Muitos se perguntam como é que ainda é possível que uma liga onde habitam alguns dos mais talentosos futebolistas do Planeta continua a ser uma ilustre desconhecida. Uma liga pouco competitiva, incapaz de atrair os adeptos de além fronteiras. Parte da razão está em decisões como o despedimento de Dorival Júnior. O Santos espelha bem o Brasil de hoje, o Brasil de sempre. Um país com muito futebol nos pés e pouco na cabeça.
No último ano tornou-se moda seguir o renascido Santos. A equipa do Peixe foi rebaptizada graças ao talento emergente de vários jogadores da sua formação. Entre eles o trio a seguir, Neymar, Paulo Henriques e André.
A fama da equipa, reforçada momentaneamente com o empréstimo de Robinho, tornou-se num chamariz ideal para o Brasileirão. A equipa santista, um dos históricos do futebol canarinho, voltou a vencer. Voltou aos titulos. Algo que não se via desde os dias de Diego, Robinho e Elano. Muito tempo. Dorival Júnior foi o arquitecto da mudança. O técnico, um dos mais respeitados no grémio, organizou um onze atractivo e ofensivo e com as jovens estrelas como porta-estandarte, mudou o rosto do apagado clube da cidade portuária de São Paulo. Num ano venceu o Campeonato Paulista e a Copa do Brasil, dois titulos que a equipa há muito que não tocava. Naturalmente os santistas partiam na linha da frente para atacar o Brasileirão, já rodeados pela polémica da não-convocatória dos "meninos da Vila" para o Mundial (algo que o Brasil nunca perdoou ao sempre contestado Dunga) e pelo assédio constante dos grandes da Europa. Um assédio com resposta negativa. Sempre.
E quando tudo parecia que ia de vento em popa, Dorival Junior é despedido.
Sem dó, nem piedade. À brasileira. Por fazer o seu trabalho bem. Por preferir o colectivo ao individualismo que continua a ser o trademark por excelência de um futebol habituado, cada vez mais, à exportação de talentos. O técnico santista, obreiro do santo e senha que pauta o jogo dos brancos, foi despedido por um motivo: Neymar.
A jovem vedeta tem acumulado polémica atrás de polémica. Primeiros foram os penaltys de paradinha que obrigaram a FIFA a rever a lei que permite esse jogo sujo com o guarda-redes. Depois foram as celebrações que revoltaram as equipas contrárias. O lado safado de Neymar ganhou ainda mais força nas passadas semanas. Já sem o seu parceiro de ataque, o lesionado Paulo Henriques, o médio criativo chamou a si todo o protagonismo da equipa. Recusou-se a passar a bola as colegas, recusou-se a jogar em grupo. Procurou, como sempre, resolver tudo sozinho. Falhou. E o Santos perdeu. E viu a diferença para com o lider da prova, o Corinthians dos veteranissímos Ronaldo e Roberto Carlos, ampliada para seis pontos. Os insultos do médio ao técnico, à frente de toda a equipa, foram a gota que colmou o vazo. Em véspera de derby paulista. Dorival Júnior ficou farto da atitude do jogador e multou-o por indisciplina. Mas não foi suficiente, Neymar reeincidiu. Revoltou-se contra colegas e técnico em pleno treino. Em pleno jogo. E aí entram as diferenças entre o Velho e o Novo Continente, entre a desorganização brasileira e a disciplina europeia. Num gesto tão habitual na "Velha" Europa mas criminal no Brasil, o treinador informou a direcção que não iria convocar o atleta para o jogo contra o Corinthians. E talvez para os seguintes, se a situação se mantivesse. Foi suficiente. Poucas horas depois era fulminado. Despedido. Humilhado.
Sem Dorival Júnior o Santos enfrenta um rival temível desarmado. Neymar ganhou a batalha, o controlo definitivo da equipa. Tal como um novo Romário, Edmundo e afins, demonstrou que, como sempre, no Brasil o safado do relvado vale sempre mais que o génio do banco. Um espelho digno e fiel da estagnação táctica e competitiva do futebol brasileiro actual. Os grandes da Europa tomaram nota e pensarão duas vezes antes de arriscar os seus milhões num "menino" que acha que é dono da "vila". Mas que dificilmente conquistará o mundo.