As Taças têm os dias contados? A julgar pela última decisão da UEFA, a tendência é, cada vez mais, para o seu progressivo desaparecimento. Competições sem grande lucro financeiro, as provas a eliminar foram a base da organização do futebol europeu. Hoje são um empecilho para os clubes e o fim da possibilidade de qualificar-se o finalista vencido para a Liga Europa apenas contribuirá a que cada vez menos a taça seja uma forma de celebrar o futebol de cada país.
Quando não existiam ainda os meios e as infra-estruturas para alimentar um conceito de liga, a Taça foi a resposta mais eficaz e coerente para os organizadores dos primeiros passos do futebol moderno. A FA Cup não é só a mais antiga competição entre clubes do mundo. É também o espelho dessa era onde jogos a eliminar faziam mais sentido do que rondas intermináveis de todos contra todos. Não é por acaso que muitos dos países europeus onde o futebol se introduziu seguiram esse modelo muito antes de adoptar a ideia de uma liga nacional.
A isso havia que juntar também o facto emoção. Enquanto foi fácil perceber que o modelo de liga iria, inevitavelmente, beneficiar as equipas com maior potencial e recursos, a Taça era uma roleta russa de emoções, sempre aberta a surpresas. A "Festa da Taça" tornou-se num lugar comum com o tempo mas foi, durante décadas, a única forma que muitos adeptos, por toda a Europa, tinham de celebrar um título oficial com o seu modesto clube. Claro que essa cultura mítica permitiu também reforçar a popularidade da Taça dos Vencedores das Taças, uma das mais populares celebrações das noites europeias de futebol. Uma competição que se prolongou durante quatro décadas até que a galinha de ovos de ouro da Champions League acabou de vez com o seu significado. Inicialmente muitos pensaram que deviam ser os vencedores das taças - e não os segundos classificados - a acederem à prova rainha do futebol europeu. Mas essa ideia não acompanha a filosofia do dinheiro e do poder crescente e independente das ligas face às federações. E, inevitavelmente, os vencedores ou finalistas vencidos das taças foram relegados para a futura Europa League. Agora a festa acabou. Se uma equipa, a partir de 2015, ganha a taça e não está no lote de qualificados directos para a "Champions", entra na prova. Mas se a perder, mesmo que o vencedor seja uma equipa da Champions, o lugar passa directamente para o seguinte classificado não apurado via liga. A última réstia de motivação para apostar na Taça para os mais pequenos e modestos, desapareceu.
Num calendário cada vez mais congestionado, a Taça é um problema.
Os clubes grandes dão-lhe cada vez menos importância. É um troféu sem prestigio mas inconsequente financeiramente. Nem dá dinheiro que justifique o investimento nem permite aceder à prova rainha da Europa. Portanto os clubes com os maiores orçamentos focam-se em lutar pelo título ou, em último caso, em fechar o lote de lugares de acesso à Champions. Essa realidade podia abrir aos restantes clubes um espaço livre para disputar o troféu. Para eles vencer uma taça significa mais e se essa vitória garantir esse posto na Europa League que tão dificil é de conseguir nas ligas, melhor. Mas sem o atractivo financeiro e com uma exigência maior para sobreviver na dura competição regular - entre esse sonho de entrar em Champions, a prioridade de qualquer clube e a sobrevivência por ficar num lugar de qualificação directa - são cada vez mais os clubes de meio da tabela que confessam o seu desinteresse pela prova. Se até agora algo os motivava era, sem dúvida, o apuramento directo para as provas europeias. Mas que os grandes emblemas não olhem para a Taça como uma prova importante não quer dizer que não a possam ganhar, mesmo ás vezes sem as suas figuras principais. Uma vez alcançadas as meias-finais, pelo menos, não são 180 minutos a mais ou a menos que vão fazer a diferença. Em Espanha isso significa, por exemplo, que nos últimos cinco anos Barcelona ou Real Madrid sempre estiveram na final. Em Inglaterra sucedeu o mesmo com Chelsea, City e United. Em Itália também, com Juventus e Inter, em Portugal com FC Porto e SL Benfica e na Alemanha com Dortmund ou Bayern. Raros são os anos em que nenhuma dessas equipas chega ao derradeiro encontro. E aí, claro, a equipa que perde sabe que o lugar europeu está garantido, jogando sem complexos e muitas vezes, surpreendendo.
Inevitavelmente esse cenário vai acabar. Com a nova regra, as equipas sabem que só lhes vale a vitória. Mas, sobretudo, que lhes vale de pouco o esforço. Os adeptos perdem um motivo mais para seguir o seu clube pelo país, os grandes sentem-se mais cómodos e, sobretudo, os clubes de linha média-alta, sabem que contam com mais um lugar de acesso na prova regular para sonhar com a Europa. É o triunfo da influência do dinheiro, uma vez mais.
Sem a participação na Europa League via presença, ainda que com derrota, na final, muitos dos clubes europeus nunca teriam tido o prazer de saborear uma noite europeia na sua história. São milhões de adeptos combinados que encontravam neste antigo mas fascinante modelo competitivo uma forma mais de celebrar a sua modesta existência. Platini e os seus sequazes, uma vez mais, trataram de seguir pela via contrária, reforçando o poder da elite financeira europeia pavimentando cada vez mais o caminho para uma competição única composta exclusivamente pelos clubes mais ricos e poderosos das ligas nacionais.