Poucas equipas jogam tão bem na Ligue 1 como o modesto Sochaux. Uma verdadeira revolução dos pequenos e jovens liderada pelo ritmo frenético e criativo de Marvin Martin, o anti-diva do futebol gaulês. Numa época em que a França procura rapidamente limpar as feridas do corte geracional com a sua idade dourada, muitos acreditam que é Martin o porta-estandarte de uma nova vaga de jogadores que ainda sobem ao relvado pelo prazer de jogar.
Não deixa de ser um miudo de 22 anos. E relembra-o constantemente. Joga a consola, compra roupa nas lojas mais acessiveis e usa orgulhosamente nas costas o número 14, o mesmo do seu "arrondisement", o bairro social onde cresceu em Paris. É um filho da capital que, como tantos outros, teve de ir buscar a sua sorte na provincia. Apesar da sua profunda paixão pelo PSG - era um adepto fervoroso que não perdia um jogo - hoje a sua equipa joga mais a sul e pode mesmo roubar aos parisinos um posto na Europe League da próxima época. E graças aos seus momentos de magia.
Marvin Martin é diferente. Ao contrário de Samir Nasri ou Yohan Gourcouff, os ungidos herdeiros de Zidane que ainda não deram o salto definitivo, nunca quis viver sobre o estrelato de grandeza. É ambicioso como poucos mas sabe que a sua carreira seguirá as etapas naturais que o próprio Zizou ou o alemão Ozil, com quem tanto lhe comparam ultimamemte, foram queimando. Prestes a ser convocado pela primeira vez por um Laurent Blanc que já reconheceu que vê nele algo "distinto", Martin continua a ser o miudo de bairro que desfruta tanto do jogo como quando corria as ruas do seu bairro com a bola colada aos pés. Em Sochaux, terra da Peugeot que criou e patrocina ainda hoje o clube local, é uma estrela. Mas para o resto da França ainda é um relativo desconhecido. Um pais onde as equipas da provincia ainda criam pouco impacto na comunicação social e que se divorciou da selecção depois do triste espectáculo que viveu na África do Sul. É dificil imaginar Martin no papel do rebelde Anelka.
No miolo do terreno de jogo sente-se em casa. Pauta o ritmo de jogo, acelera, desmarca, finaliza.
É um jogador completo a quem só o fisico parece travar para dar o salto para outro nivel. Os olheiros dos grandes clubes da Europa nunca o tiveram debaixo do radar. Fizeram mal. Com o técnico Francis Gillot tornou-se num must see do futebol europeu. Em Sochaux, onde chegou em 2002 com apenas 14 anos, cresceu. Juntamente com o franco-argelino Ryad Boudebouz, Sloan Privat e Geoffrey Tulasne tornou-se no menino dos olhos do clube da cidade. As saídas de Jeremy Menez e Mevult Erdinç, dois amigos com quem partilhou horas de jogos de consola, e do veterano Stephane Dalmat fizeram com que o técnico lhe entregasse batuta da equipa. A aposta funcionou. O Sochaux, que na época passada esteve perto de ser despromovido, é agora o quinto classificado da Ligue 1, colocado nos postos europeus e a poucos pontos da Champions League. É também a equipa que melhor futebol pratica, se nos esquecermos por um momento do Lille de Rudy Garcia. E isso não é um mero acaso.
O ritmo de Martin é fundamental para que o jogo de passe e toque dos jovens amarelos funcione. Martin começou a marcar e a assistir como nunca este ano e a sua parceria com a dupla de atacantes, os também jovens Ideye Brown e Modibo Maiga, funcionou. O Sochaux não é só uma das equipas mais jovens do torneio. É também das mais eficazes.
É expectável que a estância do jovem em Sochaux não dure muito. A chamada de Blanc à selecção confirmará a sua consagração nacional e isso, hoje em dia, significa que os falcões europeus estarão de olhos bem abertos. O exemplo de Ozil, resgatado ao Werder Bremen por apenas 17 milhões de euros pelo Real Madrid está bem vivo. E com o mercado em sérios problemas, é previsivel que jogadores jovens e baratos como Martin sejam verdadeiras pérolas preciosas. Além do mais, o estilo de jogo de toque popularizado pelo Barcelona, e onde Xavi brilha por cima dos demais, fez os clubes voltarem a interessar-se por um tipo de jogador que, segundo o próprio médio catalão, parecia estar em vias de extinção.
A verdade é que Marvin Martin tem todas as condições para triunfar. Não tem pressão, tem talento e faz parte de uma raça de jogadores rara e altamente cobiçada. O seu sucesso actual em Sochaux é apenas o primeiro capitulo de uma história que no final poderá perfeitamente tornar-se num fabuloso destino para o filho mais ilustre do banlieu 14.