É impressionante como há nomes que passaram por toda a história do futebol sem receber um único prémio individual. Nomes no entanto que deixam marca mais profunda que tantos premiados descartáveis que ora vão, ora vem. Entendemos que um meio tão competitivo como é a Premiership, seja complicado distinguir um entre tantos. Mas passarem quinze anos a assobiar para o lado, isso já é mais complicado. Por isso hoje o futebol britanico está, finalmente de parabens. Ajustou contas antigas com um dos seus maiores injustiçados e coroou, já no final do reinado, Sir a um dos seus mais brilhantes cavaleiros.
Ryan Giggs não bateu Cristiano Ronaldo, Steven Gerrard, Nemandja Vidic ou qualquer outros dos potenciais candidatos a Jogador do Ano da Premier League, numa eleição dos próprios jogadores da prova. Giggs bateu a história, o passado, o esquecimento. Aos 35 anos o extremo gales venceu pela primeira vez o prémio. Sim, é verdade, a primeira e muito possivelmente a última. Imaginemos que Cristiano Ronaldo estava a caminho da sua terceira vitória. E aí podem conceber o tamanho da injustiça que se cometia, anos após ano. E se é certo que este é um prémio de carreira, também é verdade que é o reflexo directo do estilo de jogo praticado pelo Manchester United este ano, onde não há verdadeiramente um elemento que sobressaia, como passou, no ano transacto, com Cristiano Ronaldo. Apesar de já não jogar com a mesm assiduidade, foram de Giggs alguns dos golos e passes mais importantes da temporada e se se confirmar o triunfo do United na liga - o terceiro consecutivo - muito o deve ao jovem veterano gales.
Giggs é desses jogadores à moda antiga, provavelmente o maior simbolo do consulado de vinte e cinco anos de Alex Fergusson em Old Trafford. Ryan Giggs é o simbolo desse Manchester pós-Busby Babes. Não tem aquele toque de irreverencia mágica de Best, aquele desiquilibrio quase cavalheiresco de Charlton ou o espirto letal de Law. Esses tres nomes marcaram a história do United para sempre, mas o mais provavel é que daqui a uns anos se escrevem editoriais semana sim, semana não a queixarem-se de que já nã há jogadores como antes, como nos dias de Gigsy. E não haverá, certamente.
Talvez porque Giggs seja o producto máximo da espantosa escola de formação do Man Utd. O único - a par de Gary Neville e Paul Scholes - que fez toda a carreira no "Teatro dos Sonhos". Despontou numa era onde os herois eram Mark Hughes, Andrey Kanchelskis e o intratável e inigualável Eric Cantona. Foi ganhando o lugar na equipa a pulso, com os seus demoniacos sprints pelo corredor esquerdo. Giggs é hoje, provavelmente, o último grande extremo do futebol mundial. Pelo menos como o conheciamos, com esse poder de arranque, esses centros letais e essa capacidade de desiquilibrar qualquer contra-golpe. Hoje os extremos tem cada vez mais a tendencia de fechar ao centro, criando um tridente ofensivo no coração da grande area. Giggs é o oposto. É capaz de abrir o jogo como ninguém, provocando espaços no coração das defesas, fundamentais para a entrada de homens rápidos e letais como são Rooney, Ronaldo ou Tevez. Apesar de nos últimos dois anos ter jogado várias vezes no centro de campo, o gales é um homem de ala. Basta lembrar-nos das miticas arrancadas contra o Arsenal ou o golpe de efeito contra a Juventus naquela meia final histórica em 1999 no Dell Alpi.
Sobreviveu ao "fantasma" de Cantona e perdeu visibilidade com o mediatismo de Beckham. Com os golos de van Nistelrooy foi desterrado para a sombra e a explosão de Cristiano Ronaldo tornou-o quase dispensável para muitos. Mas já passaram quase vinte anos e Ryan Giggs continua a ser o trovão que dinamita qualquer defesa, o jogador que faz a diferença. Esta pode não ter sido a sua maior temporada e provavelmente Giggs vai acabar a carreira sem nunca ter jogado uma grande competição internacional com o seu Pais de Gales. Mas a época está aí a chegar ao fim e a força do Man Utd pode trazer-lhe mais um par de trofeus para juntar à sua colecção. Haverá um dia em que - tal como muitos dos colegas que o foram acompanhando - deixemos de ver o veloz número 11 rasgar aquele flanco esquerdo de Old Trafford. Nesse dia entrar-nos-á uma imensa nostalgia. E só então muitos perceberão a importancia de Giggs na história do futebol actual e chegarão à mesma conclusão: este jogador marcou uma era.