Apesar de ainda faltarem 13 jogos para terminar a edição 2009/2010 da Liga Sagres a prova chegou ao seu ponto final. O futebol que possa seguir aos eventos desenrolados no último mês é inconsequente. A liga portuguesa deu um salto para trás no tempo e voltou a decidir-se na secretaria lembrando eras passadas que há muito tinham sido enterradas. Uma equipa que podia ter sido justa campeã no relvado ficará com a mancha de provavelmente vencer com golpes debaixo da mesa.
Num país onde se silenciam jornalistas por uma virgula de discórdia e onde uma maioria silenciosa sufraga uma minoria suicida e com um ego do tamanho de um império imaginado, o futebol sempre foi um escape com caracteristicas bem particulares. Este ano, mais do que nunca, o futebol manchou-se com a mesma cepa que tem rasgado as entranhas do país. No campo a qualidade desportiva tem seguido a tendência da década. As equipas grandes a um nível baixo. As equipas médias sem grandes argumentos. As equipas pequenas cada vez mais minusculas. No meio desto oásis de desespero desportivo surgiu um Sporting de Braga revigorante. Cheio de imaginação e disciplina, com uma atitude guerreira e ofensiva, o Braga marcou claramente o ano desportivo. Independentemente da posição final na classificação geral, este é o seu ano. Porque até ao dia de hoje, dia do ponto final da Liga, o Braga liderava. O Braga encantava. O Braga era o melhor. Até ao ponto final.
Um futebol manchado por Apitos Dourados e por constantes problemas financeiros de grandes e pequenos é um futebol murcho. Se a essa conjuntura se junta uma intervenção clara e posicionada dos orgãos que gerem a competição, então o resultado final fica claro. O SL Benfica será, muito provavelmente, a equipa campeã nacional. E chegou a ser, lá para Setembro e Outubro, a equipa que melhor jogou nos relvados lusos. Mas a febre goleadora esmoreceu rapidamente, as derrotas chegaram (Braga, Guimarães, empate com Sporting) e rapidamente a magia ofensiva deu lugar ao calculismo táctico. E ás vitórias enganosas. Aos jogos que terminam regularmente contra 10, 9 ou 8. Aos jogos decididos com lances irregulares, que não duvidosos. Aos jogos que decidem campeonatos. E o aspecto desportivo, significativo no renascimento futebolistico de um grande há anos perdido na mediocridade, caía para segundo plano. Mas não foi suficiente. Foi preciso algo mais. Algo que ninguém contava. Um desses golpes rasteiros. Golpes de uma era que Portugal já tinha enterrado. Mas que vai renascendo, na politica e no desporto. De mão dada o velho país emerge das sombras e dita o ponto final.
Nunca na história do futebol português uma equipa se viu envolvida em dois tunéis tão negros e misteriosos e cujo o resultado sai, em ambos os casos, tão claramente a seu favor. Que dois dos mais determinantes elementos dos seus rivais directos sejam suspensos por três meses é algo inédito. Algo que nem o mais optimista poderia esperar. No caso do FC Porto a suspensão a Hulk foi imediata, antes sequer de haver qualquer decisão tomada de forma oficial. No caso do SC Braga o sadismo de suspender um dos seus elementos nucleares, Vandinho, até ao final da prova precisamente no dia seguinte a fechar o mercado de transferências é, no minimo, insultante. E no entanto, aí estão as coisas. Um clube, dois tuneis, nenhuma suspensão. Nenhuma multa significativa. Nenhuma contra-indicação. O caminho livre rumo ao titulo que tantas figuras públicas, com a habitual falta de vergonho que grassa em Portugal, dizem que salvará a economia nacional. Por outro lado Braga e FC Porto, feridos pelas costas, sabem que o jogo está viciado. A Liga Sagres chegou ao seu ponto final porque assim foi decidido. Não se esperou que o relvado, que a bola, que os 90 minutos fizessem a sua justiça. O medo superou o suspense. A verdade desportiva desapareceu. De vez!
Portugal continua a ser a cauda da Europa em tantos aspectos que surpreendia como é que o futebol tinha escapado a essa nova centralização politico-social do país. A época que poderia ter significado um passo importante para a descentralização emocional e desportiva dá meia volta e mantém o mesmo e triste fado de prisão que amarra todo um país. O futebol continua numa qualquer liga por esse mundo fora. Em Portugal a bola continuará a rolar por mais treze semanas. Mas a Liga Sagres acabou. Ponto final!