É preciso recuar até 1974 para descobrir a última equipa europeia que conseguiu vencer de forma consecutiva um Europeu e um Mundial. Os espanhóis estão a cinco jogos de fazer história. Se à Alemanha de Beckenbauer parou Panenka e o seu penalty, à Espanha de Xavi e companhia vão levar a exame um trio de equipas sem nada a perder e com vista a conseguir um lugar imortal na história, derrubar a super-campeã. Italianos, croatas e irlandeses estão claramente num segundo plano futebolístico mas a motivação de seguir em frente será maior do que nunca e o equilíbrio entre as três selecções pode ditar muitas surpresas.
Não chegam com a frescura fisica e mental de outras vezes, mas quem se atreve a apostar contra a Espanha?
Depois de vencer o Mundial de 2010, perdendo o jogo inicial (algo inédito), apontando apenas quatro golos em quatro jogos na fase a eliminar (também inédito), Espanha entrou em crise existencial. Perdeu de forma estrepitosa amigáveis com várias selecções, venceu um grupo acessível sofrendo até aos últimos minutos na Lituânia e Escócia, sobretudo, e afronta agora um último desafio para uma geração que se despede. A Vicente del Bosque caberá realizar essa transição da forma mais tranquila possível mas o clima quente entre jogadores do Real Madrid e Barcelona, o desgaste físico e emocional dos blaugranas e a afirmação noutras paragens de novas figuras, não só tornam a Espanha uma equipa mais forte como, ironicamente, também a fazem mais débil.
Se parece evidente que o estilo é inegociável, também é certo que a necessidade de novas variantes resulta da metamorfose do onze titular. Llorente é o avançado referência mas a sua presença em campo exige outro jogo. Apostar num 4-6-0, como já fez em alguns amigáveis, devolve o ideário táctico de 2008, com os "bajitos" a controlar o jogo, com mais protagonismo para Silva e Mata e o apoio de Xabi Alonso, Busquets, Xavi e Iniesta. E ainda há Cazorla, Fabregas, Torres...
No papel os espanhóis parecem invencíveis mas atrás, a defesa sem Puyol e sem um lateral-esquerdo fiável (agora que Arbeloa se mutará para a direita com Ramos e Pique no miolo central), parece mais frágil do que nunca. O problema é saber roubar a bola e aproveitar os espaços que vão ficar atrás do carrossel da Roja, uma equipa de tracção à frente que lida muito mal com equipas que, tal como com o Barcelona, se negam a jogar de corpo e corpo e esperam a sua oportunidade. Foi assim no Mundial com Portugal, Paraguai e Holanda e foi assim na fase de qualificação e nos amigáveis que perderam. Contra croatas, irlandeses e italianos é difícil pensar noutro cenário, pelo que a paciência será a grande arma dos espanhóis para seguir em frente e fazer história, outra vez!
A Itália de Cesare Prandelli tem a clara ambição de ser uma "pequena Espanha" mas no jogo inaugural, com os campeões em titulo, é fácil adivinhar que a Azzurra vai ser tão italiana como sempre. E com o enésimo estágio caótico, depois de mais uma polémica judicial à volta dos azzurri, que se pensar? A Itália é uma equipa que se dá mal com os Europeus mas bem quando chega a uma prova contestada por escândalos domésticos. Foi assim em 1982, foi assim em 2006 e agora repete-se o mesmo cenário.
Criscito abandonou a concentração, Bonucci e Buffon vivem debaixo da sombra da suspeita e entre os desejos de Mario Monti, a resignação do seleccionador e a raiva dos adeptos, tudo pode suceder.
No plantel de jogadores que aterram na Polónia há muitas variantes da equipa que fez uma péssima figura no último Mundial mas é sobretudo a condição física de elementos nucleares (Pirlo, Di Natale, Marchisio) que realmente medirá o valor deste novo projecto. Prandelli exibiu-se em Roma como um treinador de ideias e de profundo sentido táctico e aliando a sua experiência aos novos rostos que vai incorporando ao conjunto italiano pode-se esperar uma equipa atractiva da que se pode questionar, de momento, a sua real fiabilidade.
Sem um goleador puro - um ataque com Di Natale, Balotelli e Cassano não é um ataque demolidor - o jogo italiano procurará sobretudo explorar a sua riqueza defensiva (Buffon volta, talvez para o seu último torneio, e Chellini, Bonucci, Maggio, Bochetti e Balzaretti são opções de grande quilate) e, como sucedeu com a campeã Juventus, procurar Andrea Pirlo como o seu eixo nuclear. O veterano médio, fisicamente "ausente" na sua melhor versão no último Mundial, será a vara de medir deste conjunto. Ao seu lado Marchisio, Giovinco, Nocerino, De Rossi e Montolivo trazem criatividade e pausa, armas de Prandelli para por em prática o seu estilo de jogo. O facto de ter apostado claramente na juventude nesta convocatória anuncia uma nova era do futebol italiano, uma mutação que terá de resistir aos resultados, sejam quais sejam, para triunfar a longo prazo.
Slaven Bilic já anunciou que este é o seu canto do cisne ao leme dos croatas.
Chegar ao torneio, depois de eliminar a Turquia num play-off onde foi claramente superior, permitiu-lhe cumprir os objectivos mínimos. Passar à seguinte fase, como logrou em 2008, um objectivo realista mas que dependerá, sobretudo, do nível de implicação de uma selecção que oscila entre as grandes noites e as tardes mais desastrosas com uma assiduidade assombrosa. O jogo técnico da Croácia continua a ser um dos seus principais emblemas e Luka Modric o seu lider espiritual. O médio do Tottenham não viveu este ano uma época tão brilhante mas continua a ser o elemento à volta de qual Bilic confia em ultrapassar os dificeis obstáculos dos favoritos Espanha e Itália.
Mas nesta geração croata low profile, longe das suas mais brilhantes épocas, há muitos jogadores capazes de proteger Modric e dar asas aos sonhos dos croatas. Perisic é, actualmente, um dos médios mais sedutores do futebol europeu. Jelavic realizou uma segunda volta memorável em Goodison Park. A experiência de Srna, Krankjar, Olic, Rakitic, Pranjic e Corluka um plus de qualidade que fazem da Croácia uma séria candidata a ser, uma vez mais, a surpresa da prova.
Em 2008 a classe do jogo dos axadrezados permitiu-lhes sonhar mais alto do que nunca mas o choque de realidade provocou uma pequena metamorfose a curto prazo. Conscientes dessa experiência, Bilic e os seus jogadores sabem que têm de entrar na Polónia com os pés no chão, sabendo que partem desde atrás para dessa forma surpreenderem e quebrarem os mais cinzentos prognósticos.
Quando Giovanni Trapatonni aterrou na ilha de esmeralda, os mais cinicos anunciaram a lenta destruição do que restava do futebol irlandês.
Mas a "Velha Raposa" italiana fez o que sabe fazer melhor e mudou por completo o rosto dos irlandeses, ausentes dos grandes torneios desde 2002. A mão de Henry impediu-os de chegar á África do Sul mas ninguém foi capaz de deter a sua marcha até à Polónia.
É a última oportunidade para a velha geração de Shay Given, Damien Duff, John O´Shea e Robbie Keane. Mas o grande mérito de Trapattoni foi conjugar essa geração com novos talentos que fazem parte do colorido nacional da Premier League, desde os golos do gigante Shane Long ao talento inato de James MacClean, a grande surpresa na lista de convocados depois de só ter despontado na equipa titular do Sunderland esta época. O jovem extremo é um dos ex-líbris dos irlandeses que chegam a esta prova como em 1988, num grupo complexo e sem qualquer pressão. Aí começou a desenhar-se a lenda do futebol irlandês, habituada a superar os mais negros cenários, de tal forma que sempre que participou num grande torneio internacional, a República da Irlanda logrou passar da fase de grupos. Foi assim no Euro 88 e nos Mundiais de 90, 94 e 2002.
Um aviso sério para a concorrência que sabe que na Irlanda encontrará uma equipa tacticamente muito organizada, apostada em aproveitar ao máximo as poucas oportunidades que vai gerar e apoiada, emocionalmente, no grito de guerra dos seus velhos heróis e na vontade de comer o Mundo dos seus novos legionários.
O Em Jogo aposta:
1º Espanha
2º Itália