Terça-feira, 06.12.11

Seguramente que qualquer leitor do Em Jogo conhece James Will. Seguramente que muitos o viram jogar, a parar remates indefensáveis, a realizar defesas impossíveis no último minuto debaixo de um imenso temporal. Ou a comandar a área com a destreza dos mais hábeis e o espirito dos mais guerreiros. Seguramente que James Will é um nome tão familiar para qualquer um como seria Luis Figo...certo? Errado. James Will é o paradigma do erro, o exemplo da abordagem do futebol profissional ao futebol de formação que tem alimentado e destruido carreiras vorazmente durante os últimos 30 anos. Will é o anonimato da mesma forma que Figo representa o sucesso máximo. Cruzaram-se no caminho e pareciam ir por caminhos similares. Mas um continuou e o outro ficou para trás. E não foi o único.

Poucas pessoas realmente viram jogar James Will.

Uma das razões mais evidentes foi a curtissima carreira do jogador. E Will seria um de muitos anónimos que não singraram no jogo não fosse por um mero detalhe: em 1989 a FIFA achou por bem otorgar-lhe o prémio de Melhor Jogador do Mundial de sub-17, realizado na sua Escócia natal. Torneio que perdeu, na final, contra a Arábia Saudita. Nessa prova brilharam grandes futuros craques do futebol mundial como Fode Camara, Khalid Al Romahi ou Gil. Claro que, no meio deste talento que os olheiros da época se prestaram a encumbrar como estrelas futuras, havia um tal de Luis Figo, então ainda um mero júnior do Sporting CP que anos mais tarde se convertiria no simbolo do futebol mundial, depois de Florentino Perez fazer dele o primeiro "Galáctico". No dia em que assinou o contracto com o Real Madrid é dificil saber se algum dos anteriores jogadores ainda eram futebolistas profissionais. Will desde já não o era.

O guarda-redes escocês foi a grande figura do conjunto da casa e exibiu-se a alto nível. Mas nunca chegou a assinar um contracto profissional. Fartou-se das exigências do futebol de elite e seguiu a sua vida como policia de trânsito na sua pequena localidade. O futebol pode ter perdido um grande guarda-redes - como a FIFA sugeriu e muitos olheiros comprovaram - mas a sua experiência tornou-se no paradigma futuro de uma politica incapaz de entender as gigantescas diferenças entre o futebol de formação e o futebol profissional.

Com a globalização os clubes (e alguma imprensa) dedicam esforços à procura de prodigios cada vez mais precoces. Contratam jogadores imberbes, imaginam que em cada miudo de bairro está o próximo Messi e suspeitam a cada simples demonstração de talento os milhões que podem estar ali no futuro. E no entanto a maioria dos jogadores aos 17 anos (e aos 15 e aos 19) é um potencial Will mais depressa do que um potencial Diego Armando Maradona, que dez anos antes venceu o mesmo troféu que o escocês, mas que precisou de meia dúzia de anos para realmente "explodir" como futebolista.

 

A lista de "Wills" do futebol moderno não tem fim.

A cada torneio UEFA e FIFA surgem nomes que depois caem no esquecimento. Demasiadas expectativas, um torneio bom de um jogador com condições medianas, a performance colectiva capaz de exaltar o individuo, o peso do rival ou, simplesmente, a falta de comportamento profissional de um jogador que é ainda um miudo...tudo são factores que muitos esquecem na ânsia de ser os primeiros a descobrir a grande novidade a seguir. A maioria dos jogadores jovens sucumbem à pressão de serem exibidos como bandeiras. Muitos desistem como James Will. Outros são atraidos pelos milhões dos grandes clubes europeus para acabar por jogar em equipas de escalões inferiores, lamentando-se do que podia ter sido e não foi. E outros, pura e simplesmente, colapsam.

Arsene Wenger inaugurou a corrida às jovens promessas mundiais mas teve o savoir faire suficiente de seleccionar jovens que correspondiam a comportamentos padrão que definiam uma margem de sucesso considerável. Qualquer manager ou olheiro de elite sabe que um torneio curto é a pior forma de conhecer o valor real e potencial de um jogador. Normalmente aqueles que mais brilham neste tipo de competições são os que menos longe chegam como profissionais. Estrelas cadentes de um mundo sem perdão.

É no estudo continuado, na análise estatisticas de comportamentos, exibições e atitudes durante um largo periodo de tempo que se descobrem as verdadeiras pérolas do futuro. Muitos deixam-se levar pelo comportamento mediático das estrelas de domingo. Figo nesse torneio não brilhou talvez ao mesmo nível que Will. Mas profissionalmente a sua carreira foi ascendente, em todos os sentidos e beneficiou, de certa forma, dessa pressão ausente que sofreu o escocês e também nomes tão familiares como Nii Lamptey, Daniel Addo, Mohammed Kathiri ou Sergio Santamaria, todos eles detentores do mesmo troféu. Mesmo as consagrações de Landon Donovan, Sinama-Pongolle ou Anderson acabaram por ser mais prejudiciais do que benéficas para os jogadores e nos tempos recentes talvez só mesmo Cesc Fabregas (já então pupilo de Wenger) tenha escapado a uma maldição repleta de lógica e disfarçada de preconceito. O futebol de formação de hoje é cada vez mais uma escola de resultados e imediatismos. Os clubes e as federações procuram productos para vender agora e não estão dispostos a formar jogadores e profissionais para cinco anos. No último Europeu de sub-20 as selecções mais prometedoras, Espanha e Colombia, ficaram pelo caminho. E no entanto é fácil ver que daquele grupo sairão mais desportistas de elite do que das selecções finalistas, Brasil e Portugal.

 

A abordagem em modelos de jogadores mais fisicos e menos técnicos - e o caso francês é evidente - pode dar resultados no momento mas, a longo prazo, não dá frutos. Por cada Figo haverá sempre 100 James Will, jogadores de consumo imediato e precoce que, como as estrelas pop juvenis, se tornam em one hit artists superados facilmente pela fornada que vem já a seguir. O paradigma do erro, em que Portugal apostou recentemente, acreditando que o futebol de formação se faz de titulos e não da preparação de futebolistas de futuro não é caso único e no entanto não deixa de ser um erro repetido vezes sem conta. O projecto de formação do FC Porto, onde tanto dinheiro se investiu, foi coroado de titulos e no entanto não há a perspectiva de nenhum jogador da cantera estar agora ou no amanhã nos quadros da equipa principal. Se o sucesso espanhol mede hoje tudo, deveria ser óbvio para todos que apostar em futebolistas é mais rentável do que apostar em ganhadores, por muito que demore dez anos até que os génios de Xavi, Xabi Alonso ou Andrés Iniesta sejam devidamente reconhecidos. Pérolas individuais existirão como sempre, jovens potreros de bairro encandilarão olheiros atentos mas essa fome de descobrir the next big thing será sempre mais um handicap do que o caminho a seguir. O futebol de formação, como qualquer projecto educativo, precisa de tempo, espaço e ar para respirar. James Will sentiu na pele a asfixia de ter de ser alguém antes do tempo. Há 22 anos o paradigma do erro estava aí e poucos quiseram ver. Hoje há muitos como ele quando a sua história - e a de tantos outros - devia, a pouco e pouco, converter-se na excepção que faz a regra!



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Quinta-feira, 15.09.11

O tornozelo a sangrar de Cristiano Ronaldo tornou-se na triste imagem da semana europeia. Traços de um jogo que se metamorfoseou nas últimas duas décadas para acabar com a repetição de imagens como esta mas que, no caminho, se transformou em mais um choque de egos, entidades e maneiras de ver o jogo. Os artistas reclamam mais protecção, os puristas defendem a essência milenar do jogo e Platini falou em proteger, talvez exclusivamente, a Messi. Os protegidos do futebol são, cada vez mais, os alvos a abater.

Ronaldo é um tipo polémico por essência.

Tem esse condão de cair mal a quase toda a gente menos à sua mãe e à namorada de turno.

Acontece. Como ele muitos antes. Como ele muitos depois. Maradona não andou longe, quem aguentava Hugo Sanchez e Romário, que dizer de Oliver Kahn ou Steffen Effenberg e como se lembram hoje as pessoas de figuras como Eric Cantona ou Bernd Schuster?

Para Cristiano Ronaldo isso não seria problema, certamente, não fosse por esse tornozelo sangrento. Um tornozelo cosido no balneário do Dynamo Zagreb com três pontos e que o impedirá de jogar, como mínimo, a próxima semana. Um tornozelo, claro, que sofreu as consequências de um jogo duro e permissivo do meio campo da equipa croata (que fez uma excelente exibição, deixando um superior Real Madrid à beira de um ataque de nervos). E que se tornou a imagem perfeita para esta luta dos protegidos do futebol.

Desde há vários anos para cá que se formou uma corrente pública que defende que os principais artistas do jogo - os que fintam, os que decidem, os mais bem pagos, ou seja, os que vendem - sejam considerados espécie à parte. As televisões, em primeiro lugar, sabem que se um jogador como Ronaldo, como Rooney, como Messi ou como Ribery se lesionam, as audiências baixam. As marcas que os apoiam também sofrem quando o seu producto estrela andante está sentado com o pé, o braço, o tornozelo ou o joelho entre algodões. Da preocupação financeira passou-se à persuasão da opinião pública, habituada a que os grandes sofressem na pele o peso da sua grandeza. A Maradona partiram-lhe a perna sem dó nem piedade. Eusébio, Pelé, Di Stefano, Cruyff, van Basten, Muller, Best, Rummenige, Ronaldo, Platini ou Laudrup sofreram algumas das mais brutais marcações de que há memória. Batistuta mal pode andar como consequência do estado dos seus joelhos depois de tantas lesões. E o público (e os jogadores, e os dirigentes) achavam a situação normal. Nunca ninguém ponderou essa protecção extra que talvez tivesse tido influência em momentos chave na história do jogo.

 

Essa politica de protegidos tem uma inspiração financeira, não cabe dúvida. Mas está respaldada por uma sociedade desportiva diferente há que subsistiu até aos anos 90. Hoje o espectador de estádio é um espectador de sofá e quer ver o melhor sempre. Não tem paciência para os códigos deontológicos de um jogo que começou como um conflicto quase tribal e que se desenvolveu durante o século XX como um desporto duro, mas leal. Hoje a dureza é contestada à mínima e a lealdade questionada em todos os momentos.

A FIFA e a UEFA, atentas à direcção para onde sopra o vento, fizeram eco desta nova dinâmica social e ainda este ano Michel Platini teve a audácia de reclamar aos árbitros protecção especial para Leo Messi. Pensaria só no argentino, reconhecidamente o seu jogador preferido. Pensaria em vários artistas usando o jogador do Barcelona como cabeça de cartaz? As palavras podem ser interpretadas de muitos sentidos mas o que é certo é que para a UEFA e para a FIFA há protegidos e protegidos.

Para muitos é uma questão de compleição física. Jogadores fisicamente mais bem preparados são ignorados pelo árbitro. Para outros é uma questão de carácter de quem sofre a falta e que antes dos lances já tem um historial de polémica com este ou com outro árbitro. A verdade é que o que sucedeu ontem em Zagreb não é novidade nem deixará de o ser. Principalmente porque é evidente que há jogadores (e clubes) cujos problemas institucionais com o organismo máximo do futebol europeu passam factura em momentos escalofriantes como se viveram ontem. O grito de Ronaldo quando sofreu a brutal entrada de Leko ouviu-se nos quatro cantos do Velho Continente. E no entanto o árbitro norueguês Oddvar Moen (que esteve correcto em quase tudo o resto, incluída a expulsão de Marcelo) olhou para o lado mesmo quando o sangue empapava a fita branca que rodeava uma meia vermelha, talvez prenúncio do que se viveria. Como é possível que um jogador a sangrar - prova mais clara, impossível - não suscite o minimo interesse da figura que coordena um jogo de alto nível só é explicável por esse conceito de "protegidos" de diferentes categorias que manejam organizações como a UEFA.

Ronaldo já sofreu na pele, há duas épocas, contra o Olympique Marseille, a dureza dos rivais e a impunidade outorgada pela UEFA. A mesma que apoia expulsões a jogadores que chutam bolas depois do apito, a árbitros que se queixam de situações e até mesmo a jogadores que nem tocam no rival antes mesmo de que qualquer choque se produza. Essa dualidade de critérios pode ser debatida até ao ponto em que um tornozelo a sangrar entra em cena. Ninguém duvidou quando Maradona rebolava pelo Camp Nou depois da brutal entrada de Goikotxea. Ninguém olhou para o lado quando Zidane agrediu Materazzi na final de um Mundial. E ninguém vê um jogador entrar de forma mais dura sobre Messi, Xavi ou Iniesta sem sofrer uma duríssima admoestação. No entanto jogadores como Wayne Rooney, Frank Ribery, Zlatan Ibrahimovic, Hulk, Bastian Schweinsteiger (trucidado por um Marchena expulso (só) à sétima falta consecutiva no duelo de ontem) e o próprio Ronaldo, apesar de artistas da bola, não entram nesse leque eleito pela UEFA e consagrado pelas arbitragens nas provas europeias dos últimos anos. Mais ainda, as palavras do extremo português, de longe o jogador menos querido pela UEFA de Platini,  podem valer-lhe a ele uma suspensão. Enquanto isso Leko, que já foi um bom médio e que agora se arrasta, penosamente, pelo campo, poderá jogar contra o Lyon sem reservas ou recriminações.

 

Quando o futebol se joga na rua não há protegidos. Quando o futebol se joga nos escalões de formação também não. Durante quase um século anónimos gladiadores e estrelas globais sofreram o mesmo trato (que o diga Ronaldo Nazário ou Diego Maradona, por exemplo) e poucas vozes se levantavam em contra. O poder do dinheiro mudou o rosto do jogo de muitas formas e esta politica de protegidos é só mais um espelho desse apetite voraz de espectáculo de elites onde há intocáveis milionários e jogadores de segunda e terceira. Mas essa mutação até podia fazer sentido, no contexto actual, se fosse extensiva a todos os jogadores de elite. E não apenas a uns poucos. A impunidade da acção de Leko sobre Ronaldo além de grave é reincidente e, sobretudo, um convite a que para lá dos gritos, insultos e provocações, o jogador do Real Madrid (como Rooney, como Ribery, como Sneijder...) se torne num alvo claro de jogadores que encontram no golpe a única forma de quebrar o talento. Ronaldo tornou-se no anti-futebol para a esmagadora maioria dos adeptos e das instituições, de árbitros a dirigentes. No lado oposto do espelho Messi continua a ter carta branca, ditada pelo próprio presidente da UEFA e confirmada por três anos de arbitragens europeias de penoso nível, para escapar aos mais duros do jogo. Uma dualidade que só faz sentido num mundo bipolar e profundamente inclinado como o que vive hoje o futebol europeu, um futebol que oscila entre carniceiros da velha escola e génios com escolta policial.



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Sexta-feira, 09.09.11

Durante largos anos o Europeu de Futebol foi considerado de forma unânime como a mais complexa e dificil competição de selecções. Este Junho isso sucederá pela última vez. As habituais manobras politicas de Michel Platini garantem que a partir de 2016, e do "seu" Europeu, nada voltará a ser como dantes no futebol internacional europeu. Mas é mesmo este tipo de Europeu que queremos?

 

Durante década e meia aos Europeus de futebol iam apenas as selecções de elite, o top 8 que representava la creme de la creme do futebol europeu.

Por isso equipas como Inglaterra, Espanha, França, Itália, Holanda, Portugal ou URSS eram, de tempos a tempos, ausências sonantes. Não havia espaço para todos. A queda do muro de Berlim e o desmantelamento da Europa de Leste quase que duplicou as associações federadas na UEFA e Leonardt Johansson percebeu que era inevitável aumentar o número de equipas na fase final do torneio. Inglaterra 96 abriu as hostilidades e de um total de 52 federações sairam 16 finalistas. Um número que duplicava o modelo anterior mas que, mesmo assim, garantia que o futuro podia albergar sempre uma que outra ausência surpreendente. Que o digam os ingleses (2008) ou os russos (2000).

Este modelo agradou a tudo e todos. As televisões agradeceram o aumento do número de jogos e receitas com a publicidade. Os paises organizadores o número de visitantes e as federações a possibilidade de aceder a uma prova habitualmente exclusiva da máxima elite europeia. Todos estavam de acordo que, num leque de cinco dezenas de países, este era um número que permitia filtrar muitas selecções que não faziam mais do que número na própria fase de qualificação para o torneio.

Mas esse modelo que tanto sucesso logrou nas suas quatro edições (falta a quinta, este Verão) tem as horas contadas. Graças a monsieur Platini, claro. O presidente da UEFA trazia esta ideia no bolso e defendeu-a durante a campanha eleitoral da sua surpreendente vitória há quatro anos atrás. Uma vitória conseguida graças aos votos dos países pequenos e médios que em troca pediam mais protagonismo. A primeira decisão foi ampliar o leque de equipas nas provas europeias para esses países. A segunda foi reformular o aclamado modelo dos Euros.

 

A táctica é velha. Platini aprendeu com Blatter, maestro neste tipo de jogadas.

O suiço era o braço direito de João Havelange quando este precisou dos votos das confederações mais pequenas nas eleições de 1978 para  manter-se no alto cargo da FIFA. A decisão de Havelange foi simples. Ampliar o Mundial de 16 para 24 países, distribuir vagas entre africanos, centro-americanos e asiáticos e reequilibrar a balança de poder das potências europeias, sempre desconfiadas do poder crescente do brasileiro. Em 1994 Josep Blatter repetiu a jogada, com o apoio do presidente ainda em funções, e patrocinou a ampliação do Mundial de França para 32 selecções. Platini, responsável pela organização do evento, passou a ser o homem de confiança do suiço depois do torneio e durante anos prepararam em conjunto o assalto do gaulês à sede da UEFA. A táctica preferida de Platini foi posicionar-se junto das federações sem poder histórico - quase todas apoiavam Johansson de forma categórica - mas cujos votos somados podiam fazer a diferença. E aí se começou a desenhar o novo modelo do torneio.

Depois de vencer as eleições o gaulês conseguiu fazer com o Europeu o mesmo que com a Champions League, agradar a gregos e troianos. Depois de patrocinar um Europeu nos emergentes países do leste, entregou o torneio seguinte de bandeja à sua França natal (contra a candidatura turca, favorita, a quem tinha prometido apoio na sua pré-campanha, e a italiana que apresentava argumentos mais sólidos que os franceses) enquanto piscou o olho aos mais pequenos anunciando a passagem a um modelo de 24 equipas. Um modelo que funcionou em quatro Mundiais e deu mais de um quebra cabeças à FIFA. Implica a criação de seis grupos de quatro em que se apuram para os Oitavos de Final (uma novidade) os primeiros, segundos e os quatro melhores terceiros. Muitas contas, muitos dramas e, sobretudo, muitas jogadas de bastidores (como a do mitico Alemanha-Austria de 1982) esperam os adeptos de futebol daqui a cinco anos. Mas, sobretudo, muda por completo a natureza do torneio.

Actualmente a UEFA conta com 53 associações onde se incluem países como Lieschenstein, Andorra, San Marino, Malta, Luxemburgo, Azerbeijão.. Isso significa, grosso modo, que metade dos países que hoje disputam as vagas de forma apaixonante até ao fim, estarão na prova. Basta olhar para o quadro actual das equipas que lutam para ainda marcar passagem para o torneio realizado na Ucrânia e Polónia. O sistema de qualificação permitiria a qualificação de todas as equipas em primeiro, segundo e terceiro lugar nas fases de qualificação. Isso incluia Bélgica, Arménia, Estónia, Bósnia Herzegovina, Israel, Hungria, Noruega, Escócia, Montenegro, Irlanda, Sérvia, Dinamarca, Républica Checa, Roménia, Suiça ou Grécia. Países que, agora, entre eles, disputam apenas três vagas.

Se haverá quem defende que uma maior abertura a nações com menos história mas com uma imensa ilusão de marcar presença nestas provas só pode beneficiar o futebol europeu, haverá quem relembre que presenças surpresa como as da Letónia em 2004, Escócia em 1996 ou as anfitriãs Bélgica (2000) e Austria (2008) deixaram evidente que há uma clara diferença entre a primeira e a segunda divisão europeia...quanto mais com a terceira. O torneio passará a sofrer do mesmo estigma dos Mundiais, com uma primeira fase sem grande tensão (mas com muita polémica garantida) e os jogos mais significativos guardados para o final. Platini importa-se pouco com os adeptos e muito com a sua popularidade junto daqueles que garantiram agora a sua renovação. O torneio garantirá mais beneficios às empresas que vivem do futebol, trará mais emoção a países historicamente deslocados do eixo central do futebol europeu e, sobretudo, fará da fase de qualificação um mero trâmite para o top 12 dos países europeus (que também agradecem). No meio quem perde é o futebol. A exigência e paixão de uma competição intensa e imprevisivel desde o primeiro dia desaparece. Algum dia poderá haver um Europeu com 32 equipas, com 20 automaticamente qualificadas por posição no ranking? Não se surpreendam!


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publicado por Miguel Lourenço Pereira às 12:04 | link do post | comentar | ver comentários (2)

Sábado, 06.08.11

Em Pristina estão cansados de esperar. Mais de dois anos depois continuam num beco sem saída. A bola não rola, espera pacientemente uma decisão. Depois de tantos nãos, esperar é mesmo tudo aquilo que têm. O Kosovo quer ser independente. Os kosovares querem jogar futebol. Com a sua bandeira ao peito. A FIFA e a UEFA dizem que não é a hora mas a bola está farta de esperar...

Em Fevereiro de 2008 o Kosovo declarou unilateralmente a independência da Sérvia.

Foi, talvez, o derradeiro capitulo de um conflicto nos Balcãs com 17 anos de história. A Sérvia, destroçada por dentro depois de tantas guerras e sanções, fez um ultimo esforço diplomático e rejeitou aceitar a existência dessa República do Kosovo. Por uma vez o Mundo teve paciência e decidiu ouvir Belgrado antes de tomar uma decisão. De tanto ouvir as palavras ficaram presas no ar e a rápida decisão prometida pela ONU eternizou-se. E eterniza-se ainda hoje para desespero dos quase dois milhões de kosovares. O país não conseguiu a unanimidade necessária para ser considerado oficialmente um país - que conceito mais repelente esse de depender da vontade alheia para ser alguém - e procurou desfraldar a recém imaginada bandeira por outra via. O futebol, como sempre, era o caminho mais rápido. E eficaz.

Um mês depois da declaração unilateral representantes kosovares apresentaram-se na Suiça para convencer os executivos da FIFA e da UEFA a deixá-los entrar nas suas "célebres" familias. Futebolisticamente o Kosovo pertence à última divisão europeia, a mesma por onde andam as Ilhas Faroe, Malta, Lieschtenstein ou São Marino, por exemplo. Só um clube kosovar, o FC Pristina, passou pela primeira divisão sérvia. A maioria dos jogadores que podiam fazer parte de uma hipótetica equipa nacional kosovar estão divididos entre Albânia, Finlândia ou Suiça. E nenhum deles mostrou um exacerbado patriotismo que os fizesse sequer considerar a possibilidade de abdicar das regalias que têm hoje para cantar o novo hino nacional. A sua estrela mais cintilante, Lorik Cana, jogador da Lazio joga actualmente pela Albânia e não parece ter pressa para mudar. Ele, como muitos, vive também na sua encruzilhada particular.

 

Blatter e Platini foram peremptórios. Enquanto o Kosovo não for reconhecido pela ONU os kosovares têm de pensar noutras opções para jogar futebol. Oficialmente eles são uma não-nação, seja lá o que isso for. Irritar os russos e espanhóis é um preço que os dirigentes desportivos não estão dispostos a pagar. Os kosovares não têm culpa, afinal às restantes repúblicanas balcânicas houve até uma pressa ensurdecedora para dizer que sim antes do tempo. Eles pagam a factura de tempos pretéritos e sensibilidades agudas.

Mas a federação kosovar não desistiu. Os contactos com a Albânia, o país que mais apoiou o recém-constituido estado kosovar, levaram à realização do primeiro jogo amigável - que não oficial - para a selecção do Kosovo. Claro que os albaneses ganharam (3-1) mas isso importava muito pouco. Mas, mesmo assim, o Kosovo continuou a ser visto por tudo e todos como um desses estados malditos condenados a jogar entre si vezes sem conta. Estados como o Chipre do Norte, Monaco, as comunidades autonómicas espanholas, Sapmi, Greenland, Crimeia, Padania, Ocitânia, Gibraltar ou as ilhas de Man e Guernsey.

No último ano e meio os kosovares têm tentado organizar amigáveis com a maioria das federações mas a complexa situação politica tem sido, até a esse nivel, um sério impedimento. O apoio da Arábia Saudita (o Kosovo, como a Albânia, é um país iminentemente muçulmano) e da comunidade emigrante na Suiça deram a possibilidade ao seleccionador Albert Bunjaku de começar a fazer rodar alguns dos jogadores que decidiram assumir a sua condição de kosovares desde o principio. Jogadores como o guardião do Novara, Samir Ujkani, o lateral do Tottenham Ajet Sehu ou o médio do Hannover 96, Valdet Rama, jovens promessas que há dois anos teriam sido repescadas pelas selecções dos países onde cresceram (e o caso albanês continua a ser o mais evidente) e que agora começam a desenhar o futuro do futebol kosovar.

 

Parece impossível que o Kosovo possa estar na linha de partida para a qualificação para o Europeu de 2016 em França. Os timings das principais instituições não facilitam e a burocracia a essas estâncias é ainda mais gritante. Mas o sonho do futebol kosovar está bem vivo. Uma nação que espera por um milagre para não cair no esquecimento a que o futebol internacional muitas vezes devota os países de onde não saem os Messis do futuro.



publicado por Miguel Lourenço Pereira às 09:59 | link do post | comentar | ver comentários (7)

Terça-feira, 21.06.11

Champions League e Europe League, essas são fáceis. Também já devem ter ouvido falar da Supertaça Europeia e dos torneios de selecções, desde o Europeu para graúdos até às provas dos mais pequenos. Mas a UEFA tem uma competição europeia de que poucos ouviram falar. E que vai disputar-se em solo português a partir de hoje no Minho. A Taça Europeia das Regiões permite imaginar o futebol como outrora foi num ano de festa para o futebol minhoto.

Em 1996 a UEFA decidiu criar o primeiro Campeonato da Europa de Futebol Amador.

Desde os anos 70 que não existia um torneio oficial europeu que colocasse frente a frente equipas amadoras. O crescente profissionalismo rasgou por completo o ideário original do jogo e na década de 70 não subsistia na Europa uma liga exclusivamente dedicada a equipas amadoras. O torneio perdeu interesse e assim foi durante os vinte anos seguintes. No entanto, depois do Euro 96, a UEFA foi confrontada com a petição de várias organizações amadoras para potenciar um evento continental que devolvesse um pouco do protagonismo às equipas fora do espectro profissional. O torneio demorou três anos a acontecer. A grande dificuldade que a UEFA encontrou foi o formato a aplicar.

Inicialmente um torneio de clubes amadores, a ideia rapidamente perdeu força porque existia um crescente desequilíbrio entre os inscritos, maioritariamente representantes britânicos. Foi então que alguns dos directivos de Lennardt Johanssen propuseram a criação de um torneio de selecções nacionais, representadas por conjuntos regionais. A ideia foi bem aceite pelas federações nacionais e finalmente em 1999 o torneio teve lugar em Itália. Para representar os transalpinos a Federação Italiana criou um torneio de duas semanas. Saiu vencedora a região de Venetto que organizou e venceu o torneio frente aos espanhóis da Comunidade de Madrid. O sucesso da prova - com mais de 32 inscritos - garantiu que dois anos depois os melhores amadores da Europa se voltassem a encontrar, desta feita em terras checas Por essa altura a UEFA tinha alterado o critério de inscrição. Cada associação apresentava o conjunto que representava a região que tinha ganho o torneio nacional doméstico de futebol amador. No caso de não existir um torneio oficial como tal, era obrigatória uma ronda preliminar, supervisada pela Federação nacional, para dictar o representante oficial na prova. O torneio de 2001 disputou-se na Morávia e uma vez mais a equipa da casa triunfou, desta feita sob o conjunto representante do futebol amador português, a equipa de Braga.

 

Dez anos depois a cidade dos Arcebispos volta a fazer história no historial do torneio amador.

O jogo inaugural da edição 2011 arranca no Estádio 1º de Maio, antigo recinto do Sporting de Braga e hoje utilizado essencialmente por formações amadoras. Mas os jogos serão igualmente disputados noutras cidades minhotas. O Grupo A, que conta, para lá do conjunto bracarense, com os checos de Zlin, os alemães de Wurttemberg e os ucranianos da zona de Yednist, joga igualmente em Barcelos, Vila Verde e Fão. Os portugueses são favoritos para passar, como é habitual entre as equipas da casa, e seguir para a fase seguinte, a antecipada final. Do outro lado da poule de apuramento, o Grupo B inclui uma selecção do sul da Rússia, uma equipa dos arredores de Belgrado, um conjunto exclusivo da capital turca Ancara e um representante da região de Munster na Irlanda.

Se os bracarenses conseguiram o apuramento automático quando a UEFA anunciou, em 2009 o organizador da 7º edição do torneio, as restantes sete equipas tiveram de ultrapassar uma dupla fase de apuramento, resultado da crescente popularidade do torneio no Velho Continente.

Portugal foi inicialmente representado pelo Algarve, em 1999, uma equipa que não passou a fase preliminar, resultado que repetiu em 2003. Depois do brilharete do conjunto colectivo de Braga em 2001 o melhor resultado de um conjunto português foi conseguido pela equipa de Aveiro, terceira no Europeu de 2007. Para trás ficaram as eliminações precoces dos conjuntos de Portalegre e Braga em 2005 e 2009. É a terceira fase final para um conjunto luso e também o regresso do torneio ao sul da Europa desde a edição inaugural.

Desconhecido para o grande público, os organizadores do evento esperam atrair mais público do esperado com o apelo dos sucessos do Sporting de Braga nas últimas épocas para apoiar a equipa local. O conjunto orientado pelo ex-internacional Dito não utilizará o símbolo da FPF, afinal este torneio nacional está disfarçado como um torneio regional, mas certamente que tentará lograr um feito histórico para o futebol português, mesmo que seja ao nível do futebol amador. Afinal a magia do futebol amador tem o seu encanto. Que o diga Tony, que marcou presença na final de 2001 do torneio ao serviço da equipa de Braga para mais tarde ser repescado profissionalmente pelo Desportivo de Chaves. Em 2008, sete anos depois de se ter afirmado como um dos melhores futebolistas amadores europeus, cumpriu o sonho da sua carreira e disputou pela primeira vez a Champions League, ao serviço do Cluj. Foi o fechar de um ciclo perfeito, um ciclo que muitos dos atletas presentes neste torneio sabem que é muito complicado de repetir. Mas às vezes basta deixar cair o muito da frase, para ela ganhar outro sentido. E outra esperança!

 

Até aos anos 50 o futebol amador era, ainda, o motor do futebol europeu. À medida que o profissionalismo se tornou inevitável a atenção e curiosidade à volta dos amadores foi-se esmorecendo a ponto de que muitos nem sequer imaginam que exista uma competição internacional destas características. Certamente que em campo não se verá nenhuma cena que relembre o glamour dos grandes torneios da UEFA, nem os gestos técnicos de Messi, nem os ajustes tácticos de Mourinho. Mas a ilusão e diversão que o futebol amador consegue reproduzir permite-nos embarcar numa cápsula do tempo e contemplar o jogo, tal como era, quando tudo começou.



publicado por Miguel Lourenço Pereira às 11:08 | link do post | comentar | ver comentários (3)

Sexta-feira, 17.06.11

Contam à boca pequena nos corredores da Football Federation que os míticos leões do símbolo que a Inglaterra ostenta há mais de um século no peito há muito que se podiam ter transformado em gatitos. O peso da FA nas últimas duas décadas decaiu profundamente mas, apesar de tudo, o organismo que gere o futebol inglês ainda é um adversário temível. Michel Platini, mais diplomático que o seu mentor Sepp Blatter, entende isso melhor do que ninguém. A atribuição da final da Champions League ao estádio do Wembley para 2013, apenas dois anos depois de receber o evento, é precisamente uma manobra diplomática extremamente hábil do francês. Com esse gesto magnânimo a UEFA procura apaziguar os leões e transformá-los, uma vez mais, em dóceis gatitos.

 

 

Quando Sepp Blatter tomou o controlo da FIFA em 1998, conseguiu-o convencendo a influente FA de que o seu mandato beneficiaria o futebol inglês. Fugindo à disciplina de voto da UEFA, a Football Association ajudou a eleger o suíço e depois sentou-se à espera da recompensa.

Como tantas vezes acontece, Blatter fez precisamente o oposto e transformou os ingleses num do seu alvo preferencial. A derrota esmagadora na dupla candidatura mundialista - em 2006 e 2018 - em que os ingleses saíram sempre na primeira ronda de votações, a que se seguiram as habituais acusações de suborno, apenas reforçaram o afastamento entre FIFA e FA. Nada novo. Afinal os ingleses foram a única federação que ousou declarar guerra à máxima organização mundial. Um braço de ferro de duas décadas que nunca foi totalmente resolvido. Os ingleses sempre desconfiaram das organizações continentais e estes sempre afirmaram publicamente que a FA procurava sempre seguir um caminho distinto às restantes federações europeias. Mas o peso da FA, especialmente no Internacional Board - que promulga as leis do jogo - sempre convidaram à cautela. Até chegar Blatter, o incauto por natureza.

Se a FIFA sempre teve problemas com a FA, a UEFA não foi menos. Depois do duplo desastre de Heysel e Hillsborough, o máximo organismo europeu utilizou a Inglaterra como bode expiatório e castigou os clubes ingleses com uma prolongada ausência das provas europeias. Os ingleses não se esqueceram. Anos depois, a FA ajudou os clubes a criarem a Premier League, contra os desígnios da Liga, apoiada directamente pela UEFA. Os clubes venceram, a Premier League nasceu e as regras do jogo mudaram. Ao ver o sucesso do modelo inglês os restantes países da Europa perceberam que aquele era o modelo a seguir e começaram a afastar-se paulatinamente das suas federações nacionais. A longo prazo a Premier foi um golpe duro para a UEFA e foi também a base de partida para a formação do G14 que desafiou mesmo o destino do futebol europeu num longo braço de ferro. Michel Platini, então conselheiro pessoal de Blatter, tomou nota. Uns anos depois, quando o suíço o apresentou como candidato à presidência da UEFA, o francês procurou o apoio dos ingleses. Conseguiu-o. Meses depois das eleições colocou em prática as lições do seu mentor e de forma mais diplomática começou a tratar o leão inglês como um gatinho.

 

No meio deste contexto de conflictos pode surpreender o anuncio de que a final da Champions League 2013 volta a ser disputada em Londres. No mítico Wembley. Mas essa decisão faz parte da estratégia politica do presidente da UEFA. Ao contrário de Blatter, um dirigente muito mais autoritário, Platini segue o ideário de Maquiavel, divide e conquistarás.

Platini anunciou que o evento será mais do que uma final da Champions League. A final fará parte de uma homenagem da UEFA à própria FA, que nesse ano cumpre os 150 anos de existência. Parte de uma série de eventos de aproximação entre ambas as instituições que inclui um congresso extraordinário da UEFA na capital inglesa. O sucesso da final da passada época foi o pretexto logístico para os meios e adeptos europeus que não entendem como a UEFA pode permitir-se este tipo de atitudes e nem sequer  proceder a uma votação entre diferentes candidatos. Afinal, não foi a UEFA que defendeu o aumento da categoria de elite para os principais estádios do velho continente, as celebres 4 estrelas? E não foi Michel Platini que defendeu que o futebol europeu tinha de ser levado a todos os cantos do continente? 

Tudo isso é verdade mas Platini joga sempre com uma mão no bolso e outra na mesa.

O presidente da UEFA sabe que precisa de encontrar um equilíbrio entre as grandes potências e os pequenos países. O homem que defendeu a introdução da lei 6+5 (que minará os mercados das principais ligas), um modelo de salário inspirado na NBA, o fair-play financeiro e a redução de equipas das três principais ligas nas provas europeias tem-se afirmado como um defensor do futebol para todas as associações. Como Blatter, com os membros africanos, caribenhos e asiáticos da FIFA, distribuiu benesses, ajudas e apoio indiscutível às federações que não fazem parte da elite do jogo. Apoio a realização do Europeu de 2012 na Ucrânia e Polónia (apesar do risco que envolvia o projecto, como o tempo tem vindo a demonstrar) e há muito que declarou que gostaria de ver um Europeu na Turquia. Também aproveitou para anunciar que a Supertaça europeia, até agora um exclusivo do principado do Mónaco, passará para Praga, no coração da Europa. Uma jogada de charme que garante, de antemão, votos suficientes para uma terceira reeleição, em 2014. Ou, como todos suspeitam, uma base de apoio forte para suceder ao seu mentor, Sepp Blatter, nas próximas eleições da FIFA. 

Só que para aplicar estas medidas impopulares junto das grandes ligas, Platini tem usado o jogo também como arma para as suas missões diplomáticas. O ano passado anunciou que a sua vontade era de que as finais da Champions League fossem exclusivas de estádios com mais de 70 mil lugares, enquanto que a Europe League poderia ser disputada em estádios entre os 50 e 60 mil lugares. Reforçando essa divisão, Platini entrega a gestão do principal evento desportivo às grandes potências - que são quem o sustenta financeiramente - e pisca o olho às grandes federações. Principalmente a FA. Nos últimos meses os homens da FA têm começado o seu próprio conflicto interno com a Premier League e as medidas da UEFA são bem vistas pelos leões de Wembley, para onde mudou a sua sede , para pressionar ainda mais os gestores dos principais clubes ingleses. Platini triunfa precisamente porque consegue, com estas simples medidas, dar à FA a sensação de grandeza que os directivos ingleses sempre gostaram de ostentar. Na realidade, na realpolitik do futebol, o que o francês consegue é desarmar a pressão britânica, desviando-a para confrontos internos e para a sua mediática luta contra a FIFA, enquanto continua a gerir o jogo do velho continente à sua maneira.

 

O fenómeno de Wembley será recorrente. A politica da UEFA, sob o mandato de Platini, garante que a Champions League é um feudo dos grandes e assim continuará. O que logrou com Londres repetirá, tarde ou cedo, com Madrid, Munique, Roma, Paris e Moscovo, que provavelmente serão anunciados como organizadores das finais dos anos seguintes. Com esse rebuçado, o francês aplaca as grandes potências continentais, afasta-os do ideário da Liga Europeia de Clubes e ganha margem de manobra para colocar em prática as suas medidas impopulares. Ao mesmo tempo continua a piscar o olho aos países mais pequenos e a cimentar a sua popularidade quando chegar a nova temporada de urnas. No meio deste jogo, como tem acontecido nas últimas duas décadas, a Football Association desembrulha um presente envenenado com a alegria de uma criança na véspera de Natal. O leão está apaziguado, a UEFA vence mais um round.



publicado por Miguel Lourenço Pereira às 10:46 | link do post | comentar | ver comentários (6)

Segunda-feira, 16.05.11

Faltavam poucos segundos para acabar. Um livre envenenado de Danny Murphy encontrou a cabeça de Geli, perdido no meio de tantos jogadores. Não é assim que costumam acabar os contos de fadas mas foi assim que chegou a fim a final europeia mais empolgado da última década. Dez anos depois o Deportivo de Alavés milita na 2º B espanhola. Não é assim que costumam acabar os contos de fadas. Mas ninguém duvida que a história dos alaveses é digna de uma fábula futebolística.

 

 

A boa noticia para os adeptos do Alavés é que o pior parece ter passado.

A equipa de Vitória, capital do País Vasco, está no pote de clubes que irá lutar pela promoção à Liga Adelante, a segunda divisão do país vizinho. Há muito tempo que os alaveses andam perdidos nessa floresta de equipas caídas em desgraça. O seu caso tem uma explicação muito simples, nefastamente comum. Um pretenso milionário ucraniano, Dimitri Pitterman, comprou o clube e desfez o projecto em fanicos. Ficou apenas a memória do futebol de elite. E daquela noite em Dortmund. A noite de um 16 de Maio. Há dez anos atrás.

Numa equipa sem estrelas, que rapidamente seria desmembrada pelo poder de atracção do dinheiro fácil, ninguém esperava uma noite assim. Os jogadores do Alavés sabiam-se outsiders e apenas queriam dar a cara, responder ao orgulho dos adeptos que os acompanharam na sua caminhada europeia. O grande momento, a grande gesta tinha ficado para trás, numa fria noite de 22 de Fevereiro. O San Siro, cheio, testemunhou como o anónimo Alavés batia por 0-2 o poderoso Internazionale, uma semana depois de aguentar um 3-3 em casa. Jordi Cruyff, ao minuto 78, abriu a contagem que Tomic fechou 10 minutos depois para desespero de Marcello Lippi, Christian Vieri e companhia.

Mané, técnico modesto e com aquele espírito guerreiro de antes quebrar que torcer que moldou a escola vasca, nunca esperou a resposta dos seus jogadores depois do grande jogo do Inter em Vitória. Esta era uma equipa onde a estrela, pelo apelido, era Jordi Cruyff. Muitos jogadores espanhóis com largos anos de futebol secundário nas pernas formavam o esqueleto do conjunto. Num 5-3-2 que apostava profundamente no contragolpe, a segurança defensiva de Karmona e Tellez era fundamental. Os dois centrais, decisivos nos lances de bola parada, formavam o esqueleto. Mas era a velocidade do romeno Contra, a qualidade de passe de Desio e o instinto goleador de Javi Moreno que chamavam à atenção. Antes daquele duelo com o Internazionale a equipa tinha eliminado dois conjuntos noruegueses (Lillestrom e Rosenborg) e nas rondas seguintes bateu o igualmente modesto Rayo Vallecano e o Kaiserlautern alemão. Dois anos depois de ser promovido à Liga espanhola, o Aláves estava numa final europeia.

 

Olhando para trás, é fácil perceber o milagre do conjunto basco.

O espírito de equipa, a natureza dos rivais e a clara aposta do clube na prova da UEFA, o escaparate perfeito para fazer alguns milhões no defeso, funcionou como catalisador. Mané criou um forte sentido colectivo nos jogadores que saiam a jantar juntos com as famílias todas as semanas, comiam “pintxos” tradicionais em pleno balneário e que sentiam que partilhavam tanto as agruras como os elogios. A maioria da equipa tinha subido de divisão dois anos antes, incluindo o técnico. Os poucos que chegavam de forma ao Mendizorrozza integravam-se sem problemas e no final de contas foi esse espírito que permitiu ao clube dar a cara diante do poderoso Liverpool.

A equipa de Gerard Houllier chegava à sua primeira final pós-Heysel com uma das suas mais espantosas gerações. Tinham batido com autoridade o Barcelona, FC Porto e a AS Roma. Contavam com a estrela europeia de moda, Michael Owen, mas também Robbie Fowler, Steven Gerrard, Jamie Carragher, Danny Murphy, Gary MacAllister, Dietmar Hamman e Emile Heskey. Eram favoritos e sabiam-no. Mas não esperavam uma resistência de proporções épicas. Naquela tarde noite no Westfallenstadion a vitória do Liverpool ficou ofuscada pela exibição do modesto Deportivo. Os golos de Babbel, Gerrard, MacAllister, Owen encontravam sempre resposta. Ivan Alonso, Javi Moreno e Jordi Cruyff, no minuto 89, teimavam em amargar a festa dos reds. A tensão começava a tomar conta do banco do Liverpool e os alaveses acreditavam que um milagre, um milagre futebolístico, estava prestes a tornar-se realidade. A três minutos do fim o conto de fadas acabou na cabeça de Geli, nesse desvio para as redes de Herrera e nesse desalento que dura há dez anos. O Alavés esteve perto de fazer história. Sem entender muito bem como, acabou realmente por fazê-la, à sua maneira.

 

 

Depois dessa noite épica o mundo nunca mais se esqueceu dos vitorianos. Mas a sorte abandonou o Deportivo com aquele cabeceamento. Dois anos depois o conjunto foi despromovido à 2º Divisão. Voltaria no ano seguinte mas a gestão criminal do ucraniano Pitterman levou a instituição à falência e ao calabouço da 3º Divisão. A pouco e pouco o modesto clube começa a erguer-se. Mas faça o que fizer, sempre que o nome apareça numa noticia em qualquer recanto do mundo, a única imagem que nos saltará à cabeça é a dessa noite onde o futebol foi mais futebol do que nunca e em que ficou claro que os contos de fadas às vezes não acabam como queremos. Mas nunca deixam de ser mágicos.  



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Quinta-feira, 24.02.11

A dinâmica é irreversível. O futebol alemão está mais vivo do que nunca. Revigorado com a confirmação de que a barragem psicológica está, definitivamente, ultrapassada. A partir de agora a Bundesliga já é, oficialmente, a terceira liga mais importante do futebol europeu. O ranking da UEFA coroa uma irresistível ascensão preparada ao mais mínimo detalhe durante os últimos dez anos. Qual é o limite da Bundesliga?

 

 

 

Se a vitória do Internazionale, na final de Madrid em Maio, privou a Alemanha do primeiro troféu europeu em 9 anos, a desforra na noite passada do Bayern é, infinitamente, mais importante. Espelha a força de uma nação que soube ressuscitar das cinzas e plantar cara às grandes ligas europeias. O Calcio, que há quinze anos atrás era, unanimemente, a liga mais importante da Europa, sofreu mais um duro golpe. Apesar do triunfo in extremis do Inter de Mourinho, poucos em Itália acreditavam que a Serie A teria capacidade de aguentar o terceiro lugar do ranking europeu, o último que permite a entrada de 4 equipas na Champions League (mais 3 na Europe League). E tinham razão. A debacle da Sampdoria , Palermo e Juventus na segunda prova da UEFA obrigavam os restantes clubes italianos na prova a vencer todos os jogos - e ambas as competições - para resistir ao assédio germânico. Depois de Tottenham e Shaktar terem aberto a cova, coube ao Bayern a honra de sepultar o caixão. Serie A è piu sul podio...

Apesar de haver múltiplas razões para a queda desportiva da liga italiana (que a meados dos anos 90 era a rainha da Europa e que durante essa década teve mais representantes nas três finais europeias do que as ligas espanhola e inglesa juntas) é a espantosa afirmação da Bundesliga que marca esta mudança de rumo. A partir de 2012/2013 os alemães terão quatro vagas na Champions League onde, este ano, contam na fase a eliminar com dois dos três representantes (o Werder Bremen caiu na fase de grupos). Um êxito histórico mas previsível se atendermos à brutal diferença de números do campeonato alemão com os seus principais rivais europeus. A inversão começou a ganhar forma em 2006. A Itália, acabada de sagrar-se campeã do Mundo, saía também de um escândalo interno profundo (o Moggigate) que mudou definitivamente o rosto das equipas de top. Sem Juventus ou Fiorentina como representantes europeus, os italianos somaram nessa época (onde, curiosamente o AC Milan até se sagrou campeão da Europa) 11.928 pontos, a terceira melhor marca. Mas os alemães estavam a ganhar terreno, chegando a uns históricos 9.500, ultrapassando a Ligue 1 francesa, até então a quarta prova europeia. No ano seguinte, 2007/2008, os italianos somaram apenas 10.575 pontos contra os 13.500 dos alemães, segundos apenas atrás dos ingleses (que ocuparam os dois postos da final da Champions League e três dos semifinalistas). Quando 2008/2009 acabou, a Bundesliga voltou a recuperar terreno com 13.666 face aos 11.375 italianos. Mas foi em 2009/2010 que os alemães chegaram a números históricos (18.083) coroando-se como o pais com mais pontos somados ao longo da época e muito distantes dos 15.428 dos italianos (quartos na classificação geral após o titulo europeu do Inter). A nova temporada, que ainda vai a meio, limitou-se a servir como estocada final. A vantagem é tal que os alemães estão mais perto do segundo posto na tabela (da Liga espanhola que corre o risco de perder a maioria das suas equipas em prova nesta ronda) do que do calcio italiano.

 

 

 

 

 

Mas o que está por detrás desta profunda recuperação de uma liga que só foi, consensualmente, a mais forte da Europa durante um curto período dos anos 80?

O ranking da UEFA que corou a Bundesliga entre 1978 e 1982 como a liga mais forte do futebol europeu (numa altura em que o ranking contava para muito pouco) baseia-se na distribuição de pontos obtidos (que variam entre vitórias, empates, rondas ultrapassadas e competições ganhas) pelas equipas presentes nesse ano nas provas europeias como representantes de um país. Quanto mais equipas estão, menor é o lucro se as performances ficarem aquém da expectativa. Um cenário que Portugal viveu igualmente depois das brilhantes campanhas europeias de FC Porto e Boavista no inicio da década terem dado três equipas na Champions League à liga lusa (então quotada como a sexta liga europeia). Mas os fracos resultados do número exagerado de representantes lusos nas provas europeias comparativamente com a qualidade real da Liga Sagres significou a soma acumulada de um baixo quoficiente (sétimo no ranking em 2007, oitavo em 2008, décimo em 2009) que levou a uma inevitável queda na classificação que só se alterou com um regresso ao sexto posto final na época passada. A Serie A experimentou o mesmo problema. Enquanto que o AC Milan mantinha-se no topo da elite europeia, as performances de Inter, Juventus, Fiorentina, AS Roma, AS Lazio, Udinese, Sampdoria, Genoa, Palermo ou Napoli eram, sucessivamente, decepcionantes.

Enquanto isso os alemães, com seis equipas em prova mas com resultados gerais muito superiores, conseguiam trepar na classificação mesmo sem somar um único titulo (contra os dois italianos). As campanhas regulares de Bayern Munchen, Stuttgart, Schalke 04 ou Werder Bremen foram fundamentais para a soma de pontos. Mas se o ranking é a confirmação oficial, a realidade é que o estatuto de liga top há muito que ninguém discute ao futebol alemão.

Depois de uns anos 90 para esquecer - com problemas organizativos, falta de público nos estádios, dificuldade em gerir o fluxo de equipas e jogadores que vinham da liga da antiga-RDA - a Federação Alemã de Futebol propôs-se, no inicio dos anos 2000, a mudar profundamente a estrutura do futebol alemão a nível de clubes e de selecções. Uma mudança que demorou o seu tempo a concretizar-se e que ganhou um reforço substancial com a realização do Mundial 2006 que provou que o país centro-europeu estava no caminho certo.

 

A uma alteração profunda nas infra-estruturas (com o perfeito pretexto do Mundial) houve também uma alteração de mentalidade.

Os clubes alemães começaram a apostar seriamente na formação, incentivando os mais novos a desenvolver habilidades técnicas que vinte anos antes seriam impensáveis. Ao mesmo tempo começou uma significativa - e profunda - assimilação da forte imigração presente na Alemanha, seguindo o exemplo francês algo que foi sempre negado, por exemplo, a espanhóis e portugueses durante os anos 70 e 80. Com esse novo leque de jovens talentos começaram-se a construir equipas extremamente interessantes - Hoffenheim, 1860 Munchen, Dortmund, Leverkusen, Stuttgart e, sobretudo, Werder Bremen - que plantaram cara às grandes potências históricas, particularmente o Bayern que viveu entre altos e baixos durante toda a década. O público, agradado com as novas condições e - sobretudo - com a nova distribuição horária (para o qual ajudou muito a profunda melhora nos contractos televisivos num país onde toda a liga é dada em canais por pago) voltou aos estádios e permitiu em três anos aos clubes alemães igualarem os ingleses como os que apresentam melhor percentagem de espectadores por jogo. 

As multidões respondiam também à profunda melhora da qualidade de jogo e à nova mentalidade ofensiva que jovens treinadores como Schaff  Klinsmman ou Magath traziam às suas equipas. E com a profunda recuperação financeira germânica e a melhoria dos contractos com patrocinadores e televisão - num modelo que emulou o sucesso da Premier League - chegou também dinheiro fresco aos cofres dos clubes que souberam gastá-lo bem, criando equipas que funcionavam como um mixto do melhor da formação com nomes de grande talento e futura projecção. As chegadas de Arjen Robben, Franck Ribery, Diego, Ruud van Nistelrooy, Luca Toni ou Rafael van der Vaart deram outro glamour a uma liga que perdia, a pouco e pouco, a predominância germânica. Se é sabido que os jogadores alemães não gostam de sair do seu país natal (o que permite à Bundesliga manter quase exclusivamente a nata de uma selecção de top) a chegada de jovens promessas centro-europeias, sul-americanas e asiáticas e a inclusão de jovens de minorias étnicas locais (particularmente turcos, espanhóis e africanos) funcionou como um cocktail de primeira elevando, profundamente, o nivel médio qualitativo das equipas de uma liga que preferiu, contra toda a expectativa, manter-se com 18 clubes. Uma aposta que - aliada à pausa de Inverno, sabiamente administrada com uma organização de calendário exemplar - reforçou ainda mais a competitividade do torneio. Ano após ano o nível subiu e a Europa deixou de poder ignorar a profunda mutação do futebol alemão.

 

 

 

Uma mudança profunda e que veio para ficar. Os muitos torneios juvenis ganhos por selecções e equipas alemães garantem um futuro promissor. A perda de algumas figuras mediáticas é constantemente contrabalançada com a chegada de outros nomes sonantes. As performances dos clubes alemães na Europa não enganam e a qualidade de jogo da Mannschafft só encontra rival no igualmente maturo futebol espanhol. Apesar das distâncias serem ainda significativas - e da Liga BBVA não estar a passar pela mesma crise que o calcio - será curioso ver até que ponto o futebol alemão pode aproximar-se ainda mais do topo europeu e disputar a hegemonia do velho continente a ingleses e espanhóis. Para um país dinâmico e competitivo por natureza, o céu é sempre o limite.



publicado por Miguel Lourenço Pereira às 10:12 | link do post | comentar | ver comentários (3)

Sexta-feira, 28.05.10

A UEFA parece ter uma necessidade de se reinventar constantemente. Hoje, o máximo organismo europeu de futebol vai anunciar o organizador do Europeu de 2016. Uma edição chave, que significará um claro antes e depois no espectro de uma prova considerada pela esmagadora maioria como o mais exigente troféu de selecções do Mundo. Uma realidade que pode estar prestes a mudar.

França, Turquia e Itália.

Três nações com projectos distintos, esperam ansiosamente a decisão de Michel Platini e os seus pares.

Os analistas consideram que França parte em vantagem já que não organiza o evento desde 1984 e conta com a benção do presidente. A Turquia, por sua vez, traz um toque de novidade e exotismo que a UEFA aprecia. Por fim, a Itália, a candidatura mais modesta, precisa desta prova como de água num deserto. Seria a desculpa perfeita para reinventar um país destroçado por dentro. Mas quem, no país da bota, sabe algo sobre esta candidatura?

Se a UEFA mantém os padrões de exigência, então a França seria favorita. Se optar por levar o futebol a outros pontos do continente, a aposta seria na candidatura turca. Mas provavelmente o trofeu acabará por disputar-se em terras italianas. Um país que oferece muito pouco à partida mas que pode ganhar mais do que qualquer outro. Renovar por completo os estádios empobrecidos. Melhorar as infra-estruturas. E apostar num claro desenvolvimento desportivo são os grandes chamarizes de uma candidatura derrotada há quatro anos por Polónia e Ucrânia. E é precisamente o problema dos atrasos e erros que rodeiam a candidatura vencedora do Euro 2012 que serve de alerta para novas aventuras. Depois de duas provas com um duplo organizador em países sem tradição, a UEFA vai procurar uma nação com história, infra-estruturas e background. Especialmente com as caracteristicas que se prepara para impor.

 

O grande problema à volta do torneio de 2016 passa pelo seu modelo organizativo.

Pela primeira desde 1996, a UEFA vai preparar-se para ampliar o número de equipas de 16 a 24. Um número perigoso. Complicado até. E que desvirtua uma das máximas da prova. Desde que o torneio arrancou com 16 equipas os analistas foram unanimes em considerar o Europeu como a mais dificil prova de selecções do Mundo. Num continente de 54 países, escolher os 16 melhores era escolher la creme de la creme. Ao contrário do Mundial, onde pululam muitas vezes países sem chamam nem tradição, o Europeu é uma prova de exigência máxima do principio ao fim. Foi assim desde o Euro inglês até à aventura austro-helvética. Mas que tem as horas contadas.

A UEFA não ligou às criticas sobre o que pode significar esta mudança. A FIFA sabe, melhor do que ninguém, o que é preciso numa prova a 24. De 1982 a 1994, os Mundiais disputaram-se com esse número de participantes. Isso implicava, entre outras coisas, muita matemática na primeira fase. Deixam de se apurar apenas os dois primeiros, e agora há quatro de seis terceiros que também passam à fase a eliminar. Acaba o efeito surpresa (como o causou as eliminações precoces de França em 2008, Espanha e Itália em 2004 ou Inglaterra e Alemanha em 2000) e dá-se mais margem de manobra ás favoritas. Por outro lado, baixa o nivel exigência da primeira fase. De uma forma assutadora.

 

A Europa habituou-se à elite.

Os seus torneios de 16 eram caracterizados sempre por ausências de luxo. As equipas enviadas ao Mundial eram, praticamente, no mesmo número. O que significa que agora passarão a existir oito selecções de segundo nível com possibilidades de ir ao máximo palco europeu. Um cenário que facilitará certamente o trabalho às selecções de leste, aos países nórdicos ou aos estados britânicos, que têm deixado os grandes palcos às potências do ocidente europeu. Os adeptos podem agradecer. Haverá mais jogos (20 no total), mais equipas, mais jogadores e um maior impacto mediático. Grosso modo, metade da Europa estará presente no certame. O Euro aproxima-se assim de provas como a Copa América ou Golden Cup, e deixa de ser um torneio selectivo.

A esta aumento de equipas a UEFA responde com uma contenção de custos. Os países candidatos, por indicação da UEFA, apresentam um dossier com apenas dez estádios, dos quais provavelmente só utilizarão oito. Reduzem-se os tempos, os gastos logisticos, as distâncias. E logo numa edição que será entregue, forçosamente, a países de significativas dimensões dentro do espectro europeu. A Turquia precisa de um evento deste genero para, politicamente, reinvidicar a sua condição europeia. A França vive marcada pela derrota "olimpica" face a Londres e joga com o trunfo de ter, praticamente, tudo feito. Por sua vez, Itália, com o Calcio em queda livre e sem qualquer perspectiva risonha de futuro, encontraria num torneio destas caracteristicas a oportunidade perfeita para reinventar-se. Um argumento de peso que poderá hoje surtir efeito. Mesmo que o torneio de 2016 não tenha o mesmo glamour dos seus antecessores. 

O novo formato do Europeu é a continuação da política de Michel Platini, que já arrancou com o novo formato da Champions League, dando mais armas aos países médios e pequenos para chegarem a um torneio de elites. O formato garante no entanto que a elite europeia deixa de se preocupar em falta às grandes noites. Uma fase de qualificação simplificada, um joker de apuramento na etapa de grupos dará sempre um bónus às equipas de maior prestigio. As boas intenções da UEFA chocam com a inevitabilidade das evidências. Com este novo modo competitivo, o Europeu de Futebol perde (grande) parte da sua magia. 


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publicado por Miguel Lourenço Pereira às 08:16 | link do post | comentar | ver comentários (2)

Quinta-feira, 21.05.09

Foi uma despedida que soube a pouco mas a UEFA já se foi e com sabor a caipirinha misturada com vodka de primeira. O Shaktar Donetsk entrou para a história como o primeiro clube ucraniano a vencer uma prova europeia desde a independência mas o triunfo é mais brasileiro que outra coisa. A armada desconhecida vinda directamente do sambódromo mundial foi demasiado para um clube que teve saudades também do seu intérprete mais virtuoso e que nunca se soube reencontrar em campo. Justiça seja feita a taça ficou em boas mãos, mas quem esperava o espectáculo do Carnaval teve de contentar-se com um forró de favela.

 O quinteto de brasileiros do Shaktar entra directamente para o hall of fame de vencedores de uma prova que diz adeus e no final foram eles quem realmente fez a diferença. O projecto milionário de Donetsk não serve para consumo caseiro (que o diga a vantagem que tem o já campeão Dynamo) mas nesta edição europeia assentou que nem uma luva. Ontem, em Istambul, foi demasiado para um Werder Bremen constantemente nervoso e sem uma única ideia na cabeça. Feitas as contas ás estatísticas que daqui sempre saem, no final os teutónicos até atacaram mais, mas os “ucraniano-brasileiros” foram sempre mais eficazes e claros nas transições. Resultado: cada ataque do Shaktar era um perigo real, cada avançada do Werder uma sequencia atabalhoada de jogadores que não sabiam o que fazer com a bola. Notava-se que faltava ali o chefe e que os demais eram simples operários, habituados a obedecer sem que lhes peçam que mandem em si mesmos. Diego foi a chave do Werder Bremen dos últimos três anos. No jogo mais importante da década estava na bancada. E no campo a equipa esteve ausente. O ataque foi ineficaz do principio ao fim – por muito que Pizarro gesticula-se a torto e a direito – e o meio campo, mais habituado a conter que a criar, pediu demasiado ao jovem Ozil que tem talento mas ainda não anda para estas andanças. A defesa, essa, foi o verdadeiro calcanhar de Aquiles como se viu ao minuto 15. Um passe a rasgar a toda a linha, uma série de trapalhadas e Luiz Adriano a bater um desamparado Wiese. 

A festa brasileira tinha começado antes, com todo o seu esplendor. Qual estarolas, entre eles passava todo o jogo do Shaktar, que entre o técnico romeno, capitão croata e quinteto brasileiro pouco tem de ucraniano a não ser a tenacidade. William a Fernando, Fernando a Ilsinho, Ilsinho a Jadson e Luiz Adriano. Enfim, é só trocar os nomes que o resultado vai sendo o mesmo e os ataques sucedem-se para desespero de Schaaf. O golo de Naldo – o mais inconformado ao final – foi mais erro alheio que mérito próprio e só durante esses vinte minutos finais da primeira parte se viu algum traço de esclarecimento por parte do onze alemão. Soube a pouco. Os teutónicos atacaram mas os ucranianos controlaram. O jogo seguia empate e cada lance venenoso dos avançados brasileiros era um ai Jesus na defesa alemã. A passagem dos 90 foi vendo a Lucescu ir trocando o seu esquadrão brasileiro por jogadores da casa, mais habituados ao choque físico que se esperava no prolongamento, já que os alemães, pouco hábeis mas bastante voluntariosos, não pareciam desarmar. O espectáculo, esse tinha ficado em casa certamente, até porque nunca se viu em campo verdadeiros momentos de grande futebol. Do prometido pouco, do visto menos ainda. 

Chegamos a esses trinta minutos fatais, onde ninguém arrisca e onde poucos chegam a petiscar, e tudo ficou na mesma, com os ucranianos a entrar e os brasileiros a sair, e com os amarelados alemães (Medina Cantalejo gostou de ir distribuindo cartões escusados a torto e a direito) a sair por outros gigantes de poucas ideias e muita força. Por largos momentos este Werder não era o mágico onze que tinha eliminado AC Milan ou Hamburgo mas sim o espelho daquelas equipas teutónicas dos anos 80 e 70, mas sem qualquer tipo de eficácia. E o pezinho de samba do escrete laranja foi fazendo das suas até que um centro medido a régua e esquadro encontrou o pé atrevido de Jadson. O brasileiro desconhecido até este ano – como os colegas que fazem este “samba Donetsk” – quis ficar para a história e rematou suavemente, mas com o engenho necessário para fazer com que o nervoso Wiese não agarrasse a bola por completo. O escorregão foi fatal, a bola deslizou sobre as redes e já estava Jadson e amigos a festejar na bandeirola de campo para delírio dos milhares de ucranianos que baixaram até ao Bósforo. Feita a festa na bancada sul, lançado o desespero entro os que já pouco acreditavam e Diego, de telemóvel na mão, a acertar detalhes do contracto milionário com a Juve.

 

Os 120 minutos foram passando e no final os jogadores ucranianos aplaudiram os rivais, que acabaram por sê-lo pouco em campo, antes de subirem à tribuna. Srna, o irascível croata de bandeira ás costas, subiu ao palco para receber do senhor Platini – que volta a recuperar uma tradição antiga – essa pesada taça que já por tantas mãos ilustres passou. A história fecha-se com chave de ouro para os de Donetsk que ainda devem andar de festa rija. A Taça UEFA chegou ao fim, mas para o Shaktar promete ser apenas o princípio de uma era de sucessos.



publicado por Miguel Lourenço Pereira às 08:27 | link do post | comentar | ver comentários (2)

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Miguel Lourenço Pereira

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