube islenho aguentou a competitividade da Liga Adelante, quando todos o condenavam à despromoção, e os golos (6) e assistências (7) de Viera revelaram-se decisivos nos momentos mais apertados da temporada. A forma elegante como caminhava pelo terreno de jogo, cabeça erguida, olhos na bola, davam-lhe esse traço distintivo que só os jogadores superlativos conseguem transmitir. Mas os relatórios dos olheiros que viajavam semana sim, semana não à ilha traziam também referências sobre a sua vida nocturna, as suas poucas ânsias de deixar a casa dos pais, essa tradição familiar tão omnipresente no historial espanhol. E o ano passava e as chamadas à direcção continuavam omissas, guardadas numa caixa de pandora de futuro. Viera ficou mais um Verão mas com a sua estreia pela selecção nacional sub-21, em vésperas do seu novo titulo europeu, deram-lhe um protagonismo extra que só o parece ter motivado ainda mais.

2011-12 arrancou e ainda só vai a meio mas os números do médio já igualam todo o seu registo da temporada passada. Viera é mais certeiro diante das redes, mais arriscado no último passe, mais rápido na condução de jogo e os relatórios da noite começam a perder força, talvez depois de o seu idolo David Silva, essa inspiração diária, ter passado pelo mesmo na sua etapa em Valencia, nesse seu fascinio pela festa que fez com que tanto Mourinho como Guardiola dissessem não e os milhões do City um gritante sim.

 

A esmagadora maioria dos analistas da liga espanhola sabem que este é o último ano de Viera em casa. Tanto o Villareal como o Valencia já fizeram saber do seu interesse no jogador. Do estrangeiro, talvez inspirados pelo sucesso esmagador do futebol espanhol, começam a chegar ofertas truculentas. Viera joga com a fome de quem sabe que o relógio anda a passe acelerado. Talvez por isso jogue cada vez noutra dimensão, nessa esfera de tempo onde só os eleitos têm direito a estar.



publicado por Miguel Lourenço Pereira às 09:31 | link do post | comentar | ver comentários (1)

Segunda-feira, 02.01.12

Move-se com a ligeireza reptiliana de quem procura um lugar ao sol. Em Nápoles encontrará essa caldeira de emoções que tem o condão de despertar heróis das profundezas do Vesúvio. No Chile é já uma glória superlativa, um herói a caminho de novos episódios para a próxima saga. O mediatismo social rende-se à fantasia de videojogo de Neymar mas o futebol da América do Sul sabe que o seu perfume mais doce no passado ano chegou dos pés de Eduardo Vargas...

 

A histórica relação entre o porto napoliano e a América Latina fazia prever algo assim.

Antes de se consagrar numa estrela mundial - os titulos ajudam nestas coisas de que o mundo te preste atenção - já os olheiros do Napoli tinham marcado a letras grandes o nome de Vargas. O pequeno grande herói da Universidas de Chile, um dos clubes mais históricos do futebol sul-americano, levava um ano completo impressionando com o seu estilo de pincel. Aos 22 anos é um dos jogadores mais promissores do futebol mundial e no Chile só não tem ainda contornos divinos porque pertence à mesma geração de um Alexis Sanchez que em Barcelona começa a demonstrar ao grande público o que os mais atentos conheciam da sua etapa a jogar pelo River Plate numa linha atacante que incluia a Buonanotte e Falcao. 

Vargas transformou o modesto futebol chileno durante o último ano. Respirando essa audácia que define os bons dos grandes, levou a Universidad ao titulo continental Sudamericano, o equivalente da Europe League do outro lado do "charco", e completou um ramalhete de quatro titulos no mesmo ano para o clube da capital chilena, um feito inédito no seu impecável historial. Começar por Vargas é começar pelo fim, pela emoção do momento em que construiu a reviravolta que destroçou a vantagem inicial de dois golos da Liga de Quito nessa dupla final continental. Vargas tinha ouvido os cantos de sereia da Europa em Junho mas a ambição de reinar no continente primou e os onze golos que apontou no torneio transformaram-no na figura inquestionável de uma esquadra que já tinha vencido o torneio de Apertura chileno e a Supertaça frente ao eterno rival, Colo-Colo, em ambos casos com a sua inevitável contribuição. Quando o conjunto se juntou para celebrar, pela quarta vez no ano, a vitória no torneio de Clausura, já nem era preciso imaginar com muita força como Vargas tinha sido, mais uma vez, o herói do momento. Com o azul da "U" ao peito, o avançado destroçou as defesas contrárias e transformou-se no mais jovem jogador de sempre do futebol chileno a receber um prémio continental. Começar por Vargas é começar pelo anúncio da sua viagem a Itália onde se encontrará em casa, no clube mais sul-americano do Calcio, onde disputará com Lavezzi e Cavani, profetas como ele no Uruguai e Argentina, um dos lugares nessa dianteira que Mazzari quer transformar no sabre mais letal do futebol europeu quando a Champions League volte a soar pela pedra do San Paolo.

 

Mas o Vargas de hoje, herói épico, poeta de rua, começa antes do dinheiro, dos titulos e da fantasia.

O futuro herói da "U" começou a despontar na universidade rival, a Católica, com apenas 12 anos. Mas o campo de treinos era tão distante da sua pobre casa no humilde bairro de Renca que os pais acabaram por proibi-lo de partir só, todas as noites, num autocarro que circulava toda a capital e se adentrava na profundidade suburbana de uma cidade onde o frio tem outro significado. Talvez por isso Eduardo estivesse fadado a brilhar, a ultrapassar essa distância tão gigantemente curta. Talvez por isso o programa televisivo Futbol7, patrocinado pela Adias, tenha sido só um pretexto para a vida acertar contas com ele. Deslumbrou, como não o iria fazer depois de tanta vontade acumulada nas tripas, e ganhou direito à posteridade. Começou a fazer parte dessa geração que o demónio Bielsa iria lançar pouco depois com Sanchez e Vidal, ainda num papel secundário, e encontrou no Cobreloa o porto de abrigo necessário. Chegou ao clube com 17 anos e durante três foi o seu porta-estandarte, soube a que sabe a terra ensangretada das divisões regionais, sentiu na pele a dureza da entrada de defesas mais velhos, mais fortes mas com menos fome e trepou até encontrar-se cómodo no tapete verde e macio da primeira equipa. Só saiu de lá para continuar a subir.

2010 chegou depois do sucesso em Toulon - onde marcou três belos golos - e com a compra definitiva do seu passe, depois de largas negociações, pela Universidad de Chile. Já não havia volta atrás.

No primeiro ano jogou forçosamente descaido para a direita e encontrou a sua veia mais goleadora. Saboreou o perfume do futebol continental, destroçando as defesas de Flamengo e Alianza de Lima (na Copa Libertadores) e deu ar fresco ao conjunto azulon no Torneo de Clausura. Mas 2010 não era ainda o seu ano, soava a pouco, faltava algo. Talvez aquele golo a Iker Casillas, um golo que ainda ecoa nos Andes. Talvez o regate que permitiu a reviravolta no segundo jogo da final contra a Liga de Quito, um regate que perdurá na memória. Ou talvez seja tudo aquilo que ficou ainda por fazer?

Com a mais bela baía do Mundo a cada despertar, a Eduardo Vargas talvez o som do autocarro que o deixou de levar aos treinos por insistência dos pais comece a ouvir-se cada vez menos. Na sua pequena Renca natal já há uma rua com o seu nome, pequena ainda, mas ninguém questiona que daqui a nada esse trecho de asfalto se transforme numa avenida de direito. Lá longe será o rebulicio de Nápoles, os gritos de paixão dos legionários de San Gennaro e a sua própria voz interior, essa que não o deixa parar, que determinarão o seu futuro. Tecnicamente tem todas as condições para ser mais um nessa dinastia sul-americana que fez da baía um lar digno de heróis. No Chile ninguém se esquece dele, ao contrário de Vidal e Sanchez ele conseguiu triunfar em casa. E por isso estará sempre nos seus corações. Quando voltar, será com uma coroa de louros na cabeça, desses colhidos ao pé das cinzas da história...



publicado por Miguel Lourenço Pereira às 18:25 | link do post | comentar

Quinta-feira, 25.08.11

Uma tradição que remonta aos dias de Matt Busby e que hoje, mais do que nunca, faz todo o sentido. O Manchester United voltou a demonstrar que é um clube diferente dos demais rivais na Premier League sob a batuta do sempre astuto sir Alex Ferguson. Uma terceira fornada de "Fergie Babes" está a caminho e deixa no ar a ideia que a próxima década do futebol inglês continuará a ser disputado sob o signo do diabo. 

Depois da categórica vitória por 3-0 frente ao Tottenham Hotspurs sir Alex Ferguson foi confrontado no flash interview com um dado inquestionável.

O onze que tinha acabado de derrotar, sem grandes problemas, um dos candidatos aos postos Champions, era o segundo mais novo  a disputar um jogo de liga desde que o escocês aterrou em Old Trafford. Há 25 anos atrás.

Ferguson sorriu, fez-se de surpreendido e aproveitou habilmente a dica para louvar os seus novos "filhos" futebolisticos. E com razão continuou a sorrir porque em Manchester a sensação generalizada é que o escocês, sem gastar o mesmo dinheiro que os seus rivais directos (dentro e fora das ilhas britânicas) está a montar uma equipa temivel para dominar o futebol inglês dos próximos dez anos. Soa familiar? Pois claro que sim.

Em 1991 quando o Man Utd de Beckham, Scholes, Giggs, Butt ou irmãos Neville se sagrou campeão de Juniores, a equipa de Ferguson vinha de ganhar uma Taça das Taças com alguns dos mais emblemáticos jogadores dos anos 80 ainda ao serviço. Em apenas três anos Fergie revolucionou a equipa, a quem adicionou a qualidade de Kanchelskis, Pallister, Schmeichel e Cantona, e lançou a primeira fornada dos Fergie Babes que ainda hoje é representada por Ryan Giggs, depois das saídas de Scholes e Neville, o último dos resistentes. Essa geração marcou um antes e um depois da história do futebol inglês mas a princpios da década seguinte começava a perder gás face a um Arsenal extremamente competitivo (e nada juvenil) e um Chelsea que começava a sentir o peso dos petrodólares de Abramovich. Foi então quando Ferguson sacou novas cartas da manga, apostando em jovens ingleses como Carrick, Hargreaves e Rooney e internacionais como Cristiano Ronaldo, Nemandja Vidic, Anderson e Patrice Evra. O esqueleto da equipa que ganharia anos depois a sua segunda Champions e que compõe hoje, ainda na sua maioria, o clube dos veteranos da nova guarda. Os novos filhos do diabo.

 

No excelente jogo frente a um Tottenham notoriamente orfão da genialidade habitual de Luka Modric, o treinador escocês não teve problemas em apostar numa equipa com uma média de idades a roçar os 23 anos, bem diferente daquela que disputou em Wembley a final da Champions League frente ao Barcelona. Não significa, naturalmente, que o Man Utd 2011/12 seja sempre uma equipa repleta de juventude mas o plantel montado por Ferguson é, seguramente, um dos mais jovens da liga, mais ainda que o Arsenal de Wenger, um técnico habituado a recolher todos os louvores quanto ao que a formação diz respeito mas que, salvo casos pontuais, apresenta sempre um plantel com médias etárias bastante equilibradas, na casa dos 24-26 anos. 

Sem van der Sar e os seus 40 anos Ferguson conta com o promissor David de Gea e os seus 21 anos. Depois de ter sofrido na Community Shield e no primeiro jogo de liga, o espanhol demonstrou muita segurança no seu jogo inaugural em Old Trafford e deixou boas sensações. À sua frente jogaram Phil Jones, contratado por 15 milhões ao Blackburn, de 19 anos apenas - um central com uma margem de progressão imensa - e Chris Smalling, jogador que chegou na época passado proveniente do Fulham londrino e que, aos 22 anos, é já uma certeza. Com 23 anos, o lateral direito Jonhhy Evans (adaptado já que é central de origem) cumpriu como sempre e na esquerda o mais veterano em campo, o francês Evra (e os seus 30 anos, apenas superado por Ferdinand, com 31, no plantel da zona defensiva), voltou a ser igual a si mesmo. No banco ainda estavam os irmãos da Silva (20 anos) e de fora o central Vidic (29 anos), talvez um dos mais eficazes do futebol europeu.

Mas se a defesa do United já em 2010/11 parecia rejuvenescida, a grande metamorfose vive-se no miolo onde, sem Scholes e Hargreaves, o peso etário das novas incorporações se fazem sentir. Ao brasileiro Anderson (23) e ao português Nani (25) juntaram-se o teenager Tom Cleverley, a grande revelação da pré-época, e os seus 20 anos e o recém-contratado Ashley Young com 26 anos. Sem esquecer ainda que por ali passeiam Darren Gibson (24), Darren Fletcher (27), Valencia (26), Paul Pogba (18) e Ravel Morrison (19). A veterania não deixa de ser um posto para Ferguson e por isso haverá sempre minutos de jogo para Giggs (38), Carrick (30) e Park Ji Sung (30). No ataque a situação repete-se, com o titularissimo Wayne Rooney, outrora a grande promessa adolescente inglesa, a servir quase de veterano com apenas 26 anos, face aos 23 de Javier Hernandez, os 21 de Danny Wellbeck, os 22 de Kiko Macheda e os 24 de Diouf. Com pouco espaço de manobra (e talvez com o bilhete de saída carimbado) o veterano Dimitar Berbatov (30) e o eternamente castigado pelas lesões Michael Owen (32) são vitimas de uma revolução que outrora eles também protagonizaram.

Nesse onze a estrela mais cintilante acabou por ser Wellbeck, lançado há três temporadas mas, entretanto, emprestado ao Sunderland onde brilhou ao lado de Gyan numa das linhas ofensivas mais estimulantes da última edição da Premier. Mas também o recém-chegado Young (um velho sonho de Fergie) e o recém-promovido Cleverley. Sem querer gastar fortunas em jogadores como Sneijder, Etoo ou Modric, as pérolas do mercado, o escocês quer relançar a batuta de jogo em Anderson e dar outras opções ao jogo de ataque de Rooney com a velocidade de Nani, Valencia, Young ou Wellbeck. Como cereja no topo do bolo basta apontar a qualidade de jogo, inesquestionável, e habitual fome de titulos que tem feito do conjunto inglês - a par do Barcelona - a mais sucedida formação da última década.

 

No habitual esquema da Premier League, acente num 4-3-3 que se desdobra facilmente num 4-2-3-1 haverá muitos minutos para a força, rapidez e determinação da nova guarda, especialmente com o historial clinico de veteranos como Rio Ferdinand, Michael Carrick, Ryan Giggs ou Michael Owen. Nos jogos europeus, onde Ferguson prefere um 4-5-1 mais cauto, será mais provavel ver os veteranos em acção, mais curtidos em mil batalhas. Mas o certo é que o nivel do plantel que Ferguson montou nos últimos dois anos, a era pós-Cristiano Ronaldo, promete um novo desafio ao Manager que não sabe parar. E garante aos Red Devils uma continuidade que, nos últimos 30 anos, nem Liverpool, nem Arsenal, nem Chelsea souberam ter. Talvez por isso em Inglaterra vencer continue a ser uma questão dos diabos!



publicado por Miguel Lourenço Pereira às 11:54 | link do post | comentar

Sábado, 21.05.11

Foi uma das máximas revelações do ano na Ligue 1 e tem todas as condições para ser o patrão da defesa que a França há tantos anos procura. Raphael Varane não evitou a despromoção do seu Lens mas deixou destelhos de um talento imenso que relembra, e muito, a classe de um tal Marcel Desailly.

 

Não é por mero acaso que os muitos rumores sobre o futuro de Varane têm inundado a imprensa gaulesa nas últimas semanas. Com o RCD Lens despromovido, todos sabem que o melhor central jovem do futebol francês não irá acompanhar a equipa no inferno da 2º Divisão. Depois de se falar nas possibilidades de ficar na Ligue 1, ao serviço dos parisinos do PSG, os rumores apontam agora para um futuro ainda mais brilhante: em Old Trafford.

Varane é a escolha natural para suceder a um Rio Ferdinand a quem as lesões, aos 32 anos, não lhe permitem ambicionar por um regresso à sua máxima forma. O jovem central francês tem apenas 18 anos mas a equipa de olheiros do Man Utd, a mesma que tem provocado uma significativa revolução no plantel de Ferguson na última década, está confiante nas suas capacidades. E têm razão. Quem seguiu a evolução do jovem central, desde a sua estreia profissional com 17 anos, sabe que ali mora um talento muito especial. Varane é já uma peça chave da selecção sub-21 gaulesa e ninguém duvida que será ele o nome a seguir nos próximos anos para tapar um buraco que tem permanecido visivelmente aberto desde que a dupla Blanc-Desailly colocou um fim à sua carreira internacional. Nem Gallas, nem Squillaci, nem Givet, nem Abidal convenceram nos últimos anos os adeptos galos e apesar do crescimento notório de outro jovem de futuro, Mohamed Sakho, falta um toque de classe nessa defesa de futuro dos homens liderados por Blanc, um técnico que sabe tudo sobre a arte de bem defender.

 

Mas Varane é um jogador que aposta por um estilo de jogo mais similar ao de Desailly.

O antigo internacional foi certamente um modelo em que se inspirou na sua infância num bairro social da cidade nortenha e operária de Lille. Como o defesa que despontou no Olympique Marseille (antes da brilhante carreira ao serviço do AC Milan e Chelsea) é um excelente central de marcação mas tem também a abilidade de actuar como médio mais recuado. Notável na recuperação de bolas, Varane sabe jogar com critério e já demonstrou, mais de uma vez, que lida bem com a pressão.

Fez a sua carreira de formação num clube local de Lille mas o clube treinado por Rudy Garcia não lhe prestou a devida atenção e foi o vizinho Lens que fez tudo para o captar para o seu sistema de formação. Tinha nove anos apenas quando chegou ao Felix-Bollaert e desde então tornou-se num dos simbolos da excelente cantera do clube que há dois venceu o campeonato nacional de sub-16, ao lado de Aurier, Situ, Monnet-Paquet, Sow e do igualmente promissor Thorgan Hazard, irmão mais novo do genial Eden.

Depois foi sempre a subir nos escalões de formação até que no passado mês de Novembro chegou a esperada estreia pela equipa titular do Lens. Aposta pessoal do técnico Eric Assadourian, o central estreou-se contra o Montepellier e deixou rapidamente a sua marca. A chegada de Boloni, em Janeiro, levou-o a passar a actuar como médio mais defensivo e aí também voltou a não desiludir. A titularidade, aos 18 anos, estava confirmada e no final da temporada Varane surpreendeu igualmente com o seu bom jogo de cabeça nos lances de bola parada marcando dois golos que acabaram por servir de pouco às aspirações do clube. Clube resignado já em perder a sua maior jóia. Varane tem as malas feitas e um bilhete para Manchester praticamente na mão. Terá de passar pelo habitual periodo de adaptação mas é fácil antecipar uma carreira brilhante para um central com um toque de distinção com a bola cada vez mais inusual.

 

Exemplo perfeito do excelente trabalho de formação do futebol gaulês, o jovem de origem caribenha terá de saber lidar com a pressão de quem já vê nele a esperança para a renovação do quarteto defensivo gaulês. Ao serviço de Alex Ferguson, pastor de homens por excelência, terá tempo e espaço para crescer. O futuro pertence-lhe por completo.



publicado por Miguel Lourenço Pereira às 06:56 | link do post | comentar

Sábado, 30.04.11

A globalização transformou o rosto do futebol contemporâneo de forma inegável. Mas ainda há pérolas e diamantes escondidos que o grande público desconhece. O trabalho dos observadores mudou com o tempo mas a sua essência permanece igual. Eles são a alavanca de qualquer projecto desportivo de sucesso. E ás vezes, sem que o pensemos, ditam as modas do futuro. São os rostos invisiveis neste circo mediático. Olhar para o futuro agora é uma missão quase impossível. Menos para eles...

 

 

 

Uns clubes precisam de vender. Outros têm dinheiro para comprar. Assim se fazem os negócios. Mas no mundo da bola há negócios e negócios.

Nem todas as instituições podem gastar 100 milhões de euros num só homem, por muito que seja o melhor. Ou, já que estamos, 200 milhões em quatro, porque há que pagar as contas no fim do mesmo. Nem todos os clubes são o Real Madrid, a mais conhecida instituição internacional à hora de por o dinheiro sobre a mesa. Mas nem todos são o Athletic Bilbao que praticamente produz tudo o que consome e que compra ocasionalmente jogadores num circulo tão restrito que nunca há espaço para muita imaginação. São duas filosofias dispares. No meio está a normalidade. E, já sabemos, há normalidades e normalidades.

O papel do observador, o popular olheiro, é hoje mais importante do que nunca. A lei Bosman mudou o rosto do futebol europeu e, por arraste, ditou também as mudanças a nível mundial. Revolucionou o futebol sul-americano que se tornou numa fábrica de exportação constante, abriu ao mundo o mercado africanos e deu forma ao mercado asiático. Sem a lei Bosman hoje, talvez, muitos dos grandes jogadores não europeus que actuam no Velho Continente ainda estariam nos seus países de origem. Todos sabemos que o desaparecimento das limitações de jogadores não nacionais não se limitou a destroçar o futebol de formação europeu. Fez com que o dinheiro chegasse a países que sempre viveram na raia do negócio futebolístico. E, por arraste, levou os olheiros a terras impensáveis há vinte anos atrás. O que antes passava por um trabalho tranquilo de observação local e regional transformou-se numa labor global. Todos os grandes clubes sabem que têm de ir mais além. A internet e as telecomunicações encurtaram as distâncias e todos os treinadores têm as suas particulares dvdetecas de exibições prometedoras. Mas o cheiro do terreno continua a ser fundamental e os voos encheram-se de enviados especiais de todas as espécies prontos a descobrir, como os antigos exploradores, a nova rota para a Índia.

 

Nesta nova dimensão poucos clubes souberam lidar com os novos tempos como o Manchester United.

Rever cada jogada de Javier Hernandez é um elogio constante ao trabalho de prospecção de um clube de primeiro nível mundial que ainda se importa com o trabalho dos seus olheiros. Porque, não nos enganemos. O Barcelona apoia-se na sua "cantera", recrutando miúdos também noutros pontos do Mundo muito cedo mas depois empapa-os de "barcelonismo" e depois só volta a mergulhar no mercado para gastar boas quantias ou para tapar buracos na estrutura local. Daniel Alves, Zlatan Ibrahimovic, Yaya Touré ou Ronaldinho, Etoo, Deco e Giuly não foram, propriamente, descobertas de olheiros mais informados que outros. E o mesmo se aplica a outros gigantes como Inter, AC Milan, Real Madrid ou Bayern Munchen. A chegada de Carlos Queiroz foi fundamental mas a visão de Alex Ferguson ditou essa nova filosofia dos Red Devils. Que lhe permitiu reconstruir as suas equipas até à exaustão.

Javier "Chicharito" Hernandez é um grande jogador, destinado a grandes momentos. Mas já o era há um ano atrás quando o serviço de olheiros do Man Utd se decidiu a apostar nele de forma imediata ignorando a petição do Chivas de ficar com o avançado um ano mais. Jim Lawler, chefe dos olheiros do United, recebeu vários relatórios dos olheiros locais. Ficou tão impressionado que decidiu passar um mês no México a vê-lo jogar em pessoa. E não admira ninguém que à posteriori se soubesse que, como ele, também passaram pelo radar Guardado, Dos Santos, Vela e Barrera, outras promessas locais desconhecidas então no Velho Continente.  Depois do o estudar ao detalhe, Lawler aprovou a contratação recomendando a Ferguson que se antecipassa ao Mundial, onde se esperaria que o jovem acabaria por brilhar. E assim foi. Nisto tudo, o que realmente surpreende é a capacidade de adaptação do mexicano que evitou assim seguir o exemplo de outras descobertas espantosas da equipa de observadores dos ingleses. Esses são os mesmos que pescaram Diego Forlan, Giuseppe Rossi, Gerard Piqué, Nemandja Vidic, Anderson (com quem já tinham um pré-acordo quando este chegou ao FC Porto), os irmãos da Silva e, claro, Cristiano Ronaldo. Todos eles chegaram a Old Trafford por valores irrisórios comparativamente com a sua situação actual. Alguns afirmaram-se de imediato (Vidic), outros precisaram de tempo (Ronaldo) e outros, pura e simplesmente, não aguentaram a exigência e foram brilhar para outras paragens (Rossi, Forlan, Pique), provando que o trabalho de observação tinha sido perfeito. Hernandez destaca talvez pela sua rápida adaptação e pelo seu preço ridículo o que faz dele, já, a mais bem sucedida contratação da era Ferguson. Não é que tenha o mesmo valor de Schmeichel, Cantona, van Nistelrooy, Rooney ou Ronaldo, mas tem potencial para o lograr e já o demonstrou com juros. É o espelho de um trabalho bem feito.

Os olheiros que o clube inglês tem nos quatro cantos do Mundo têm ajudado o técnico escocês a superar as sucessivas birras dos seus melhores jogadores (Beckham, van Nistelrooy, Ronaldo), sempre preparados para sair quando atingem a sua melhor forma. Com estes backups constantes, mesmo quando o dinheiro escasseia - e as finanças do clube há muito que estão no vermelho, literalmente - são fundamentais para que o Manchester United esteja perto de um feito histórico, só logrado por outro clube inglês: 3 finais da Champions League em quatro anos.

 

Muitos citam o trabalho de formação do Arsenal e a verdade é que a rede de observadores dos gunners inclui alguns dos melhores do mundo nisto da prospecção. O problema do clube londrino está na estrutura que não permite estabelecer uma ponta entre o presente e o futuro. Ferguson mantém consigo os seus braço-direito e dá espaço à afirmação dos mais novos. Wenger atira (porque é forçado, muitas vezes) os seus jogadores aos leões às vezes cedo demais. E paga o preço. São dois clubes com filosofias distintas mas com uma politica de prospecção muito similar, em tudo diferente aos modelos espanhóis e italianos que esperam sempre que outro clube actue antes, como um colchão. Em Itália é fácil ver o Napoli, Palermo, Fiorentina, Udinese e companhia arriscarem nos Cavani, Pastore, Jovetic, Sanchez e depois aparecerem em cena os grandes colossos que pagam mais do que deviam para os recrutar. Isso resulta também da legislação do Calcio que só permite a inscrição de um extra-comunitário por temporada. Mas também é um espelho da cultura do medo. Kaká, Coutinho, Vucinic foram sempre a excepção, nunca a regra. Essa filosofia mediterrânica, que se vive também em Espanha, França e Portugal, de que um clube grande só contrata jogadores de qualidade contrastada tem muito a ver com a realidade financeira de cada país. Clubes como o Sevilla ou o Villareal só podem chegar ao topo como o têm feito, com boas redes de olheiros rápidos a antecipar movimentos. Depois sabem que estão resignados a vender aos Madrid e Barcelona que esperam a sua hora para agir. A rede de olheiros do Barcelona é de tal forma desastrosa que os Henrique, Keirisson, Caceres, Giovannis e companhia sempre foram deixados em evidência, comparativamente com o produto local. Em Madrid, já se sabe, os milhões impedem que negócios como os de Marcelo ou Higuain se repitam. Durante anos ambos os jogadores, verdadeiras pérolas descobertas antes do tempo, sofreram o estigma de terem custado pouco para uma instituição habituada a pagar tanto. 

 

 

 

O futebol latino, uma vez mais, vê-se atrasado nesta corrida atrás das jovens pérolas. Portugal escapa, ligeiramente, pelas relações privilegiadas com a América do Sul mas, essencialmente, pela sua constante necessidade de vender. Em Inglaterra (e, a pouco e pouco, na Alemanha e Holanda, talvez os pioneiros nesta matéria) há tempo, paciência e dinheiro. Portanto não estranha que aí se concentrem também os mais hábeis observadores do Mundo. Nem todos acabam nas ilhas, que o problema da adaptação impede muitas vezes que pérolas de outras longitudes se afirmem na dura Premier, mas as suas referências estão lá, nas gavetas, para uma memória futura. Enquanto o sul da Europa paga o preço do sucesso, o futebol inglês paga para garantir o futuro. E paga menos. E ganha mais. E desfruta com Javier Hernandez com um sorriso nos lábios. Porque sabem que, lá no fundo, são capazes de ter razão.



publicado por Miguel Lourenço Pereira às 17:39 | link do post | comentar | ver comentários (2)

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