18 anos é muito tempo para qualquer um. Para os argentinos, uma agónica eternidade. Desde a vitória na edição de 1993 no Equador que o futebol argentino não voltou à rua para festejar um titulo. Leo Messi tem nos seus ombros um país ferido no orgulho e à procura de um rumo. O objectivo real da Albiceleste é o Mundial de 2014 mas para La Pulga assinar finalmente a reconciliação com o seu povo, o desafio começa agora!
O pequeno Lionel Messi tinha cinco anos e já devorava todas as bolas que lhe caiam nos pés.
Mas nem ele seria capaz de imaginar a importância daquele mês de Julho, o mês em que a Argentina, pela última vez venceu um trofeu internacional Uma Copa America não valia tanto como o Mundial perdido em 1990 e ambicionado para 1994, mas era uma alegria especial para um povo a viver uma autêntica era de encruzilhadas sociais. Aquela equipa orientada por Alfio Basile chegou à final depois de duas eliminatórias sofridas que só os penaltys (e as imensas mãos de Goycochea) decidiram. Na final, frente ao México, convidado pela primeira vez, o jovem Gabriel Omar Batistuta confirmou o seu estatuto de estrela. E levou a equipa às costas uma vez. Os argentinos esperam agora o mesmo daquele pequeno malabarista que já encantava os vizinhos de Rosário, onde dava os primeiros passos.
Messi quer fazer desta Copa América a sua festa pessoal. Como um pequeno a cumprir o seu aniversário, Leo procura reunir amigos e admiradores para a sua consagração oficial com a camisola da Argentina. Nunca, como antes, teve uma oportunidade de ouro para confirmar o seu estatuto de número um mundial como agora, junto dos seus. É certo que o torneio mais antigo de selecções do Mundo não apresenta a mesma dificuldade de um Mundial ou um Europeu, mas não deixa de ser um evento único e inesquecível, capaz de moldar a carreira de um jogador. O jovem argentino fez parte da equipa destroçada pelo Brasil de Kaká em 2007. Por essa altura ele ainda era um dos muitos aspirantes ao trono ocupado pelo brasileiro e que seria herdado por Cristiano Ronaldo. Hoje ocupa-o com a mesma naturalidade com que finta os rivais e tem a oportunidade de ouro de o demonstrar diante dos seus. Com 14 anos Messi foi convidado a representar a selecção espanhola. Recusou, despeitado, porque se considerava argentino da cabeça aos pés. Mas os últimos dez anos foram marcados por uma relação muito dificil com o seu povo. A ausência de momentos estelar nos Mundiais de 2006 e 2010 e na Copa América de 2007, bem como os problemas na fase de apuramento para a África do Sul contribuiram para esse afastamento. A desconfiança de um jogador que, ao contrário de Maradona, cresceu futebolisticamente longe das ruas e dos estádios repletos de hinchas frenéticos também não ajudou. E, para piorar, o jogo do Barcelona, com o número 10 como vector principal, contribuiu ainda mais para que exista uma sensação real entre os adeptos argentinos que Messi não se sente cómodo com a camisola da albiceleste. Esse é o peso do torneio. A Argentina joga em casa e é favorita mas os adeptos estão mais interessados em saber se, finalmente, Messi vai ser Messi com a sua selecção. Não lhe perdoaram outra vez.
O torneio disputa-se no próximo mês e há vida para lá da Argentina, ainda em comoção pela dramática despromoção do River Plate.
Os ches são favoritos não só por jogarem em casa. Dispõem da melhor linha avançada do torneio (Higuain, Messi, Tevez, Di Maria, Aguero) e nos últimos meses bateram Brasil e Espanha em amigáveis. A confiança está em alta mas Sergio Batista, o herdeiro de Maradona no banco de sonho de qualquer adepto argentino, já deixou claro que o objectivo continua a ser o Mundial de 2014, o torneio onde a Pulga quer emular, definitivamente, Diego Armando Maradona.
Os argentinos terão um caminho plácido até à final e não se esperam grandes surpresa. Um grupo acessível com Costa Rica, Bolivia e Colombia. A selecção colombiana é, para muitos, o outsider a ter em conta. Falcao, Rodallega, Guarin, Zapata, Ospina e companhia formam um conjunto compacto e que herda na perfeição o ideário futebolistico da escola de Maturana, o pai da selecção que encantou o futebol mundial no principio da década de 90. No outro lado, bem afastado dos favoritos, o Brasil rejuvenescido de Neymar e companhia. É talvez a menos entusiasmante das selecções brasileiras mas os campeões em titulo podem sentir-se cómodos com esse papel de outsiders. A estrela do Santos quer provar ao mundo que os seus malabarismos habituais no Brasileirão (e em menor medida na Copa de Libertadores que acabou de ganhar) se transformam em momentos de glória com a mitica "canarinha" ao peito. Sem Kaká, sem Fabiano, sem Ronaldo ou Ronaldinho, o Brasil vive orfão de estrelas e deposita toda a confiança nos meninos que Mano Menezes quer preparar para brilharem daqui a três anos em casa. O escrete jogará no grupo mais equilibrado - Venezuela, Equador e Paraguai - e, forçosamente, num ambiente hostil. Algo similar sucederá com o outro favorito - talvez mais do que o próprio detentor do titulo - o Uruguai. Com Forlán, Suarez e Cavani inspirados, os charruas são um rival de peso, como ficou demonstrado no último Mundial. O duelo com México (na sua versão mais débil), Peru e Chile parece, à partida, um mero trâmite. O confronto com o Brasil nas meias-finais é um dos jogos mais esperados do certame que quer ver, definitivamente, se o Uruguai realmente ressuscitou de uma letargia histórica de largas décadas ou se a campanha do último Mundial foi apenas um cometa que rompeu os céus e tão depressa apareceu como desapareceu.
As últimas edições da Copa América têm sido pouco entusiasmantes. Os problemas de calendário, o cansaço dos jogadores e a perda de competitividade de algumas selecções da América Latina têm transformado o torneio num passeio habitual para as favoritas. Ninguém espera algo muito diferente da edição de 2011. Enquanto o modelo continuar a funcionar como um clube exclusivo da CONEMBOL, a federação continental mais pequena do universo FIFA, o grande público continuará a prestar pouca atenção ao duelo dos grandes nomes do futebol americano. Um problema de organização que não esconde o facto de haver poucos momentos de tanta tensão, magia e sofrimento como os duelos dos titãs das Américas, os convidados à festa do pequeno Lionel, o aniversariante que quer apagar as velas com a taça que Maradona nunca levantou debaixo do braço