São a mais jovem selecção do Mundo e nesse arrojo típico dos recém-chegados desafiaram os prognósticos, emudeceram os críticos e desafiaram a história. Tiveram a Inglaterra a seus pés, destroçaram o projecto de futuro da Suiça e agora estão preparados para defrontar a selecção mais bipolar da história recente do futebol europeu. Quais são os limites dos rookies do ano?
Passou pelo Benfica sem pena nem glória e em Vallecas muitos continuam a desconfiar do seu jeito molengão.
Mas em Podgorica, Andrija Delibasic é o equivalente mais próximo que podemos encontrar a um mito vivo.
O golo do dianteiro do Rayo Vallecano não garantiu só o empate frente à toda poderosa Inglaterra. À distância de um anúncio radiofónico, confirmou o conto de fadas que há um ano se estava a escrever em letras maiúsculas no último filho do Mundo, na derradeira bandeira independente a desfraldar pelos Balcâs, no quinto país da ex-Jugoslávia a entrar em disputa por um lugar ao sol.
Durante anos o Montenegro viveu à sombra do seu vizinho maior, a Sérvia, e foi nessa condição que os montenegrinos marcaram presença - apesar de ninguém ter notado - no Europeu de 2000. Mas jogar com bandeira e luz própria é outra sensação. Só em 2007 a FIFA e a UEFA aceitaram a inscrição dos montenegrinos como selecção oficial e permitiram a participação na fase de qualificação para o Mundial da África do Sul. Montar uma equipa de um país novo era um desafio ao alcance de poucos e só a apaixonada labor de Zoran Filipovic, filho da terra, permitiu montar um plantel competitivo mas cheio de baixas. A maioria dos jogadores montenegrinos preferiu continuar a actuar com a Sérvia e entre os veteranos Basa, Pavicevic, Novakovic e o próprio Delibasic e as novas promessas locais Vukcevic, Vucivic , Savic e Jovetic, formou-se um onze sui generis que daria muito de que falar. Há dois anos pagaram o preço da inexperiência apesar de surpreendentes resultados a abrir. Em 2010 arrancaram para uma campanha a roçar o inacreditável. E estão a dois jogos do paraíso.
Desde o desmembramento do Jugoslávia que três nações do país inventado por Tito marcaram presença numa grande competição internacional. Das três só a Croácia está na disputa deste play-off mas aos homens do Adriático acompanham-nos os novos filhos dos Balcâs, os guerreiros da Bósnia e os falcões do Montenegro.
Na altura do sorteio os montenegrinos eram a equipa pior quotada do grupo G, por detrás de bulgaros, suiços, galeses e ingleses. Ninguém imaginava que no último dia os recém-chegados tenham ficado a apenas 4 pontos do apuramento directo para o torneio disputado entre a Polónia e a Ucrânia. O arranque sublime (três vitórias por 1-0 com golos de Vucinic contra Gales, Bulgária e Suiça) foi seguido de um épico duelo em Wembley com a Inglaterra de Fabio Capello. Num jogo onde os papeis pareciam trocados, os montenegrinos encostaram os ingleses às cordas e o próprio seleccionador italiano confessou que o empate era um mal menor.
Depois de uma série inesquecível começaram a chegar os primeiros revezes. A selecção já tinha perdido a fluidez de jogo de Jovetic - lesionado durante um ano - e ninguém se surpreendeu com o empate contra os búlgaros e a primeira derrota em Gales. Os ingleses pareciam escapar-se finalmente e os suíços de Shaquiri e companhia aproximavam-se perigosamente antes de um duplo confronto determinante contra ingleses e suíços para decidir as posições finais do grupo. O clima de histeria depois da derrota em Gales custou a cabeça ao mentor da fábula, o seleccionador croata Zlatko Kranjcar e para o seu lugar a federação - que parecia ter perdido a crença num apuramento que chegou a estar perto de ser directo - nomeou o técnico Branko Brnovic, secundado pelo ex-internacional jugoslavo Savo Milosevic. A nomeação, juntamente com o regresso de Jovetic à equipa nacional, deu o plus de motivação que faltava. Podgorica encheu para receber a Old Albion e apesar dos dois golos inaugurais dos ingleses na primeira parte, os locais nunca perderam a cabeça. As noticias que chegavam de Gales (onde a Suiça perdia também por 2-0) eram motivadoras suficientes e no segundo tempo os ingleses sofreram uma pressão asfixiante que culminou no tento de Zverotic e depois no salto milagroso de Delibasic. O salto em suspensão de todo um povo.
O empate garantiu a qualificação matemática para o play-off, algo que nem a derrota por 2-0 com a própria Suiça foi capaz de alterar. O destino traçou um duelo com a República Checa, selecção facilmente reconhecível pelo transtorno bipolar na grande prova europeia. Uma final e uma semi-final caminham lado a lado com duas campanhas em que a eliminação na fase de grupos foi o melhor que conseguiram. Os checos contam com uma das melhores gerações jovens do continente mas terão de medir-se contra uma pequena nação que olhará para os 180 minutos como um encontro com a história. O jogo decisivo em Podgorica, mais do que um duelo entre duas selecções, promete ser o grito de um povo que só quer que o Mundo sinta que eles também existem.