Cumpriram-se as previsões e cumpriu-se o sonho. Do Real. De Cristiano. Dos adeptos britânicos. Dos admiradores e dos detractores. A partir da próxima semana, quando for oficializado o contrato que o extremo português rubricará no Santiago Bernabéu, Cristiano Ronaldo passará para a história como o primeiro futebolista a roçar o impensável valor de 100 milhões de euros numa transferência. Faltariam apenas 4 milhões mas pouco importa. Numa grave época de crise o Real Madrid volta a mostrar toda a sua arrogância desportiva graças aos vários créditos conseguidos pelo seu novo presidente, e dá um golpe na mesa no mercado internacional. O Manchester United agradece. Recebe o valor mais alto alguma vez pago por um desportista, livra-se de uma constante dor de cabeça e pode preparar tranquilamente a temporada do próximo ano. No meio do turbilhão, o português tranquilo. Sem necessidade das birras da pré-temporada passada, Cristiano Ronaldo cumpre o seu sonho de jogar em Madrid. Um clube bem adequado ao seu caracter onde será adorado como um Deus na primeira semana e crucificado nas seguintes se não exibir o mesmo futebol que mostrou ao mundo nos últimos três anos. São assim os sonhos, também têm o seu lado negro.

No final do Verão passado Ferguson foi ao Algarve convencer Cristiano Ronaldo de que o Real Madrid não era o clube ideal. Mas não havia nada a fazer. A mãe do jogador queria que o filho jogasse em Madrid. Cristiano queria seguir os passos de Figo e afinal, a solarenga capital de Espanha (onde também neva no Inverno se ninguém lhe disse) estava mais perto da sua ilha do Atlântico. O jogador que sempre preferiu falar espanhol diante da imprensa do país vizinho apesar de ser constantemente ridicularizado por aqueles lados, obrigou o seu mentor a colocar uma nova cláusula no seu contracto. Com o beneplácito da direcção do Real Madrid de Ramón Calderon, foi assinado um pacto entre os dois clubes. Até Junho de 2009 o Real Madrid comprometia-se a pagar 96 milhões de euros pelo português. Caso contrário teria de pagar uma penalização de 30 milhões. Poucos souberam da trama, parecia que a história estava esquecida. O Man Utd arrancou para mais uma época de sonho (Ronaldo nem tanto) e o Real Madrid foi-se afundando de tal forma que acabou por perder técnico e presidente, homem que agora anda pelos tribunais de Madrid. Chegou o final do ano e com ele veio Florentino Perez, o homem que para os madridistas é como Deus, sem o ser na realidade. Quem o é são os milhões que o presidente consegue nos bancos dos amigos (ele é, afinal, o sexto homem mais rico de Espanha) e que lhe permitiram pagar 65 por Kaká na sua primeira semana. Chegou-lhe então à mão o contracto pré-assinado e não teve mais remédio que accionar a cláusula. Ronaldo foi de férias já sabendo que não voltava a Manchester. A cara de Ferguson em Roma era de quem sabia que, uma vez mais, lá teria de montar uma nova equipa. Mas ficava-se a rir. Afinal, quem tem 96 milhões para gastar?

Com este negócio o Real Madrid volta a romper o mercado.
O Manchester United gastará bem o dinheiro (fala-se já em Benzema e Valencia, para abrir) e o presidente merengue jura que as camisolas, os direitos de publicidade e o marketing de Cristiano, que passará a ser em Madrid CR9 porque o 7 tem dono (o inevitável Raúl que já obrigou a Figo e Beckham a passar pelo mesmo) serão suficientes para amortizar o investimento. A verdade é que em Madrid o dinheiro parece ter um diferente valor já que, não é por acaso, as quatro maiores transferências da história foram todas parar ao Bernabeu. Que há jogadores que se rentabilizam por si mesmos, isso não é novidade. Mas alcançar os valores desta transferência é algo arriscado para um clube que vive uma situação de incerteza financeira (um passivo a rondar os 200 milhões de euros) e num campeonato à beira da falência técnica.
Desportivamente Cristiano Ronaldo tem aqui o desafio da sua carreira.
A sua estadia em Madrid, depois de cinco anos na Premier League, podem cataloga-lo definitivamente como um dos melhores jogadores do Mundo ou dar razão aqueles que indicam que o futebol de Cristiano não está moldado para o estilo de jogo Mediterrâneo, como se tem visto nas suas performances pela selecção. Nas alas do clube madrileño Cristiano Ronaldo terá uma marcação bem distinta à que está habituado e o próprio ritmo de jogo e o posicionamento defensivo não benificiarão tanto as suas cavalgadas heroicas, já que a defesa em Espanha joga habitualmente bem mais recuada que as defesas britânicas. Além do mais Cristiano terá de partilhar pela primeira vez o protagonismo (algo a que está mal habituado) com Kaká, para muitos o verdadeiro menino bonito de Perez e Pellegrini, e com o balneário espanhol que não vê com bons olhos a figura de um craque luso a tomar protagonismo. Pequenos detalhes que poderão revelar-se grandes ao longo de ano. De momento o jogador está tranquilo, os adeptos estão eufóricos e os analistas expectantes.
A partir da próxima época veremos verdadeiramente quem é Cristiano Ronaldo.