Há poucos fins-de-semana com este ritmo. Três países, três ligas, três clássicos históricos. Três percepções bem distintas de como encarar a bola. O espaço. O jogo. A verticalidade espectacular confronto o futebol horizontal e pausado. Pelo meio o eterno confronto entre o individual e colectivo. O futebol redescobre-se a cada fim-de-semana e um clássico é sempre mais do que um simples desafio.
Sábado, 28 de Novembro. Noite chuvosa em Lisboa. Ambiente quente e intranquilo. Nas bancadas os crentes e os desanimados. Dois olhares secos e expectantes por um jogo que muitos desajariam que viesse noutro momento. Quase todos até. A baixa de forma da "onda vermelha" era um fantasma que fazia pensar duas vezes a mais do que um adepto. A metralhadora encarnada começava a perder balas e os últimos desafios davam a nota do que podia ser o Benfica de Jesus quando só ficasse a táctica e desaparecessem os jogadores. No espectro oposto, uma equipa sem nada a perder. Já dizia Sun Tzu, na sua arte da guerra que bem podia ter sido a arte do futebol, que quando se encurrala a um inimigo é sempre aconselhável deixar-lhe um pequeno espaço para fugir. Senão corre-se o risco de que eles lutem até à morte. Porque não há salvação possível. E assim foi. O Benfica tentou acabar com as esperanças do Sporting em reconquistar um ceptro há muito perdido. E devolver aos leões o velho fantasma natalicio. A isso a equipa verde e branca respondeu com atitude e sacrificio. Muito. Correu-se mais do que se jogou. Procurou-se sempre o homem e nunca o espaço. Um espaço atolado de pernas. Com o seu 4-2-3-1 Carvalhal deu uma lição ao homem dos amendoins. Adrien e Moutinho ataram a máquina ofensiva do meio campo encarnado. Aimar e Di Maria foram inexistentes e Miguel Veloso incomodou mais Ramires do que ao contrário. Os erros defensivos iam dando a falsa ilusão de golo. Mas a bola não quis comungar nessa noite. A diferença pontual mantém-se mas Jesus voltou a pecar. Que o Sporting já parecia arredado da luta pelo título, isso até os próprios sportinguistas sabiam. Que o técnico que acreditava ter em mãos a melhor máquina ofensiva do futebol europeu se contente com um facto, prova de que algo começa a tremer do outro lado da 2 Circular.
Domingo, 29 de Novembro. Diluvio inevitável em Londres. Se fosse o velho Highbury talvez a chuva se notasse mais. Com aquele habitual reflexo na bancada do relógio. Mas o Emirates é mais um centro comercial do que um belo estádio e o ambiente gunner não é o mesmo. Um estádio de milhões para coroar uma equipa de milhões face a um grupo de aguerridos guerreiros. 11 pontos separam (aqui com um jogo a menos em disputa pelo Arsenal) os rivais. Um derby que pode nem ser o mais histórico da capital inglesa. Mas é o mais marcante da era actual. Um derby vertical e corajoso, totalmente distinto do clássico latino. As equipas respeitam-se mas não se temem. É mais um encontro. Mais uma oportunidade de brilhar. Jogo ofensivo e rápido. A bola circula veloz sobre o relvado e as oportunidades sucedem-se. O marcador final é implacável. E injusto. Não há equipa de maior mérito no futebol inglês que os comandados por Arsene Wenger. Sem dinheiro para investir, o técnico continua a apostar na sólida formação. Ontem faltava-lhe quase meia equipa. E não se notou. Ao contrário, o Chelsea pode dar-se a esse luxo. Deco, Ballack, Kalou e Malouda. Todos no banco. Tranquilos e abrigados. Ao lado de Carlo Ancelloti. Um homem que trouxe coerência e inteligência ao jogo de uma equipa leal e veloz. Os dois tanques africanos a meio - Essien e Obi Mikel - destabilizam o jogo. Criam ao destruir e lançam as setas venenosas. Drogba, o chamã da equipa, encarna a ligeireza do demónio e com o olhar desvia a bola para dentro das redes. O Chelsea é o rosto mais implacável do futebol. Joga hoje como nenhuma outra equipa. E prova que é capaz de destroçar, sem piedade, a um onze repleto de rebeldes cheios da ilusão da juventude. Mas que muitas vezes é insuficiente.
Domingo, 29 de Novembro. Noite chuvosa também em Barcelona. Um sinal de união entre três embates. E pouco mais. Se em Londres a bola corre veloz ao chapinhar na água que cobre o tapete verde, em Barcelona ela tranquiliza-se. Sabe que tem tempo de dar a volta ao terreno de jogo. Mais do que os milhões em campo, o duelo entre os dois grandes do futebol espanhol disputou-se no banco. As individualidades desapareceram sob o manto do colectivo. E quando surgiram, pecaram por falta de audácia. Cristiano Ronaldo prometeu marcar "10, 20 golos". Falhou um, clamoroso. Ou terá sido Valdés a defender? O futebol é sempre injusto com o nùmero 1 e assim rezam as crónicas. Do outro lado o futuro Ballon D´Or, já com a cabeça na viagem que fará a Paris, esqueceu-se de que a baliza é grande e que Casillas não a cobre por completo. Messi remata à figura e aqui já se diz que é o guardião espanhol quem trava o remate. Não terá sido o oposto? No meio das dúvidas das estrelas a inteligência de Pique e a verticalidade de Dani Alves resolveram o clássico de los clássicos. Zlatan Ibrahimovic teve apenas de cumprir a sua missão. No banco, onde se disputava a verdadeira refrega, Pep Guardiola sorria. Não se tinha enganado ao substituir o apagado Henry pelo audaz sueco. Na primeira parte Manuel Pellegrini até tinha ganho o duelo ao campeão, com uma equipa que apostava no lançamento rápido para o trio da frente - com Kaká a exibir-se, pela primeira vez, ao seu real nível - ao contrário do jogo de toque que tanto encanta o Camp Nou. Mas a segunda parte foi bem diferente e o Barcelona até com 10 soube controlar um Real Madrid a quem lhe faltou sempre a inteligência de jogo. Mas nunca o coração. Acreditou até ao fim. Só que, no futebol, nem sempre acreditar é suficiente. E o retrovisor de Casillas ficou ligeiramente nublado. Pode ter sido da chuva.
Há histórias onde vale a pena começar pelo fim. Re Cecconi morreu num 18 de Janeiro da forma mais louca que se possa imaginar. Era uma das grandes estrelas do Calcio, o rei da AS Lazio. Mas também era conhecido pelas suas loucuras. Uma delas custou-lhe a vida. Uma simulação de um assalto, um tiro preciso. Aos 28 anos morria o maestro do futebol laziale, o "Angelo Biondo".
Médio de uma classe apuradíssima, Re Cecconi era o idolo dos adeptos da AS Lazio. Aos 28 anos vivia como um rei em Roma. Tinha ganho a pulso o seu titulo. Uma carreira repleta de esforço e sacrificios. Mas também de muita loucura. Dentro e fora do tapete verde.
Um mago louco que nascera em 1948, em pleno pós-guerra na pequena localidade milanesa de Nerviano. Loiro como os amaldiçados arianos, o jovem Luciano Re Cecconi cresceu nos suburbios da capital lombarda com o sonho de emular os seus grandes idolos, o trio sueco do AC Milan. Em 1968, cumpridos os 20 anos, estreou-se finalmente como futebolista profissional no modestíssimo Pro Patria Calcio. Chamou rapidamente à atenção do Foggia que encontrou nele o lider nato que a equipa, então na serie B, precisava. Num ano fez-se dono e senhor do meio campo da equipa e levou-os de volta ao convívio dos grandes. Dois anos depois trocou Foggia pela capital. A AS Lazio precisava desesperadamente de um jogador de classe e apontou baterias ao já celebre "Angelo Biondo". Foi o inicio de uma louca história de amor.
Na capital romana o jovem médio encontrou uma equipa ambiciosa mas sem um lider. Assumiu o posto para delicia dos adeptos laziale e do seu técnico, o sempre polémico Tommaso Maestrelli, responsável pela sua chegada a Foggia. O regista azul tornou-se insubstituivel. No seu primeiro ano apontou um golo e conseguiu dez assistência em trinta jogos. A Lazio, até então uma equipa do meio da tabela, acabou a prova em terceiro, a apenas dois pontos da poderosa Juventus. Ao lado do médio estavam o veterano Giuseppe Wilson e ainda a dupla Giorgio Chinaglia e Mario Frustalupi.
Depois do sucesso inicial em Roma, Re Cecconi estreou-se pela Squadra Azzura e entrou no lote de candidatos a viajar ao Mundial da Alemanha. O ano seguinte seria o coroar de uma carreira explosiva. Lesionou-se cedo mas a sua recuperação foi épica. Quando regressou a equipa andava pelo quinto posto. Com uma série de exibições inesqueciveis, a AS Lazio foi trepando a classificação. No final lograva o primeiro Scudetto da sua história levando os adeptos à loucura. O "Angelo Biondo" tornou-se no espelho da vitória e pela cidade cartazes e pintadas com o seu nome espelhavam bem a sua tremenda popularidade. De tal forma que a sua inclusão no onze da Azzura no Mundial da Alemanha tornou-se rapidamente em debate nacional. A eliminação precoce da Itália - na fase de grupos - é associada à presença constante no banco do regista. A sua figura tornava-se divina.
Ao mesmo tempo o jovem médio começava a inundar os relvados com as suas loucuras. Problemas com os árbitros, colegas e rivais tornaram-no num jogador assumidamente conflituoso. O seu caracter de gigolo tornava-o ainda mais popular para os adeptos. Era o verdadeiro playboy do Calcio italiano dos anos 70. No ano seguinte ao titulo - e impedida de participar na Taça dos Campeões por suspensão da UEFA - a Lazio enfrenta graves problemas. O técnico é forçado, por questões de saúde, a abandonar a equipa e o conflictivo carácter de Re Cecconi não apazigua os problemas do balneário. A equipa está perto da despromoção mas uma recta final impecável do médio e o regresso temporal de Maestrelli - que morrerá pouco depois, vitima de um cancro - salvam o conjunto da despromoção. O ano seguinte levantava muita expectativa mas o médio, então com 28 anos, lesiona-se gravemente ao segundo jogo. E não voltará a jogar. Na noite de 18 de Janeiro, depois de jantar num conhecido restaurante romano, Re Cecconi convence o seu amigo e colega de equipa, Pietro Ghedin, a simular um assalto à joalharia do famoso Bruno Tabochini. Os dois saem do restaurante com as gabardinas a cobrir parte do rosto e entram no establecimento. Cecconi grita "Mãos ao alto que isto é um assalto" e o joalheiro, que estava de costas e que posteriomente confessou não ter reconhecido o craque, pega numa pistola que tinha sempre consigo e dispara à queima-roupa. Re Cecconi morre nessa mesma noite. A última das suas famosas brincadeiras que assolavam a noite romana tinha-lhe sido fatal.
Sem Re Cecconi a AS Lazio entra em processo de auto-destruição. A equipa envolve-se numa polémica de apostas ilegais e é despromovida à Serie B. É preciso chegar o final da década de 90 para voltar ao mais alto nível e só em 2000 logra o seu segundo Scudetto. Até então, no topo sul do Olimpico de Roma, sempre havia uma tarja que lembrava aos visitantes que naquele relvado imenso tinha espalhado o perfume do seu futebol um louco anjo loiro chamado Re Cecconi.
A poucos dias da oficialização do novo detentor do Ballon D´Or, as casas de apostas parecem não ter dúvidas. O argentino Lionel Messi é o máximo favorito para vencer o mais prestigiado trofeu individual do mundo futebolistico. Fala-se sempre no duelo entre o argentino e Cristiano Ronaldo. Muitos lembram a velocidade de Andrés Iniesta, o faro de golo de Samuel Etoo e Fernando Torres ou a classe de Frank Lampard. Mas antes de que a realidade rompa a ilusão, deixamos aqui as 10 razões porque o mitico trofeu deveria pertencer a outro blaugrana de excelência: Xavi Hernandez Creus...
1 - Xavi Hernandez é um dos jogadores actuais com melhor palmarés desportivo. O médio do Barcelona tem no seu historial 2 Champions League, 4 Ligas Espanholas, 1 Europeu de Selecções, 1 Supertaça Europeia, 1 Mundial de Juniores, 2 Taças do Rei e 2 Supertaças de Espanha.
2 - Aos 29 anos, Xavi está no culminar da sua carreira desportiva. Estreou-se pela mão de Louis van Gaal na equipa principal do Barcelona em 1998 e foi imediatamente visto como o sucessor natural de Pep Guardiola. Com a chegada de Frank Rijkaard passou a jogar mais adiantado no terreno tornando-se no maestro do jogo do Barcelona e da selecção espanhola, com quem ganhou tudo o que havia para ganhar.
3 - Foi eleito o Melhor Medio da última edição da Champions League recebendo igualmente a distinção de melhor jogador da final onde assistiu os dois golos da equipa catalã. Foi igualmente eleito MVP do último Europeu de futebol.
4 - É actualmente o médio criativo mais desiquilibrante do futebol mundial. Pauta o jogo de dois campeões europeus - de clubes e selecções - e é o principal responsável pelo fio de jogo elogiado no Pep Team. O jogo do Barcelona e da selecção de Espanha passa todo pelos seus pés.
5 - A sua ausência no onze de Guardiola significa, quase sempre, problemas para o técnico. Ao contrário das suas estrelas mais cintilantes, sem as quais o Barcelona já provou saber vencer, sem Xavi em campo a máquina azulgrana perde completamente o rumo.
6 - É o espelho do futebolista como artista. Não tem a força fisica nem é tão completo como Cristiano Ronaldo. Não possuiu o sprint e a finta desconcertante de Lionel Messi. Mas reune em si todas as caracteristicas de um criativo de excepção, eximio nas bolas paradas, com um remate letal e uma visão de jogo de mestre de xadrez.
7 - É o simbolo número 1 do Barcelona. Producto de La Masia, encarna todos os ideais do estilo de jogo do clube catalão. Capitão na ausência de Charles Puyol, demonstra uma total fidelidade à causa azulgrana tendo rejeitado por diversas vezes a transferência para o estrangeiro, apesar das ofertas de AC Milan, Inter, Chelsea e Manchester United.
8 - Disputou em 10 anos 475 jogos ao serviço do Barcelona e 82 pela selecção espanhola. No total apontou 55 golos ao largo da sua carreira e hoje é o atleta do Barcelona com mais jogos nas provas europeias e o segundo com mais encontros na liga espanhola. Exceptuando uma tormentosa lesão que o afastou da final da Champions League de 2006, manteve uma impecável folha de lesões e cartões que o levaram a ser eleito, por três vezes, o jogador com mais fair-play da liga espanhola segundo a revista Don Balon. Um exemplo de profissionalismo e fair-play recompensado pela UEFA ao outorgar-lhe o titulo de capitão da sua selecção ideal em 2008 e 2009.
9 - Ao contrário dos seus mais directos rivais, Xavi Hernandez mantém o seu mesmo estilo de jogo e nível exibicional no seu clube - FC Barcelona - e na sua selecção. É a chave do jogo dos comandados de Vicente del Bosque e foi fulcral na caminhada de La Roja para o próximo Mundial.
10 - Num prémio criado para eleger o melhor de um ano, o vencedor devia resultar no jogador mais decisivo durante esse periodo de tempo. Ao contrário de Cristiano Ronaldo - apagado no ínicio do ano e lesionado grande parte do final de 2009 - e Lionel Messi, que vive esta época uma clara baixa de forma do que se pode constatar na época passada, o número 6 do Barcelona manteve o mesmo ritmo de jogo durante todo o ano, tendo sido decisivo nas diferentes provas em que participou ao serviço do Barcelona. Desde o último desafio contra ao Inter às eliminatórias da passada edição da Champions League, sem esquecer a histórica vitória do Barcelona no Santiago Bernabeu por 2-6.
Minuto 76.
O Estádio do Dragão levanta-se e aplaude. Entusiasticamente. Ouve-se num canto uma música que fez história. O jogador, de branco, sai do relvado agradecendo a maré da aplausos. Hoje estava do outro lado. Mas isso não importa. Pelo menos não naquele momento. Tal como quando enchia de magia os relvados nacionais e europeus, de dragão ao peito, ontem Deco voltou a ser ovacionado pelos seus. É o valor da gratidão pelo mais decisivo jogador da década no futebol português.
Não teve uma noite inspirada. Aliás, não está a viver a sua melhor época. Nota-se no rosto e nas pernas que a carreira de Deco caminha de forma tranquila, mas determinada, para o seu ocaso. O "Mágico" é ainda capaz de lances absolutamente geniais. Mas começam a escassear e o reportório é há muito conhecido. Não interessa. O passado já tratou de o colocar no devido lugar. Durante mais de dez anos mostrou que era capaz de ombrear com os melhores. Depois de conquistar tudo neste rectângulo à beira-mar aceitou o desafio do estrangeiro, onde voltou a ganhar tudo o que havia para conquistar. Falta-lhe provavelmente apenas uma Premier League. Pelo andar da carruagem, este ano pode perfeitamente culminar um curriculum perfeito. Duplo campeão europeu, Ballon D´Argent em 2004 - uma das mais injustas derrotas da década - , eleito melhor jogador da Champions League no mesmo ano, vencedor de três ligas portuguesas, duas espanholas entre tantos outros pequenos grandes trofeus. Um CV que é suficiente para o colocar no "Olimpo" desportivo. Ontem, esse mesmo mágico de outras noites chuvosas, voltou a sentir o calor do Dragão. O estádio que fez dele uma estrela internacional, o herdeiro do recinto onde se estreou, no meio de tanta polémica, pela selecção portuguesa. Da qual é o patrão há mais de meia década.
Deco é sem dúvida o mais completo futebolista que actuou na última década em Portugal.
Começou a sua carreira no Corinthians Alagoano e chegou a Portugal envolto em promessas por cumprir por parte do Benfica. Vagueou pelo Alverca, surpreendeu no Salgueiros e acabou respescado pelo FC Porto para suceder ao esloveno Zlatko Zahovic que já ameaçava com deixar as Antas, a bem ou a mal. Sagrou-se campeão no seu primeiro ano e depois viveu a época de "vacas magras" dos azuis e brancos. Durante esse periodo foi criticado pelos adeptos pelo seu estilo perdulário mas foi precisamente com Fernando Santos que o criativo brasileiro ganhou o poder de recuperação de bolas que lhe permitiu tornar-se num médio universal. Com a chegada de José Mourinho o médio estava já em plena maturidade desportiva. Tornou-se no lider natural do FC Porto que em dois anos venceu tudo o que havia para ganhar. Superou o preconceito nacional e liderou a equipa das Quinas à final do Euro 2004, substituindo o já apagado Rui Costa no onze nacional. Para nunca mais perder o posto. O sucesso levou-o a Barcelona, resultado de um pré-acordo existente entre os portistas e blaugranas. Aí juntou-se a Ronaldinho, Etoo e Messi para formar um quarteto de sonho. Duplo vencedor da liga espanhola, em Paris voltou a vencer a Champions League. Tinha perdido em protagonismo mas ganho em eficácia de jogo. Com a saída de Rijkaard e a polémica à volta da vida nocturna da cidade, o brasileiro aproveitou para rumar a Inglaterra depois de rejeitar o convite de Mourinho e assinar pelo Inter. No Chelsea encontrou-se com Scolari, que fez dele titular indiscutivel, passando depois alguns apuros com Guus Hiddink, que acabou por utilizá-lo com menor regularidade. Hoje é decisivo para Carlos Queiroz e útil para Carlo Ancelloti, que o alinhou no duelo de ontem para que o "número 10" pudesse receber a devida homenagem.
Incontornável na história do futebol português, Deco é, ainda hoje, o exemplo de um futebolista de classe. Eximio nos lances de bola parada, com um remate atrevido e letal, é um médio fulcral nas manobras das equipas por onde passou. Estará provavelmente no seu último ano de competição ao mais alto nível. Na África do Sul quererá despedir-se em grande antes de um provável regresso ao futebol brasileiro, que nunca o respeitou por ter chegado tão novo à Europa. Curiosamente assinou o golo da vitória portuguesa diante do escrete canarinho, no seu jogo de estreia por Portugal. O estádio não era o mesmo, estava uns metros acima. Mas a música era precisamente a de ontem. Aquela que ouviu à medida que caminhava para o banco, com toda uma cidade rendida ao seu génio. "É melhor que o Pelé, é o Deco allez, allez"...
O desastre áereo de Munique marcou uma geração do futebol britânico. Entre as chamas do avião que levava a casa os Busby Babes, depois de um apuramento histórico para as meias-finais da Taça dos Campeões, ficaram muitas das grandes promessas por cumprir do futebol inglês. Mas entre o desastre emergiu um herói, um homem que foi mais do que um guarda-redes único. Naquele fatidico dia, Harry Gregg provou ser um autêntico número um...
É curioso que uma longa e bem sucedida carreira desportiva fique para segundo plano quando se pensa em Harry Gregg. Foi provavelmente um dos melhores guardiões dos anos 50 e 60, um monstro nas redes tanto ao serviço do Manchester United como da selecção da Irlanda do Norte. Mas hoje poucos se lembram dele. Mas a história da sua acção heróica em Munique garantiu que o seu nome não cairá no esquecimento.
Foi num 6 de Fevereiro às 15h03 no meio de um imenso nevoeiro. Contra as indicações da equipa técnica - que tinha preferido seguir a viagem de autocarro até à Holanda, e aí atravessar o canal da Mancha de barco - o avião capitaneado por James Thain arrancou na gelada pista do aeroporto de Munique. Um voo que tinha chegado de Belgrado, onde a equipa orientada por Matt Busby tinha acabado de eliminar o Estrela Vermelha para a Taça dos Campeões Europeus. Uma equipa onde pontificava Duncan Edwards e que era vista como a grande ameaça ao quarto titulo europeu do Real Madrid.
O avião levantou do solo por breves instantes. Depois, a catástrofe. Uma queda estrepitosa e um incêndio imediato consumiu o aparato. Sete jogadores morreram de imediato com o impacto. Com eles, dois elementos da tripulação, três membros da equipa técnica e oito jornalistas não sobreviveram à queda. No meio das chamas, Harry Gregg, guardião da equipa, teve a sangue-fria de carregar às costas com os colegas moribundos. Salvou Bobby Charlton, Jackie Branchflower, Dennis Viollet, Duncan Edwards e o técnico Matt Busby, todos gravemente feridos, particularmente das queimaduras produzidas pelo incêndio. Já com os sobreviventes fora do avião Gregg ouviu gritos de uma mulher. Era Vera Lukic, mulher de um diplomata jugoslavo que seguia no avião. Arriscando a vida, Gregg entrou no avião e resgatou-a, bem como à pequena filha que a acompanhava. Além da filha, Vera Lukic estava grávida de sete meses. O filho nasceu sem problemas. No total o guarda-redes salvou sete pessoas. Antes de cair, desmaiado, na pista de aterragem.
De todos os colegas que resgatou, só Duncan Edwards não sobreviveu. Morreria poucos dias depois, vitima das graves queimaduras do acidente. Perdia-se o melhor jogador inglês de então. Mas Busby, que sobreviveu por milagre, recuperou e montou uma nova equipa ganhadora à volta de Bobby Charlton. E com Harry Gregg claro.
O guarda-redes irlandês tinha começado a sua carreira anos antes, na sua Irlanda natal. Jogou no Linfield antes de se transferir para o Doncaster, em Inglaterra. Nascido em 1932, chegou em 1957 a Old Trafford. Era o guarda-redes que Busby queria para dar forma à sua equipa. Esteve nove anos em Manchester e ainda hoje é considerado por muitos o melhor guarda-redes da história do clube. Em 1958 venceu a Liga Inglesa pela primeira vez e foi eleito o melhor guarda-redes do Mundial de 1958, diante de Lev Yashin, a mitica "aranha-negra". No ano seguinte, o mesmo do acidente de Munique, fez parte da equipa campeã apesar de não ter disputado nenhum encontro após o acidente. Depois de 1963 uma série de lesões acabou com a sua carreira. Alex Stepney substitui-o nas redes dos Red Devils e apesar de ter vencido mais duas ligas (1963-64 e 1966-1967), fê-lo apenas como suplente utilizado. No final de 1967 foi transferido para o modesto Stoke City. Nas vésperas do titulo europeu do Man Utd, o mesmo que lhe escapou naquela tarde fatidica.
A partir daí a carreira de Harry Gregg não voltou a ser a mesma. Do Stoke City passou ao Shrewsbury Town onde acabou por pousar as botas. Passou imediatamente a técnico do Swansea, em 1972, passando posteriormente para o Crewe e Swindon Town. No final dos anos 80 a carreira como técnico foi substituida por uma carreira universitária, onde Gregg acabou por ser doutorado pela universidade de Ulster. Hoje continua a ser um dos poucos sobreviventes de um dos mais dramáticos acidentes da história do desporto. Um herói sem o qual talvez a história do futebol se tivesse escrito de forma bem diferente.
Depois de uma convincente vitória frente ao Standard Liege, o Arsenal confirmou categoricamente o seu apuramento para os Oitavos de Final. Pela décima temporada consecutiva. Números que espelham a grande regularidade da equipa que melhor futebol praticou ao largo da década. E a quem só falta triunfar na prova rainha do futebol europeu...
Com a primeira década do novo milénio a chegar ao fim, começam a surgir as primeiras listas de top 10. Inevitável. Dentro do meio futebolistico há muito que se pode parar de procurar a equipa que melhor praticou futebol ao largo de toda a década. A mais regular e espectacular. Apesar dos escassos titulos logrados, o Arsenal foi a coerência absoluta ao longo dos últimos dez anos. Depois da chegada retumbante de Arsene Wenger e dos primeiros titulos - logrados em 1998 - a equipa londrina tornou-se no espelho do bom jogo. E legitimo mencionar nesta pretensa lista o Barcelona, Chelsea, Manchester United, Sevilla e até mesmo o FC Porto. Mas nenhum destes clubes manteve sempre o mesmo nível. Viveu periodos de grandes altos e significativos baixos. O Arsenal não. Esteve sempre na crista da onda. Bateu recordes e logrou titulos. Menos um. Aquele que lhe falta. Aquele que há dez anos consecutivos persegue de forma sagaz. Sem o lograr...
É a espinha atravessada na notável carreira de Wenger.
O treinador francês nunca escondeu que é o capitulo que lhe falta para encerrar com chave de ouro a sua vida em Londres. Já começou mesmo o debate sobre se um grande técnico pode sê-lo sem nunca ter ganho a Champions. Claro que sim, e Wenger é precisamente a prova. Como outros do passado, de Shankley a Lobanovsky. Técnicos que apostavam num futebol atractivo e sedutor. Mas que acima de tudo fizeram escola e criaram um estilo. O Arsenal de hoje é o oposto da figura histórica dos gunners. Até à chegada do francês era reconhecido o titulo de equipa mais aborrecida das ilhas britânicas. Mas tudo mudou. Hoje longe vão os dias do apertado Highbury Park ou da legião francesa que Wenger montou à sua volta. Hoje há poucas - ou quase nenhuma - estrela. Os salários são controlados, as dividas significativas. A equipa mexe-se pouco no mercado e continua a politica do seu técnico, já iniciada na sua etapa no AS Monaco: apostar ao máximo na formação.
Durante os últimos 10 anos o técnico lançou vários jogadores ao mais alto nível que hoje fazem parte do imaginário colectivo de qualquer amante do bom jogo. Cesc Fabregas, capitão de equipa aos 22 anos, é a sua maior pérola. Mas há também Walcott, Sagna, Diaby, Denilson, Ramsey, Whilshire, Clichy, Gibbs, Vela, Adebayor, Flamini, van Persie, Senderos e isto para não mencionar a velha guarda dos Petit, Vieira, Henry, Trezeguet, Pires ou Ljunberg que ajudou a formar e a lançar para o estrelato.
Apostando num 4-4-2 fluido, que rapidamente se torna em 4-2-3-1, o Arsenal de Wenger renasce todos os anos. A perda de jogadores é inevitável, mesmo para um grande da Premier League. Este ano perdeu Kolo Toure e Emanuel Adebayor. Mas a equipa não o nota. Condenado pela imprensa, no principio do ano, a vaguear pelo meio da tabela, os gunners já lideraram a classificação. Agora seguem em terceiros, empatados em pontos com o velho rival londrino, o Tottenham. A sete do lider, o intratável Chelsea. Uma distância significativa mas que em Inglaterra pouco significa. Especialmente quando ainda há tanto por jogar. Na Europa o dominio de um grupo pautado por equipas que seguem a mesma filosofia dos gunners - o Standard e o AZ - provou mais uma vez a eficácia europeia do Arsenal na fase de grupos. São dez épocas consecutivas a garantir a passagem aos Oitavos de Final. É a partir daí onde estão os reais problemas.
Eliminado no ano passado frente ao Manchester United nas meias-finais, o Arsenal é das equipas que mais presenças acumula nos últimos jogos da prova. Mas apenas por uma vez logrou passar à final. Numa inesquecivel noite em Villareal o argentino Juan Roman Riquelme falhou o penalty decisivo. E o Arsenal viajou a Paris. Aí foi derrotado pelo Barcelona do melhor Ronaldinho. E pela própria inexperiência de uma equipa rapidamente reduzida a 10 unidades. Foi o final da era francesa. De Pires, Anelka, Vieira e Henry. O técnico recomeçou a reconstruir uma equipa que pouco tempo antes tinha ganho a Premier League com uma superioridade insultante. A primeira vez que uma equipa vencia a Premier sem perder um só jogo. Superado nos últimos anos pelo Chelsea e Manchester United, a equipa londrina volta a apontar baterias ao velho sonho europeu.
Dentro do curriculum do Arsenal há poucas vitórias europeias.
É, nesse capitulo, das equipas menos bem sucedidas do futebol britânico. Um historial negro que Wenger quer quebrar. Sabe que tem um plantel curto mas recheado de brilhantismo. Fabregas, Arshavin e van Persie são um trio temível, se as lesões os respeitarem. A contratação de Vermaelen foi mais um achado de Wenger, e o central belga é hoje titular indiscutível ao lado do veterano Gallas. Uma dupla temível à frente de Almunia, uma das poucas interrogações à volta da equipa. Mas que, mesmo assim, não tem comprometido.
Ao Arsenal, apesar destes dez anos de glória, falta algum traquejo. A juventude do plantel é notória. Ontem foi Nasri a brilhar. Por vezes é Walcott. Outras Vela. Ou Denilson, Diaby, Ramsey, Wilshire, Bendter. Todos por debaixo dos 23 anos. No final do ano essa juventude nota-se. E contra isso que Wenger trabalha. Porque a nível de ritmo de jogo, hoje os gunners são claramente, uma das grandes atrações da Premier League. E claro, da Champions League. Na sombra do favorito Chelsea, sem a pressão de outras épocas, a equipa pode respirar tranquila. Tem até Fevereiro para voltar a concentrar-se na prova rainha europeia e até lá saberá bem como será a sua prestação doméstica. Um bónus que o técnico agradece.
Há momentos desta década desportiva que fazem qualquer um levantar-se da cadeira e querer aplaudir. Os movimentos de corpo de Zidane, o sorriso de Ronaldinho, os livres de David Beckham, os sprints de Cristiano Ronaldo, os regates de Lionel Messi, os passes cerebrais de Xavi Hernandez, os remates letais de Ronaldo...são incontáveis. Mas dispares, no tempo e espaço. O que o adepto pode ter a certeza é que se liga a televisão e vê onze homens de vermelho e branco, com um canhão ao peito, pode sentar-se tranquilamente e apreciar. O espectáculo está garantido. 10 anos depois o encanto Gunner continua!
Bem diferente do bruxo que reinvindica para si os créditos da lesão de Cristiano Ronaldo, em Can Barça há um feitiço bem mais silencioso mas igualmente letal. Um soporifero, quase, que entorpece os movimentos e atrasa os cronómetros. A máquina avassaladora de pressão que foi o Pep Team 2008/2009 tornou-se numa equipa previsível e que joga, cada vez mais, na expectativa. Hoje o Barcelona tem o primeiro de três duelos chave até ao final do ano. E espera quebrar o feitiço a tempo...
Na conferência de imprensa prévia ao duelo de hoje no Camp Nou contra o Inter, o técnico do Barcelona, Josep Guardiola, pediu que lhe deixassem acreditar ser possível vencer sem Zlatan Ibrahimovic e Lionel Messi. Os dois cracks maiores da constelação blaugrana sofrem problemáticas lesões não suficientes para os excluir da convocatória mas que podem impedir a sua participação no duelo de hoje. E do próximo domingo, no mesmo recinto, frente ao rival de sempre. Que até chega como líder. Um lider inesperado.
Guardiola sabe - e Johan Cruyff defendeu-o, uma vez mais na crónica semanal que publica - que o problema deste Barcelona não são as individualidades. É o espirito colectivo. À vontade de vencer a qualquer custo que levava a equipa a pressionar do primeiro ao último segundo os rivais, sucedeu um relaxamento perigoso que levou a equipa a perder pontos por seis vezes. Três na Liga - onde é segundo a dois pontos do líder, o Real Madrid. Três na Champions, onde joga hoje o tudo por tudo. Até é verdade que o conjunto de Guardiola continua a mostrar ter um futebol acima da média e que só tem uma derrota em todo o ano desportivo. Mas depois de ter captivado o Mundo com a sua versão 08.09, agora a desilusão é maior. Ninguém vê neste Barça traços da mágica equipa da época passada. Porquê?
A principio muitos queixavam-se do erro de Guardiola em trocar Samuel Etoo por Zlatan Ibrahimovic. Outros apontavam criticas severas ao curtíssimo banco que leva a que à minima lesão o técnico fique sem opções válidas. Chegados quase ao final do primeiro terço da época, nem um nem outro caso justificam a baixa de forma dos catalães. Longe disso. Ibrahimovic até se tem revelado mais concretizador que o camaronês e o seu estilo de jogo, mais técnico e flúido, enquadra-se bem no ritmo proposto pelo técnico. O Barcelona perdeu em raça e querer mas ganhou em classe e oportunismo. Ibrahimovic tem marcado e assistido. E nunca comprometido.
Quanto à polémica do plantel, é verdade que está mais curto que no ano passado. Num elemento apenas. Guardiola perdeu Gudjonssen para o meio campo e não recebeu ninguém em troca. Na defesa Maxwell rendeu Sylvinho e Chryginski a Cáceres, que praticamente nunca foi opção. E no ataque Pedro tornou-se presença regular no lugar de Thierry Henry, lesionado a maior parte da época. Os mesmos rostos suponham o mesmo ritmo. A falta de banco é contrastada por uma clara aposta numa das melhores canteras da Europa. Jeffren, Asulin ou Dos Santos têm tido as suas oportunidades. Mais estão a caminho na mágica fábrica de La Masia.
A grande questão prende-se nos próprios jogadores. E na motivação.
O Barcelona continua a ser uma equipa plena de automatismos e joga de olhos fechados. Venceu a maioria dos jogos com tranquilidade e mesmo os pontos perdidos - talvez excepto frente ao Rubin Kazan, a sua particular besta-negra - não foram resultado de exibições inferiores. Mas sim de faltas de atenção. Um erro do meio-campo frente ao Osasuna permitiu um empate nos instantes finais. Um péssimo posicionamento defensivo em S. Mamés deu ao Athletic a oportunidade de empatar um jogo controlado. E a falta de eficácia ditou os resultados em Milão e Valencia (ambos 0-0).
Xavi continua a pautar o jogo com mestria, mas este ano os técnicos rivais sabem que a fonte da magia do Pep Team sai dos seus pés. As marcações tornam-se implacáveis. Iniesta vem de uma dificil lesão e ninguém espera que esteja na sua melhor forma até Janeiro. O mesmo se passa com Henry. E Messi arrancou o ano a anos-luz do que se viu no final da época passada, para provar que os prémios individuais continuam a ser mais uma questão de prestigio do que de qualidade de jogo. Uma conjuntura demasiado negra para uma equipa que continua a ser, apesar de tudo, das melhores da Europa.
A isso junta Guardiola certamente no seu cozinhado um problema claro de motivação. Nota-se claramente uma falta de aplicação de vários jogadores. A pressão já não é feita tão em cima. A defesa já não sai sempre com a bola controlada. Os sprints de Daniel Alves já não são tão velozes quando é preciso recuperar no terreno. E os minutos finais pautam-se mais por nervosismo do que por controlo. Essa falta de controlo tem sido o calcanhar de Aquiles culé.
Hoje diante do mestre da táctica, Guardiola terá um dos jogos mais dificeis da sua carreira. Mourinho chega confiante e em alta. O seu Inter começa a mostrar o seu melhor rosto e os italianos chegam lideres do grupo. Um empate no duelo de leste entre Kazan e Dynamo Kiev pode significar que ao Inter não perder no Camp Nou seja suficiente para garantir o apuramento. E por isso a equipa irá esperar. Irá jogar com o nervosismo de quem tem tudo a perder e nada garantido. Será uma equipa matreira e atenta. Marcará à zona e jogará com a falta de forma de elementos chave. Mas, acima de tudo, estará concrentrada. É precisamente esses niveis que tem de trabalhar Guardiola. Ele sabe que jogos assim, quase a eliminar (uma vitória do Kazan e uma derrota hoje significa o adeus à prova), ganham-se em detalhes. E é precisamente em detalhes, e não no ritmo de jogo, que está a cruz do Barcelona. Como Cruyff adiantou, se joga Messi ou Zlatan é quase irrelevante. Em condições fisicas deficientes serão mais um problema do que a solução. Baixarão os niveis de concentração e ajuda. Serão menos eficazes a defender e pouco influentes a criar jogo ofensivo. Pedro e Iniesta no ataque podem trazer a verticalidade necessária, mas será a capacidade de sofrimento da equipa - tal como sucedeu frente ao Chelsea na época passada - a ditar as diferenças.
Perder hoje o actual campeão da Europa é uma situação perfeitamente possível. E não se pode dizer que injusta. Muitos acharam o grupo demasiado simples e a realidade provou que o futebol de leste impõe, cada vez mais, respeito. Tanto Mourinho como Guardiola sabem que é provável que um dos dois fique pelo caminho. Será a experiência de um técnico habituado a testes definitivos com a ilusão de um técnico que conseguiu tudo no seu primeiro ano a sério, mas que não parece estar disposto a atirar cedo a toalha. Será um jogo cerebral. Provavelmente pouco espectacular. Definitivamente imperdível...
É a grande sensação da Cantábria, uma região que há mais de uma década que não conta com um jogador emblemático. Desde os dias de Ceballos. Com 18 anos tem já os grandes de Espanha a mover-se nos bastidores para conseguirem garantir um jogador que muitos antevêm como o grande prodigio a sair da formação espanhola nos últimos anos. Sérgio Canales é, sem dúvida, o nome da moda no país vizinho...
A nível profissional Canales ainda só efectuou 15 jogos pelo seu clube de sempre, o Racing Santander. Mas não precisou de mais. O seu curriculo pelas selecções jovens de Espanha - é campeão europeu de sub-17 - e os toques de classe com que se vai exibindo numa equipa mais conhecida pelo seu futebol de músculo têm sido mais do que suficientes. Tanto o Real Madrid como Sevilla e até mesmo o Barcelona - que tem na sua cantera alguns jogadores do mesmo nível - têm sondado o clube cantábrico para conseguir a contratação do jovem médio centro. E a verdade é que ver jogar Canales é um exercício de pura estética. O jovem de 18 anos desafiou a defesa do Real Madrid, no último encontro da liga espanhola. Não se perturbou minimante com o ambiente no Santiago Bernabeu e quando os veteranos colegas baixaram os braços ele continuou a lutar. Sem sucesso. Mas deixou boas impressões. As mesmas que já tinha antevido há um ano quando, com apenas 17 anos, se estreou com a camisola verde e branca do clube de Santander.
Sergio Canales nasceu em 1991 em Santander. Desde sempre defendeu as cores do Racing tornando-se na grande coqueluche do futebol de formação do modesto conjunto cantábrico. Pequeno mas ágil, Canales começou a fazer nome ao serviço da selecção de sub-15 de Espanha. Daí deu rapidamente o salto para os sub-17 onde se sagrou campeão europeu na Turquia ao lado de Bojan, Mérida e Thiago. Tornou-se peça nuclear no jogo espanhol e convenceu o seu técnico de então no Racing, Miguel Angel Muñiz, a apostar nele para a equipa principal. Com 17 estreou-se na Taça UEFA, poucos dias depois de ter logrado o mesmo feito na Liga. Ao longo do seu primeiro ano no futebol profissional jogou apenas por oito vezes, a maioria das quais no mitico Sardinero. Ao lado de Munitis e Zigic ajudou o conjunto cantábro a garantir a permanência. E começou a despertar a atenção dos grandes. O Sevilla tentou contratá-lo mas os números exigidos levaram a equipa andaluza a retirar a oferta, apesar do empréstimo do jovem Crespo ter indicado que pode existir um pré-acordo com o jogador. Curiosamente o jovem nunca deixou Santander mas metade do seu passe pertence ao Deportivo La Coruña, num negócio de há quatro anos que envolveu uma troca de jogadores entre os dois clubes. Então, César Lendoiro, o histórico presidente do clube galego, viu o jovem e preferiu ficar com metade do seu passe a receber 800 mil euros do clube cantábro. O cenário actual parece dar-lhe razão.
Com 18 anos apenas Canales emerge já, por direito próprio, como uma das figuras a seguir na Liga. Regressado do Mundial de sub-19, o jovem é uma das armas secretas do novo técnico, Miguel Angel Portugal. Resta saber se o futuro é realmente tão risonho como o rosto matreiro do jovem artista.
Só uma vez na história da Premier League uma equipa tinha apontado 9 golos num encontro. Quatorze anos depois o Tottenham Hotspurs igual o feito e confirma que os dias dificeis parecem ter passado. Defoe é o novo herói de White Hart Lane, um estádio que recuperou o sorriso.
Histórico do futebol inglês como poucos, o Tottenham tornou-se na última década num verdadeiro case study. Teve ao seu serviço grandes técnicos e executantes primorosos. Todos os anos arrancava cheio de expectativas mas rapidamente a equipa provava o amargo sabor da derrota. Demasiadas vezes. Pelo Natal na maioria dos anos os Spurs debatiam-se pelos últimos postos e só a custo iam trepando na classificação. Sem nunca lograr os objectivos. Este ano parecia que não ia ser diferente, excepto por um pequeno detalhe: Harry Redknapp.
O técnico inglês foi o grande responsável pela ascensção do Portsmouth à elite da Premier e ao mudar-se para Londres muitos auguravam-lhe um futuro complicado. Uma equipa com muitos bons jogadores mas sem espirito colectivo. E uma maldição que ninguém parecia quebrar. Redknapp herdou a equipa de Juande Ramos e conseguiu equilibrar o conjunto londrino a meio da tabela. Este ano prometeu algo mais. E pela primeira vez os adeptos têm razões para sorrir. O Tottenham segue em quarto lugar, empatado com o terceiro, o eterno rival Arsenal. E depois da goleada histórica aplicada ao Wigan Athletic, muitos sonham já com uma qualificação histórica para a Champions League.
Ao intervalo a equipa da casa vencia por 1-0. Golo solitário de Peter Crouch e muitas unhas ruidas na bancada. O Wigan defendia bem, mostrava organização e parecia querer vender cara a derrota. Mas ao regresso do intervalo algo parecia mudar. Os brancos do bairro judio de Londres vinham com uma aura insuspeita. Preparados a fazer história. Um deles em particular. Jermaine Defoe, que seguiu o técnico do Portsmouth até Londres, depois de uma anterior passagem pouco sucedida no Tottenham, tornou-se na estrela do dia. Em sete minutos o dianteiro apontou um hat-trick. E abriu caminho ao enxoval ofensivo da sua equipa. Um auto-golo de Kirland, um remate colocado de Aaron Lennon e um golpe de autoridade do croata Niko Kranjcar selaram o resultado. Roberto Martinez, o técnico espanhol do Wigan, não podia acreditar. A organização defensiva que tão bem tinha funcionado na primeira parte tinha sido destroçada pela movimentação do avançado que reclama a Capello uma oportunidade na equipa dos Pross. Um feito que iguala a única goleada que atingiu números tão escandalosos. Em 1995 o Manchester United bateu por 9-0 o Ipsiwch Town com Andy Cole a assinar então o hat-trick goleador.
A oito pontos do lider destacado - o Chelsea que voltou a provar que é, neste momento, a melhor equipa do futebol europeu - o Tottenham sabe que a sua luta é outra. O regresso à Europa é o objectivo prioritário numa equipa que vive há muito longe da sua posição natural na hierarquia britânica. Mas com a queda do Liverpool, a baixa de forma do Aston Villa e os constantes tropeções do Manchester City, os Spurs podem sonhar com algo mais. É uma das equipas em melhor forma da Premier League e conta com um dos técnicos mais experientes. No final a história até se pode repetir, mas desta vez os adeptos tiveram verdadeiramente razões para sorrir.
A descida de divisão, especialmente quando se trata de um histórico, pode revelar-se traumática. Alguns nunca mais voltam tal é o dano que a queda provoca. Mas em Newcastle ninguém quer morrer na praia. A prova é longa mas os "magpies" estão determinados a fazer a festa. Com um terço da Championship cumprida a equipa de Chris Hughton é líder. E ninguém os consegue travar...
Dezzasseis jogos. 33 pontos. Um excelente saldo que dá ao Newcastle dois pontos de avanço do seu mais directo perseguidor - o também despromovido West Bromwich Albion - e, o que é mais importante, seis da primeira equipa fora dos postos de subida. Uma vantagem que até pode parecer curta, mas na liga mais competitiva do futebol inglês - onde o equilibrio tem sido a nota dominante na última década - é fundamental para sonhar com uma subida sem problemas. A Coca Cola Championship funciona de uma forma particular. As duas primeiras equipas na tabela classificativa logram classificar-se directamente para a Premier League. As equipas entre o 3 e o 6 posto disputam um play-off para garantir o último lugar. É desse cenário que o conjunto de Chris Hughton quer fugir quanto antes. E para tal liderar, categoricamente, até ao Inverno, é fulcral.
Com os problemas financeiros que atravessa a instituição, desde Agosto que parecia dificil que o Newcastle garantisse o regresso à Premier League logo no primeiro ano no "inferno". Para lá dos outros rivais despromovidos - Middlesborough e West Bromwich Albion - terem melhores condições, houve grandes investimentos em conjuntos históricos da liga que ansiam desesperadamente pelo regresso à elite. Casos do QPR, Nottingham Forrest, Ipswich Town, Derby County, Leicester ou Sheffild Wednesday. Olhando para a lista de equipas em prova era até fácil simular uma Premier League dos anos 80 ou 90, tal é o número de clássicos em prova. O Newcastle conhecia bem o chão que pisava e o técnico decidiu rapidamente pressionar o acelarador. E a equipa fugiu aos perseguidores. Hoje apenas 10 pontos separam o líder do 15 classificado. Isso diz muito do forte nível de competidores. Mas em Saint Jame´s Park o cenário é de optismo. A equipa manteve muitos dos bons jogadores que tinha no plantel e formou um conjunto coeso. Hughton trouxe motivação e equilibrio táctico. E acima de tudo vontade de ganhar. Diante de Steve Harper o técnico prefere apostar num quarteto composto por José Enrique, Fabio Collocini, Steven Taylor e Danny Simpson. No miolo do terreno Nicky Butt e Kevin Nolan acompanham Jonás Gutierrez e Harewood, com Geremi e Barton como suplentes de luxo. E na frente, com ordem para fuzilar, a dupla Ameobi-Carroll.
A equipa abriu a época com um empate com o West Brom. Seguiram-se seis vitórias consecutivas com Ameobi e Guthrie em grande forma. Um tropeção em Blackpool e logo depois em Peterborough deixaram as contas mais equilibradas mas a equipa voltou rapidamente aos triunfos. A goleada a Ipswich e o empate diante do QPR voltaram a colocar o conjunto na liderança da prova onde ainda hoje está. Apesar disso - em 16 jogos - a equipa conta com quatro derrotas. Algumas delas injustificáveis para o técnico que defende que a equipa deveria ter um avanço mais confortável. Mas os tropeções dos rivais directos evitaram males maiores. Agora a equipa prepara-se para dois jogos complicados - frente ao Preston e logo diante do Swansea, orientado por Paulo Sousa - e duas vitórias podem supor um golpe de autoridade. A seis jornadas do final da primeira volta é fundamental chegar ao mitico Boxing Day com uma vantagem confortável. Aí disputam três jogos em seis dias e tudo pode passar. Hughton sabe-o bem. Já ganhou e perdeu ligas nessa série de jogos complicados. E não quer facilitar.
Contra todas as expectativas - a imprensa britânica passou mesmo o Verão a traçar paralelismos entre o Newcastle e o Leeds United, outro grande que agora milita na Division II - os "geordies" seguem na frente e a bom ritmo. A época é longa e muito pode passar, mas está claro que o Newcastle United morrerá com as botas calçadas.