A vitória tem destas coisas. Um triunfo categórico nos números, complicado na forma, carimbou a passagem de Portugal para o seu quinto Campeonato da Europa consecutivo, um logro ao alcance apenas da verdadeira elite do futebol europeu. Mas nesse clima de euforia tão habitual a quem não está habituado a ganhar começam a distinguir-se os traços de arrogância que costumam ser maus companheiros de viagem. Portugal estará em Junho na Europa de Leste, mas não deixará de ser um convidado secundário numa festa com outros protagonistas.
O estádio da Luz não encheu mas foi suficiente. Para os bósnios pelo menos.
A equipa dos Balcãs não quis jogar os primeiros 90 minutos, recorrendo a tácticas tão legitimas como pré-histórica. Na hora e meia que passou no tapete verde impecavelmente cuidado do estádio onde Portugal já se habituou a resolver noites difíceis, não conseguiu. Os nervos, a combustão interna de Safet Susic e a primeira meia-hora das estrelas portuguesa fizeram o resto. A equipa da Bósnia esteve mais dentro da eliminatória pelos erros arbitrais do que por méritos próprios. Dzeko nunca fez juz à sua merecida fama internacional e nem Misimovic nem Pjanic souberam ter a tranquilidade mental para explorar as constantes debilidades defensivas de um Portugal que, mesmo com tudo a favor, acabou por sofrer demasiado.
Ficou evidente que a selecção lusa continua a ser mais uma manta de retalhos individuais que uma verdadeira equipa. Decidiu o génio individual de Cristiano Ronaldo e Nani na primeira parte e culminou a noite um golpe magistral de Miguel Veloso, naquele que foi talvez o seu mais completo jogo pela equipa das quinas. Desiludiu profundamente o trabalho do quarteto defensivo com Fábio Coentrão apagadíssimo (e infantil como poucos no lance da grande penalidade) e um Rui Patricio que, com a bola nos pés, continua a ser um terror para os próprios colegas. Mas como os bósnios tinham a bola exíguos minutos nos pés, o público não notou e fez a festa com que a maioria não contava. Depois da sofrida vitória por 1-0, frente aos mesmos bósnios, em 2009, ou os triunfos diante de Hungria e Estónia em 1999 e 2001, a Luz voltou a ser o talismã para uma noite de gala. Uma noite de enganos.
Paulo Bento continua a ser um técnico com debilidades tão evidentes que só mesmo a imagem do arregaçar nas mangas explica bem o que vai por aquela cabeça. Homem mais de acção do que planificação, o seleccionador apresenta-se como um novo Scolari, figura militarizada que aposta mais no esforço, na raça e no querer do que, propriamente, nos conceitos de preparação técnico-tácticos. O 4-3-3 que aplicou na selecção lusa continua a ser um tapete de espaços mortos onde os conceitos se confundem com os indivíduos. Quando algum jogador falta e um ou outro está em baixo de forma, a inépcia de Bento é mais do que evidente. Viu-se na Dinamarca onde Portugal podia ter sido humilhado com profunda naturalidade. Um seleccionador que marca toda a linha do seu trabalho em homens e não em conceitos corre o risco de se transformar numa presa fácil da sua própria fortuna. Ontem, pela primeira vez em largos anos, Portugal brilhou. Mas realmente brilhou no individual - como uma constelação onde as estrelas Nani, Cristiano, Meireles e até Moutinho fizeram das suas - enquanto que voltou a não convencer no colectivo.
Aqueles que habitualmente se deixam levar pelo frio na espinha que os hinos nacionais costumam provocar encontrarão mil e um motivos para sufragar Bento que tem a seu favor um registo de resultados mais do que aceitável. O mesmo sucedeu com Queiroz antes da viagem à África do Sul, onde se percebeu que uma brilhante fase de qualificação contava pouco quando os jogos a doer eram com rivais de outro calibre.
Portugal continua a ser uma equipa da parte média do futebol europeu, não demasiado longe de uma Bósnia que cometeu dois erros crassos na preparação deste play-off e que, por isso, mereceu a eliminação.
A batalha de Zenica era escusada e acabou, paradoxalmente, por beneficiar Portugal. Em lugar de aproveitar, como se viu nos últimos 20 minutos, a fragilidade mental dos lusos a equipa da casa preferiu a provocação e o anti-jogo e acreditou que um golo em Portugal seria suficiente para quebrar uma malapata de seis anos. Não foi. Portugal soube responder com categoria com dois golos de bola parada, um gesto técnico irrepreensível e três tentos de ponta-de-lança que transformaram uma qualificação numa orgia nacionalista. E no entanto o rival pareceu incomodar menos os jogadores de vermelho do que a péssima (outra vez) arbitragem de Wolfgang Stark que parece não se dar bem com jogadores lusos. Os golos, a celebração, escondem a realidade, como sempre.
A decadência lusa é um fenómeno evidente e facilmente reconhecível desde 2006.
O último biénio da era Scolari pautou-se por uma mensagem em tudo similar à que preconiza hoje Bento, o habitual discurso do guerrilha de bairro sem ideias que se apoia, sobretudo, no génio de quem o rodeia. Seleccionador que gostava de deixar vitimas pelo caminho como Bento(e mostrar-se orgulhoso disso), seleccionador que gosta de criar o "grupo" antes que premiar os melhores, (como Bento) e, sobretudo, seleccionador sem um conceito de jogo na cabeça. Depois de suar desnecessariamente num grupo acessível, Portugal fez fraca figura no Europeu de 2008 e deixou claro que a elite europeia, por onde tinha andado desde 2000, era uma utopia. Mas não deveria ser um drama, até porque é fácil constatar que a selecção francesa, carrasco preferencial dos lusos, vive na mesma situação sensivelmente desde então. Mas para os portugueses, sempre fáceis de ferir no seu orgulho, parece um insulto reconhecer a realidade. Não o é, até porque ser parte da elite, partir como favorito, sempre foi mais um handicaap para países pequenos do que propriamente uma bênção.
A falta de realismo de Paulo Bento é atroz e a sua reencarnação no espírito de José Torres deixa maus augúrios para um futuro. Sonhar com os pés no chão é algo que Portugal nunca soube e quando o máximo responsável pela selecção se arroga ao direito de que lhe deixem sonhar está a passar a mensagem sufragada pelos jogadores - de que Portugal pode repetir noites históricas no próximo mês de Junho. E, no entanto, pode tanto como qualquer outra das 16 equipas presentes e, sobretudo, pode muito menos do que aqueles que realmente vão ser o centro das atenções. Apesar de Cristiano Ronaldo, os lusos vão ser convidados secundários na festa de espanhóis, alemães, holandeses e italianos, seguramente os verdadeiros protagonistas. Portugal apresentará os seus problemas estruturais crónicos (falta de um guarda-redes e ponta-de-lança de nível máximo, falta de profundidade de um plantel que tem de recorrer a figuras secundárias de clubes de ranking baixo do campeonato espanhol em posições chave) e dependendo da fortuna do sorteio, pode dar-se por contente por ter participado. Afinal uma equipa sem um único criativo, uma equipa onde cabem jogadores tão medianos como Micael, Postiga, Almeida, Pereira, Patricio, Bruno Alves, Martins, Quaresma ou Rolando que pode fazer numa prova internacional que não possam fazer suecos, dinamarqueses, croatas, gregos ou russos, todos eles seguramente sem uma estrela mediática do nível de Ronaldo, mas com valores individuais seguros e um colectivo (e mais do que isso, uma estrutura táctica e mental) muito mais forte que a lusa?

Em 2008 a fortuna permitiu que o decadente projecto de Scolari se encontrasse com o grupo mais fácil do certame. A reedição do modelo de duplos cabeças de série pode reservar o mesmo destino, com Ucrânia e Polónia, Rússia e Inglaterra, Irlanda e República Checa como companheiros de viagem ideais. Mas tudo o que é bom acaba e será fácil entender que num hipotético Espanha-Alemanha-Portugal-França/Dinamarca, os lusos sejam os últimos de grupo. É essa a realidade que os 6-2 da noite de ontem já começaram a esconder em jornais, blogues e nas conversas de café. Onde ninguém vai perder tempo a entender o desajuste defensivo de Portugal no final da primeira parte, a falta de nervos de Patricio, a inépcia do jogo ofensivo dos laterais ou, sobretudo, a falta de opções de nivel quando o génio individual de Ronaldo-Nani não funciona. Em Portugal continua a pensar-se pouco futebol e por isso, para muitos, Junho pode ser um mês de frustrações quando devia ser um mês de celebração e festa. Hoje Portugal está num top 16 europeu, mas de pertencer ao top 4 passou a ser parte do último lote de quatro, por muito que o ranking da UEFA tenha sido mais amigo do que habitual. Querer criar uma sensação de vitória futura com base num só jogo é apenas poeira para os olhos de quem procura agarrar-se a algo no meio do lodo. Mas como os deuses gregos já provaram uma vez, o realismo no mundo da bola vem sempre ao de cima, por muito que doa.
De xapac a 16 de Novembro de 2011 às 10:01
De todos os brilhantes textos que tens escrito por aqui, este é seguramente aquele com o qual concordo menos. Se a questão fulcral é o que pode fazer Portugal e como se pensa o futebol em Portugal, nesses pontos concordo contigo. Agora dás "alguns tiros" claramente na água. Já percebi que não és fã do Patricio, ele até pode não jogar muito bem com os pés mas ontem não vi nenhum lance de terror para os companheiros como disseste. Comparas Bento a Scolari e logo no discurso as diferenças são enormes. Scolari adepto do mata mata, Bento já tinha dito que não era jogo de morte e até desvalorizou uma possível derrota. E em relação ao futuro, Bento disse ontem claramente que Portugal não é favorito e que existem seleções muito melhores e com mais experiência do que a nossa. Se o problema é ele sonhar, bom sonhar sonham todos os adeptos e agentes de futebol, no dia em que isso deixar de ser possível morreu o futebol.
E não sendo Paulo Bento um génio tático, compará-lo a Scolari taticamente é tremendamente injusto. Mas o problema talvez seja o teu conceito tático, uma vez que não vejo na Dinamarca nenhuma qualidade tática que a coloque acima de nós.
Ahh...E já agora quem me dera a mim que o realismo do futebol me fizesse doer como aos gregos...é que estes já foram campeões da europa uma vez, coisa que nós nunca fomos!
Xapac,
Obrigado pelas palavras e pela discordância.
Para mim nenhum treinador é igual que outro mas há seguramente grupos que se assemelham. Bento, já nos dias de Alvalade, sempre me pareceu que pertence à estirpe de Scolari (e uso aqui o exemplo Scolari para criar um paralelismo como seleccionador) como podia ter dito António Oliveira. São técnicos que tacticamente apresentam muitas deficiências, que dependem sobretudo do trabalho individual e que colocam o enfâse na garra, na raça e na atitude mais do que na estruturação de ideias. No 4-3-3 de Bento eu não vejo ideias. Vejo uma amálgama de jogadores, uns melhores que outros, que valem pelo individual mais do que pelo colectivo.
Exemplo prático: ontem Miguel Veloso realizou um jogo brilhante porque, individualmente, soube não atropelar-se com Moutinho e Meireles/Micael. Foi a primeira vez que um médio mais recuado do triângulo o logrou. E porquê? Porque jogou um individuo mais apto para essa função. No entanto à sua frente jogaram dois números 8, que vezes sem conta se atrapalham, como sucedeu com a Inglaterra do duo Lampard-Gerrard. Um técnico é forçado a ver isso e a fazer algo. Bento não consegue quebrar essa dinâmica num meio-campo que é melhor a destruir e recuperar (viu-se quando entrou Micael) que a criar.
O Patricio é um guarda-redes mediano, mediano, clara aposta pessoal do seleccionador e com os pés é um desastre. Ontem vi-o como sempre o tenho visto, nervoso, nos atrasos a colocar a bola no miolo em vez de sair a jogar com calma, como se recomenda quando se está a ganhar. Vi quatro pontapés para a frente com a defesa deslocada, face ao meio-campo, e com Dzeko sem marcação. É função dele saber a consequência dessa forma de reposição mas acho que ainda está verde para isso.
Quanto ao sonho. Lembrei-me do Torres e Portugal vinha de uma dinâmica parecida porque ao seleccionador cabe uma responsabilidade que a imprensa ou adepto comum não tem. A mim não me vale o discurso da prudência mascarado debaixo do sonho. Paulo Bento sabe que o plantel que tem não lhe permite, à partida, passar sequer de uma fase de grupos num grupo "normal". Claro que no sorteio podemos calhar no grupo da morte (teórico) ou no grupo mais fácil, e há que avaliar os rivais (e Portugal ainda é melhor que a Polónia, Ucrânia, Irlanda e R. Checa). Mas sobretudo há que saber estar na vitória. Os comentários, por exemplo, em relação a Carvalho e Bosingwa revelam um revanchismo que não lhe fica bem. Certamente que alguém lhe lembrará que a "Obrigação" do cabeça de série do grupo é apurar-se em primeiro ;-)
PS: Qaunto aos gregos, o comentário foi nesse sentido. Sem esta atitude de vedetismo, a Dinamarca e Grécia foram campeões da Europa. Merecidamente. Porque Portugal podia ter mais individualidades mas nunca, durante todo o Euro, soube jogar um futebol colectivo como os gregos. E o que está na altura dos portugueses entenderem é que há duas formas de ir para uma competição. Com a arrogância do jogo de estrelas (o mesmo mal dos ingleses e até dos espanhóis até à pouco), ou com um plano estruturado, mentalizado e treinado à exaustão onde o individuo é parte do colectivo, é a ideia que prevalece. Não é Bento que vai apostar pelo segundo e não conheço nenhuma equipa que alguma vez tenha ganho algo apostando apenas no primeiro desde o Mundial de 1970.
um abraço
De David Santos a 16 de Novembro de 2011 às 10:59
Excelente prosa,
O Paulo Bento é um gajo mediocre colocado pelo Mendes para valorizar os jogadores que tem em carteira. Ninguém o respeita, nem os jogadores, nem os directivos. Ontem viu-se o brio individual de jogadores que sabiam que não tinham outra opção ou o dinheiro e a fama de estar no Euro ia pelo cano abaixo. Nesses momentos as estrelas funcionam todas muito bem. Depois é o que se vê!
Portugal tacticamente é um desastre e uma defesa com Pereira-Coentrão-Alves-Pepe-Patricio é um convite à boa vontade alheia. Imagino o ataque da Espanha ou da Alemanha a fazerem deles gato sapato. Mas os tugas de turno continuam a pensar que somos os maiores porque temos o melhor treinador e jogador do Mundo (que são). Nestas provas valem as equipas e como equipa só funcionamos 2 vezes na vida, em 66 e 2000.
Espero que Portugal ganhe o Europeu mas não apostaria nem um cêntimo a que passa da fase de grupos. E se for no grupo da morte, como dizes, ainda pode haver desculpas. Bonito, bonito era que fosse num Polónia, Irlanda, Rússia...aí eu queria ver estes eufóricos aos berros com o Bentinho.
cumprimentos
David,
Os adeptos são sempre assim, na vitória os maiores, na derrota os piores. Não espero outra coisa porque isso também é parte do jogo (e fico feliz que alguns se lembrem do Em Jogo para descarregar frustrações como vi noutros posts).
Não tenho a veia nacionalista de querer que ganhe Portugal sim ou sim porque o eu desfruto com futebol e se Portugal não joga à altura de uma grande competição, naturalmente não captura o meu favoritismo. Mas fico contente que se apurem, mesmo que seja pela porta de atrás.
Tens razão em muito do que dizes, mais do que pensas, mas o problema de Portugal não é o Bento, longe disso, e imagino que no lodo onde chafurda, ele tente fazer o melhor que sabe. O problema é maior, mais profundo e de muito mais dificil resolução e Portugal, mediocre como é, não tem as armas da França, por exemplo, para sair do buraco onde se meteu.
Com o Europeu a 24 equipas o mais provável é que Portugal se apure sempre nos proximos 50 anos (o Mundial é outra coisa) e o mérito de momentos como este deixará de fazer sentido realmente. As pessoas têm de entender que esse complexo de inferioridade crónico de quem se lembra de uma selecção que nunca ia a lado nenhum não se pode traduzir neste espirito de euforia crónica sempre que se ganha alguma coisa. Isso não é a melhor base de trabalho para pensar o futuro.
Eu pessoalmente tenho mais problemas com a crónica ausência de Portugal dos torneios juvenis nos últimos anos, salvo o último Mundial, do que as performances dos AA.
Um abraço
De hmocc a 16 de Novembro de 2011 às 12:51
Wow Miguel, acho que é a primeira vez que te "ouço" num registo mais "agressivo" (no melhor sentido da palavra).
Concordo com as ideias gerais que expões mas, sempre um mas, lembro-te apenas que o futebol é feito de homens, todos diferentes, e o que funciona para uns e para outros tambem e diferente.
Ontem claramente tivemos ataque a mais e defesa a menos, e vivemos do rasgo individual de 3-4 elementos: CR7, Nani, Moutinho e Veloso (estes 3 últimos parte do Sporting de Bento).
Quanto às questões estruturais o novo Presidente da FPF que as resolva, essencialmente a questão da Casa do Futebol e do Estádio Nacional. A primeira porque vai dar corpo a uma identidade necessária ao futebol português e o segundo porque será a cara dessa identidade.
Quanto ao futebol propriamente dito, discordo na questão do Guarda Redes. Acho que temos excelentes GR e cabe ao seleccionador escolher aquele que dá mais garantias. Para mim seria o Quim ou o Beto. Para PB é Rui Patrício.
O caso dos Avançados é um caso mais crónico e que precisa de mais coordenação a nível nacional para que a formação dos clubes e escolas não incida apenas em produzir médios e extremos. Para já temos varias "promessas" por cumprir (Postiga, Almeida, Orlando Sáe uma grande esperaça: Nélson Oliveira. É pouco mas é o que temos para este Euro.
Depois, toca a construir o futuro do Futebol Português de uma forma sustentada e coordenada.
Hmocc,
É sempre bom quando se surpreende. Talvez a nacionalidade, inconscientemente, me faça mais critico, mas sinto-me sempre desconfortável quando os adeptos de bancada enchem o mundo com louvas de alegria quando os problemas continuam aí. Lembram-me muito estes politicos que temos de aturar em campanha e depois, quando as coisas saem mal, é um vê se te avias.
Em 2009 os jornais anunciaram um "Adeus Africa" e agora ninguém duvidou do apuramento. Os adeptos, frivolos com a equipa de Queiroz - defensivamente muito superior a esta - agora deliram com o futebol ofensivo de uma equipa que tem marcado quase sempre bastante golos mas que tem talvez a pior defesa de sempre das fases de qualificação de Portugal na era moderna.
Portugal tem muitos problemas, como bem apontas, e não é Bento, nem Mourinho nem nenhum seleccionador que os irá resolver. E enquanto persistam - e por isso me preocupa mais os miudos que os seniores - o cenário não irá mudar. Mas aos adeptos só lhes preocupa o 6-2, festejado com euforia quando antes a Bósnia era tratado como uma equipa de terceira divisão europeia. Então em que ficamos?
Portugal mereceu entrar no Euro porque foi melhor que a Bósnia, mas fosse tão boa a selecção e entre os primeiros e melhores segundos certamente haveria sitio. É isso que muitos têm de começar a entender, o sitio vai desaparecendo porque há problemas que nem uma linda goleada podem esconder.
um abraço
De
ze luis a 16 de Novembro de 2011 às 15:18
Não é preciso assegurar a qualificação com o alargamento a 24 equipas. Desde que se alargou a 16 que Portugal não falha. Ora, desde 1996 em Inglaterra. O Mundial-98 foi uma excepção, porque aconteceram coisas raras que nem vale a pena lembrar ainda que muitos já se tenham esquecido.
Não vejo nada de extraordinário nisto.
Tudo o resto é como dizes.
Só esclareço que não acho nada, mas mesmo nada, que a Luz tenha um relvado de jeito. Se olharmos de perto como nos mostraram em Zenica, aquilo tem peladas como outro qualquer batatal.
Mas até nisso há bacoquice nacional-parola que a própria FPF - com um relvado miserável para as finais da Taça que obriga a jogar no Jamor - incentivou.
Na fase final volta tudo à realidade.
Zé Luis,
De momento, com o Euro a 16, temos estado sempre lá como dizes porque coincidiu com a chamada "Geração de Ouro" que garantiu a Portugal esse ranking que evita cair habitualmente em grupos com tubarões. Basta olhar o que selecções históricas como a Bélgica, Escócia, Irlanda (só agora), Turquia e até mesmo a Sérvia encontram pelo caminho para ver que a labor de Scolari, Queiroz e Bento fica mais fácil quando não há uma Alemanha, Espanha, Holanda pelo caminho.
À medida que Portugal baixe no ranking o mais provável é que essa situação se altere mas aí o colchão das 24 selecções garantira sempre o apuramento dos 2 primeiros e os melhores terceiros, ou seja, só uma hecatombe pode impedir uma selecção como a portuguesa de ficar na metade da Europa que vê a outra metade desfrutar.
Quanto à Luz, não tem a qualidade do Dragão (e olhando para os espectadores oficiais a história do "ser maior" perde todo o sentido como seria de prever) mas pelo menos é melhor que Alvalade. Curiosamente a Bósnia era uma selecção de toque curto até Susic decidir meter a cabeça debaixo da terra e optar pelo anti-jogo pelo que o tapete da Luz lhes vinha bastante melhor do que o que montaram em Zenica. O problema de selecções como a Bósnia (e Portugal já foi assim) é a forma como mudam a sua forma de jogar diante de rivais de maior prestigio acabando por abdicar da sua própria filosofia de jogo. Se a Bósnia tivesse procurado mais ter a bola do que deixado Portugal tomar a iniciativa, talvez a coisa tivesse sido diferente.
Apesar da péssima arbitragem, quando os bósnios fizeram o 2-1 e depois o 3-2, muitos devem ter afiado as facas que depois lá tiveram de guardar, a contra-gosto. Para mim as coisas continuam a mesma!
um abraço
De Jaime Pereira a 16 de Novembro de 2011 às 18:58
Completamente de acordo- Tirou-me as palavras da boca (?)...
Jaime,
Obrigado ;-)
um abraço
De Henrique a 17 de Novembro de 2011 às 21:10
Boa Noite,
Sinceramente, acho este texto demasiado duro, em relação a certos aspectos. De qualquer forma, estes são os pontos que gostaria de referir:
1. Portugal não é, de longe, um titã europeu e não joga metade do que a Alemanha joga neste momento. Não tem jogadores tão bons e, ainda para mais, tem dois dos melhores jogadores da defesa infantilmente afastados (defendo reconciliação com o Carvalho; a questão do Bosingwa é diferente). Jogamos com um lateral direito absolutamente horrível, na minha opinião: mau a atacar (falha passes atrás de passes) e pior a defender. No entanto, não estamos tão mal como dizes. Para já porque temos um conjunto de jogadores que são de topo (Nani, CR, Meireles, Coentrão e Pepe, este último merece muito mais atenção pois esta um jogador absolutamente fenomenal). E depois, porque fazendo uma comparação com aquilo que a Inglaterra e França (e talvez até com a Espanha, que embora esteja a passar um momento fraco, me parece pior principalmente a nível psicológico), chegas à conclusão que nós definitivamente não estamos assim tão longe. Nem 8, nem 80.
2. Depois, acho que não devias menosprezar a importância que tem a parte psicológica nos jogadores. Ainda para mais num torneio curto como o Europeu, não é raro ver-se jogos em que o que é decisivo é a força mental das equipas e não tanto as questões tácticas. Daí que não acho que seja benéfico olhar para um jogo de futebol e pensar que quem está melhor tacticamente, ganha. Isso é absolutamente errado e o Portugal de Scolari provou com brilhantismo que não é preciso ser a Alemanha de Low para ganhar jogos a grandes selecções. O Portugal de Queiroz era uma equipa melhor tacticamente, mas psicologicamente muito abaixo do Portugal de Scolari, e isso notou-se no Mundial. Uma equipa que jogou com medo em 3 dos 4 jogos que disputou, sem alegria. Organizados, mas sem brilho, sem inspiração. E com um treinador com um défice enorme na leitura de jogo e com substituições autenticamente suicidas (tirar Hugo Almeida no jogo da Espanha, etc.). Para além disso, o grupo de jogadores não estava unido, não estava convencido com a fraca capacidade de comunicação do Queiroz e não houve chama no Mundial. Por isso mesmo, acho que a táctica não ganha jogos: só o faz em conjunto com a componente mental (entre outras coisas). Se um seleccionador fraco tacticamente for um excelente psicólogo e motivador, não será, na minha opinião, mau. E Scolari provou-o com Portugal e Brasil.
3. Prefiro que Portugal apanhe o tal grupo da morte que referiste, por algumas razões. Porque potenciaria a união do grupo, a motivação e a humildade, e isso é fundamental para uma equipa que, como dizes, é tão fraca tacticamente. Se apanhássemos esse sorteio pela frente não tenho vergonha em dizer que Portugal exibir-se-ia num nível bem mais elevado; isto porque temos tendência para nos acharmos grandes e um grupo destes far-nos-ia descer à terra e arregaçar as mangas. Depois porque mesmo que Portugal fosse logo eliminado, já via três jogos contra adversários de imenso nível. Por isso, para mim apanhávamos Espanha, Holanda e França no grupo. Não é por acaso que em 2000, fizemos uma campanha bestial, calhando exactamente no grupo da morte. Isso potenciou a união, a motivação. Factores que pareces não achar tão importantes assim.
Saudações e peço desculpa por algum erro.
Henrique,
Obrigado pela visita e pelo comentário. É provável que tenhas toda a razão na excessiva dureza dos meus comentários, como disse em cima a nacionalidade pode puxar por uma exigência maior com a selecção portuguesa em relação a outros casos, mas os problemas estruturais são evidentes e não é este Europeu que o vai alterar. Quanto ao que comentas:
1 - A França, mais do que a Inglaterra, está ao nivel de Portugal como referi acima mas tem condições para dar a volta por cima porque não tem o mesmo problema estrutural que nós temos. Efectivamente Portugal tem jogadores de top mas não tem colectivo. Numa prova pequena em tempo uma individualidade pode resolver um jogo ou outro mas se não existe um colectivo forte - como demonstrou a Grécia - a possibilidade de triunfar é extremamente reduzida. O grande problema luso não é não ter jogadores como os que temos, é que temos poucos e que funcionam quando querem.
2 - A componente mental é fundamental e não me parece que este seleccionador, o mesmo que embirra com jogadores e depois de ganhar se lembra deles em tom despreciativo, seja o mais indicado para criar esse espirito de grupo. Não vejo em Paulo Bento um lider capaz de motivar as tropas, todo o contrário, por muita imagem de "sou como vocês" que queira transmitir. Quanto ao ego dos jogadores, ficou claro na terça que sim, quando está lá é motivação suficiente. Mas em Junho, com as pernas cansadas e as alegrias e desilusões de algumas épocas individuais definidas, quero ver onde estará esse punch mental. Portugal nunca fez disso a sua real fortaleza e pela caracteristica mental dos grandes jogadores, não vejo honestamente que sejam jogadores como os que tinha Scolari, muito mais fortes nesse sentido.
3 - Também tens razão quanto à questão dos grupos, mas o Euro 2000 não me vale porque, a meu entender, aquela foi a melhor selecção de sempre da história do futebol português e teria ganho a qualquer rival. Mais, foi um falso grupo da morte como se viu, mais baseado nos nomes do que no valor real das selecções. Hoje está claro que um grupo com a França, Inglaterra e Polónia não é "um grupo de morte" porque nem ingleses nem franceses estão no melhor momento. Mas com espanhóis e alemães, isso é outra conversa. Não creio, por muita motivação, que Portugal tenha futebol para essas selecções.
O que quero evidenciar é, precisamente isso, o mais normal é que Portugal não passe da fase de grupos. E isso não é nenhum drama porque as equipas têm de viver e conhecer as suas limitações. Depois há surpresas. Em 92 a selecção dinamarquesa não era tão boa como a dos 80, mas fez das fraquezas forças e ganhou. O mesmo passou com a Grécia. Portugal só tinha a ganhar se fosse por aí.
um abraço e volta sempre
Tenho orgulho ser Português. Tantos problemas neste país, mas há esperança! Força Portugal!!
Apostas,
O orgulho de se ser português não tem nada a ver com os problemas que possam existir no futebol (e na selecção) portuguesa.
Pode-se ser e estar igual de orgulho e ser critico quando há que o ser.
um abraço
De jaques a 18 de Novembro de 2011 às 22:48
Gosto normalmente do que escreve, e concordo quase sempre, mas notei neste comentário um claro domínio apriorístico de um pensamento (que postulo de errado) vertido em artigos anteriores: o da queda inevitável do futebol português (uma espécia de futura Bélgica), assente na degradação progressiva das camadas jovens e no desaparecimento da "geração de oiro".
Devo dizer que discordo de quase tudo o que consubstancia tal pensamento:
1 -- Os resultados não se medem pelo brilho das gerações: a geração de ouro (2000 e 2002) fez pior que a geração de prata (2004 e 2006) e talvez a geração de bronze (08-10...) faça melhor que as duas anteriores...
2 -- Não vejo onde Portugal tenha piores jogadores do que em qualquer outra geração; sempre tivemos pontos fracos. Lembro-me que nos anos 90 era difícil encontrar bons centrais (que depois apareceram com fartura), os goleadores são um problema crónico (com o excepção do interregno Pauleta), e desde Rui Costa que não existe um número 10 de categoria internacional (com a excepção do interregno Deco, que em minha opinião nem sequer devia ter existido, porque ele nunca quis jogar por Portugal e agora temos de ouvir que foi "pressionado" e que fingiu uma lesão para não jogar contra o Brasil na África do Sul).
3 -- Nesta selecção há bons centrais (mesmo sem Carvalho), até já há lateral esquerdo (outro problema crónico, com o interregno Nuno Valente), não há médio criativo nem goleador, e no meio campo têm de coexistir os números 8. Olha que grande novidade!
4 -- Em contrapartida temos dois dos melhores desequilibradores do mundo. O futebol sempre foi pasto fértil de génios que desequilibram numa penada. Não é preciso que os tacticistas se aborreçam com isso...
5 -- Portugal tem mantido o seu raking internacional e ainda no último Mundial de sub-20 deu a conhecer alguns belos projectos de jogadores, premiados no final da competição.
6 -- Só para dar um exemplo: a equipa de juniores do Sporting joga que se farta na Liga dos Campeões de sub-19: Tiago Ilory, João Carlos, Yuri Medeiros, Chaby e Betinho têm futebol para dar e vender e meteram 8 golos em dois jogos com o Liverpool.
7 -- Portugal é um país de pequena média dimensão europeia, com graves deficiências estruturais e organizacionais, e nunca ganhou um Europeu nem um Mundial; como é que podia ir para um Europeu e roubar protagonismo a selecções como a Holanda, Espanha e Alemanha? Só se for por termos o melhor do Mundo, mas que culpa temos nós disso?
8 -- Lamento desapontá-lo: deu a notícia da morte do futebol sénior português (leia-se falhanço do primeiro apuramento de uma das 5 selecções europeias que se qualificaram para todos os mundiais e europeus no século XXI) demasiado cedo.
9 -- No Verão do próximo ano o mais provável é que possa dissertar novamente, e de forma abundante, sobre o assunto...
Um abraço
Jaques,
A queda não é inevitável, mas analisando todos os ingredientes parece bastante provável e, aliás, a maioria dos argumentos que enuncia são os mesmos que se ouviu em casos como o da Bélgica, Escócia ou algumas potências do leste europeu. A Bélgica teve uns anos 80 em tudo iguais aos portugueses (até com vitórias europeias de clubes) e uns anos 90 menos traumáticos. Mas desde 2000 que vive num estado de descalabro que se começou a desenhar anos atrás.
1 - Como disse em cima a melhor Dinamarca não ganhou o Europeu e isso significa que uma seleção inferior a outra pretérita não possa fazer melhor. O que tem é de ser assumido pelos adeptos que será sempre a excepção e não a regra. A Geração de Ouro começou a brilhar no fim, no periodo da maturidade, mas abriu portas (incluindo os rankings e a atenção dos grandes clubes) que beneficiou as posteriores de uma forma que a dos 70 e 80 não fez.
2 - A qualidade do futebol português actual é, para mim, igual há dos anos 70 e tudo porque espelha esse abandono claro da formação. Os planteis das equipas hoje são 50 a 60% portugueses e isso baixa o nivel médio forçosamente. Sempre houve problemas e sempre os haverá porque um país de 10 milhões não pode ombrear com as superpotências (salvo a Holanda, caso especial, todas com mais de 45 milhões). Mas creio que o nivel médio é mais baixo e, sobretudo, há mais posições problemáticas. O goleador, o guarda-redes, o lateral-direito, os centrais, o médio defensivo, o médio criativo...em Portugal abundam extremos e médios interiores, pouco mais.
3 - Bons centrais? Tirando o notável Pepe a selecção conta com centrais muito abaixo do nivel médio exigido para uma equipa top. Bruno Alves, Rolando, Sereno, Ricardo Costa e Carriço não são, propriamente, santos da minha devoção.
4 - Chalana e Futre também eram genios espantosos e no entanto a selecção portuguesa com eles chegou a roçar a mais pura mediania. um individuo não faz uma seleção, especialmente em competições curtas onde não há espaço para falhar. Nani e Cristiano são geniais, mas facilmente anulados como se viu em Copenhague pela táctica mais apurada.
5 - A selecção de sub 20 teve um mérito tremendo, indiscutivel, mas jogando de uma forma que não está ao nivel do habitual futebol da primeira equipa. Se calhar esse é o futuro d futebol português (e não há nada mau nisso) mas exceptuando Oliveira, Mika, Reis e Danilo, não fiquei com ninguém debaixo de olho.
6 - O problema desses miudos (como os do FCP, campeões de juniores, do Benfica, de clubes médios como Braga e Guimarães) é que depois não jogam porque os clubes apostam em mercados americanos para fazer negócio. Nunca disse que eles não existem, digo é que não têm espaço e tempo.
7 - Totalmente de acordo, penso exactamente da mesma forma, mas tanto imprensa como adeptos, jogadores e técnicos têm vendido, erroneamente, a ideia oposta na última década. Que culpa tenho eu? ;-)
8 - Não dei nenhuma noticia, exprimi uma sensação e o sofrimento de um play-off, em teoria, não corresponde com tamanho ranking, lugar como cabeça de série e grupo acessível. Se calhar o problema está mais aí do que na natureza do merecido apuramento.
9 - O problema é que no Verão, se Portugal ganhar o Euro, pensarei da mesma forma. O meu problema está com a estrutura do futebol em geral e não é um mundial de sub 20 ou um Euro que mudam a minha perspectiva. Porque pode-se hoje ganhar um Europeu e depois desaparecer do mapa por 20 anos. E isso é o que me mais me custa.
um abraço
De jaques a 19 de Novembro de 2011 às 20:54
Concordo com a maioria dos pontos, mas em minha opinião Bruno Alves é um central de nível internacional e Rolando (apesar do descalabro das últimas exibições) pode vir a sê-lo. João Pereira cumpre como lateral-direito e Miguel Veloso (ou Meireles) é um médio defensivo/pivot mais que competente.
Patrício pode ser azelha com os pés mas tem escola de guarda-redes e pode tornar-se um guarda-redes de nível internacional -- claramente acima de Ricardo e Eduardo, por exemplo.
Lacunas a sério são apenas duas (número 10 e 9), e grave mesmo é só a do número 9, porque a figura do médio criativo foi sendo substituída pela do "pivot" ao estilo de Xavi.
Mas isto é apenas uma perspectiva, que o Europeu pode ou não confirmar.
Um abraço
Jaques,
O Bruno Alves é um central duro mas com muitas falhas posicionais. Quanto a Rolando, simplesmente não concordo, espero pela evolução de Carriço. João Pereira cumpre com rivais dóceis e Miguel Veloso há muito que devia ser o 6 - mas aquela cabeça é um problema - e Patricio espelho do fim de uma era em que em Portugal havia bons guarda-redes de sobra.
Um abraço
De filomeno a 19 de Novembro de 2011 às 23:41
La UEFA y la FIFA debían tomar cartas en el asunto para que nunca más se le proyectaran deslumbrantes rayos- láser a los ojos del crack luso Cristiano Ronaldo......
Filomeno,
Uma moda idiota que ainda ninguém se molestou em querer acabar a sério!
um abraço
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