Há clubes que marcam pela diferença. Por defender uma causa, por ser o símbolo de uma região, de uma religião ou de um movimento. Há clubes que são verdadeiras bandeiras de uma forma diferente de estar em sociedade. Se hoje na Europa subsiste um clube que representa estes ideais, esse é o Athletic Bilbao.
O início da temporada foi traumático em Bilbao. Os seus adeptos viram, pela primeira vez, a imaculada camisola blanquiroja surgir manchada com um anúncio publicitário. O ano anterior o FC Barcelona tinha vendido a sua virgindade por uma boa causa, o apoio à Unicef, e aberto o precedente do qual se aproveitaria rapidamente a direcção bilbaina, equipa que tinha ficado como a única no mundo que se recusava a vender a sua camisola. A empresa Petronor, basca como a medula de San Mames, teve a honra de fazer historia e o facto de ser uma empresa local diminuiu o choque. Mas percebeu-se rapidamente que algo estava a mudar. O mesmo se pressentia sempre que a direcção falava em abandonar a Catedral, o mítico San Mames, o único estádio inglês fora das ilhas, e construir um novo complexo desportivo, anónimo e funcional como o de qualquer outro clube. A crise económica que se abateu sobre Espanha abafou o tema mas o fantasma continua aí. A pequena lotação do San Mames em comparação com a enorme fila de espera de sócios que esperam por um lugar tem sido uma tentação difícil de lidar. As opiniões dividem-se mas de momento, tudo fica na mesma.
O terceiro esteio do Athletic, o que o faz verdadeiramente diferente neste mundo globalizado, é a lei não inscrita de que em campo, com a camisola vermelha e branca vestida, só podem jogar elementos nascidos em Euskadi. Para os menos informados, Euskadi, ou Pais Vasco, inclui habitantes do sul de França, Navarra, Vizcaya, Alava e Guipuzcoa. Nada mais. Ou seja, jogadores nascidos numa zona que reclama independência há século e que procura, pelo futebol, mostrar a sua brutal diferença com a sociedade espanhola. E se há bandeira de Euskadi viva, essa e o Athletic. Só que até aí têm surgido duvidas. Uns admitem que Lezama – o centro de formação bilbaino – começa a ser pouco para sobreviver numa sociedade globalizada onde todos competem com os melhores trunfos. Dos mais radicais que pedem para acabar com esta limitação aos que defendem que se devia alargar o espectro aos filhos de emigrantes bascos (muitos fugiram de Euskadi depois da guerra civil espanhol em 1939 para os países sul-americanos) desde que se provasse a sua ascendência euskerra, há de tudo. E brevemente haverá também o dilema chamado Jonas Ramalho. É um dos grandes craques da cantera vizcaina mas é negro. Ou seja, não é puramente basco. Para muitos é uma blasfémia. Para outros o futuro. A sua futura chamada á equipa principal é uma questão de meses. Como reagirá a Catedral, é uma pergunta que muitos se fazem. Algo que só o tempo responderá.
Toda esta polémica á volta do ideal do Athletic Bilbao não é inocente. Apesar das limitações financeiras, do estádio pequeno, do plantel reduzida a jogadores locais, a equipa fez historia e voltou a carimbar o acesso a uma final. A final da Taça do Rei, competição que venceu há 25 anos, no ano da dobradinha, e que foi a sua ultima conquista. Era antes da era Bosman onde jogar sem estrangeiros não fazia tanta diferença. Hoje o Athletic Bilbao volta a subir ao relvado de olhos postos num troféu especial. E o clube espanhol com mais taças no seu historial, e por títulos, o terceiro grande de Espanha. O rival é o deslumbrante Barcelona que procura juntar a Taça ao campeonato conquistado no domingo passado antes de medir-se com os diabos de Manchester em Roma. Seja qual for o resultado final hoje á noite em Valência, os homens de Bilbao voltam a provar que ser diferente tem as suas virtudes. Se hoje baterem os rivais catalães farão de novo historia e mostrarão ao mundo que há diferentes formas de estar no futebol. Mas nenhum tão radical como a que se vive em Bilbao. A cidade desse rebelde Athletic.
De João Ribas a 14 de Maio de 2009 às 13:58
Grande Post!
Sempre foi o meu Clube de Admiração em Espanha e nunca vai deixar de o ser. Identifico-me totalmente com a forma de estar, pensar e agir dos Bascos, especialmente a defendida por este Clube. Só é pena não ser Azul e Branco, mas nunca justifiquei o meu Portismo pelo simples facto de vestirem dessa cor. Sou Portista porque simplesmente sou Tripeiro, tal como todos os Flavienses deveriam ser do seu Chaves, os Bracarenses do SC Braga, ou seja, deveriam defender e orgulhar-se das suas Cidades!
Fiquei obviamente sensibilizado com o Post, dado o meu Athletic ser o tema do mesmo. Acabaram por perder, naturalmente, a final da Taça do Rei, mas só o simples facto de no Mestalla terem estado mais Adeptos Bascos que Catalães serviu para mostrar que o Espírito e a Paixão pelo Athletic continua viva como sempre! Foi Lindo!
Os mais despistados esquecem-se que este é o terceiro clubes de Espanha em titulos e o segundo com mais taças ganhas. A Lei Bosman prejudicou mais o Bilbao que a qualquer outra equipa porque a diferença entre os planteis é cada vez maior. Face ás caracteristicas da sua politica uma presença numa final é já um grande mérito (como a participaçao na Champions há uns bons anos o foi também).
É um clube destinado a sofrer neste mundo do futebol de hoje mas que sempre será único e especial. Nesse nivel é provavelmente o clube mais especial da historia do futebol. E o comportamento do publico no Mestalla arrasador.
Um abraço
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