Quantas vezes não ouvimos a mesma lengalenga. Um jogador num golpe desastrado comete um erro fatal. Auto-golo e vantagem ao rival. Minutos depois, movido por uma vontade imensa de ressarcir-se, eis que o mesmo vilão se faz herói e volta a marcar...desta vez no sítio certo. Ontem foi Ciani, central do Girondins de Bordeaux. Mais um nome para a lista interminável de jogadores que sentem na pele uma responsabilidade especial.
As ausências dos jogadores chave do Bayern de Munchen não ajudavam Lois van Gaal. Nem Ribery nem Robben viajaram a Bordeaux. Havia Thomas Muller, a jovem promessa, mas esse cometeu o favor de se auto-expulsar com um golpe irreflectido e que lhe poderá custar caro. Parecia que os seus estavam, na realidade, contra si. E os outros? O técnico holandês desesperava já até que um golpe de sorte, cortesia de um dos centrais mais eficazes da liga francesa. Um corte trapalhão, desastrado, inoportuno...e um auto-golo fatal. Sem saber, como diz a giria, ler nem escrever, os bávaros adiantavam-se no marcador e deixavam o grupo num imbróglio complexo. O sonho dos gascões parecia começar a desfazer-se. E todos os olhos se abatiam sob Ciani. Cabisbaixo, este retoma a sua posição. Os colegas tentam confortá-lo, mas eles também sofrem pelo golpe do destino. Terão agora de correr o dobro. Esforçar-se o dobro. Marcar o dobro de golos necessários. Ou talvez não
Michael Ciani tinha sido a estrela da épica vitória em Haifa.
Um golo determinante garantiu os três pontos e a liderança do grupo ao conjunto francês. O erro retirava-lhe agora a auréola de heróis. Foi vê-lo durante largos minutos a incentivar os colegas e a incorporar-se em acções ofensivas. Tinha um forte peso na consciência. E como quem dá, tira, decidiu fazer justiça pelas próprias mãos. Ou melhor, pela própria cabeça. Um canto, confusão na área e de novo aí está Ciani. Desta vez no sitio certo. Desta vez eufórico. Desta vez alegre. Repunha-se a justiça e começava a reviravolta. Os franceses empolgados partiam para o ataque e pouco depois Planus aproveita um erro de Altintop e dá a volta ao marcador. Van Gaal não queria acreditar e Blanc estava eufórico. Os franceses que na época passada tinham mostrado uma inocência própria de quem está pouco habituado à alta roda, este ano lideram o grupo de forma categórica. Um grupo onde estavam muito longe de ser favoritos. Ainda houve tempo para falhar dois penaltys - com Butt a redimir-se brilhantemente de um erro brutal diante de Gourcouff - mas a vitória, essa não escapava já a Ciani e companhia.
Do outro lado da barricada o Bayern volta ao pesadelo. Na Bundesliga a equipa não consegue arrancar apesar da esquadra de estrelas que dispõem van Gaal. Não havia ontem os dois extremos letais mas regressou Toni que acertou no poste em vez de voltar aos golos. E com isso o Bayern Munchen cai para o terceiro posto, a um ponto da Juventus. Agora têm três finais para evitar cair no precipicio da Liga Europa. Em França começa a sonhar-se com os Oitavos de Final uma vez mais e há quem diga que Laurent Blanc tem equipa para ir mais longe. Para já tem Ciani, um novo herói vilão capaz de redimir o mais cruel dos pecados.