O anúncio das contratações de Yohan Gourcouff e André-Pierre Gignac por Olympique Lyon e Olympique Marseille confirmam uma tendência que os últimos dois anos têm vindo a reforçar. A Ligue 1, talvez a mais imprevisível do espectro europeu, começa progressivamente a bipolarizar-se entre os dois gigantes do Sul. Esta época será determinante para entender quem ganha o braço de fora. Os "Olympiques" ou...os outros.
São dois nomes obrigatórios do presente e futuro do futebol gaulês.
Se Gourcouff é há muito referenciado como o novo Zinedine Zidane, depois de se ter afirmado no Girondins Bordeaux, já Gignac consagrou-se há duas épocas pela sua tremenda veia goleadora ao serviço do Toulouse. São nomes fulcrais para o novo seleccionador francês, Laurent Blanc, e representam mais do que um sério investimento por parte de Lyon e Marseille. São o espelho de uma estratégia recente que vai esvaziando o poder dos rivais directos, transformando os dois "Olympiques", nas equipas mais fortes da equilibrada Ligue 1.
O Lyon assumiu-se na última década como um clube que vende bem e compra melhor.
Gourcouff é o consagrar de uma longa estatégia que inclui a vários negócios redondos, particularmente de jogadores que destacam em clubes mais modestos da Ligue 1. Se no ano passado foram Lloris, Gomis e Bastos os elegidos, este ano ao médio centro, o criativo que faltou à França no passado Mundial, junta-se ainda o brilhante dianteiro Jimmy Briand, uma das grandes esperanças do futebol francês. Chegado do Rennes, Briand é um avançado temivel, veloz e possante, perfeito para acompanhar Lisandro e Gomis num tridente ofensivo de muito respeito. Com o patron contratado ao Bordeaux ladeado por Toulalan e Kallstrom (sem esquecer Gonalons, Makoun, Pjanic, Ederson ou Delgado), a equipa de Lyon tem, claramente, o mais forte plantel da Ligue 1. Na época passada o sonho europeu impediu o conjunto de recuperar o ceptro perdido à dois anos, depois de sete titulos consecutivos. Agora, o poder económico do clube presidido por Jean Michel Aulas enfraqueceu um rival directo (Bordeaux) e garantiu outra grande promessa (Briand). No meio fica o progressivo afastamento do clube com a sua formação, se bem que Grenier, Taffer e Mehama são já nomes a seguir apesar da sua juventude. Um cenário em tudo similar ao clube que reina sob a Cote D´Azur.
O Marseille quebrou a sua longa fome de titulos na passada época graças ao forte investimento feito pela direcção.
Do técnico Didier Deschamps ao argentino Lucho Gonzalez, os marselheses reforçaram-se em toda a linha e aguentaram o ritmo dos rivais até à fase determinante. Este ano, apesar de terem perdido o goleador Niang para o Fenerbache, os azuis voltaram a demonstrar no mercado gaulês que são uma força com um forte poder de persuasão. À parte do espanhol Azpiculeta, uma das grandes promessas do país vizinho, o clube do Velodrome assediou o Toulouse e trouxe Andre Pierre Gignac, o nome próprio da sobrevivência da equipa onde milita o português Paulo Machado. O dianteiro junta-se assim a outra grande promessa francesa recém-chegada, Loic Rémy e a Mathieu Valbuena e Steven Mandanda, outros habituais da selecção gaulesa. Se a esses se juntam André Ayew (uma das revelações do passado Mundial) e o patrão Gonzalez, e fica claro que temos uma equipa de primeiro nível europeu. Construida, tal como o rival de Lyon, à custa dos seus competidores directos.
É portanto fácil de perceber que neste defeso as equipas médias do futebol gaulês sairam a perder. Mais do que é habitual. Só o Lille conseguiu manter as suas duas estrelas maiores (Hazard e Cabaye), enquanto que Toulouse, Rennes, Nice e Montepellier foram despojados dos seus nomes fortes. AS Mónaco e PSG, duas glórias dos anos 90 a anos-luz dos seus melhores dias, sobrevivem graças à sua aposta na formação e em jovens promessas. Quanto ao Girondins Bordeaux, a grande sensação dos últimos dois anos, a saída de Blanc, Chamkah e Gourcouff pode por um ponto final a uma aventura que agora parece mais pontual que eterna. O clube perdeu as suas máximas referências e corre o risco de se afundar na mediania de metade da tabela.
Sem rivais à altura, Lyon e Marseille têm todas as condições para fazer desta época uma luta a dois do primeiro ao último suspiro. Se é verdade que a Ligue 1 é conhecida pelos seus vencedores surpresa e pelo imenso equilibrio que pauta as sucessivas edições, também é verdade que há muitos anos que não existem duas forças tão fortes, no papel, com relação à concorrência directa. França pode tornar-se brevemente num feudo pessoal dos Olympiques. A bipolaridade do sul ameaça a imprevisibilidade da história.