Terça-feira, 23 de Abril de 2013

A história do futebol europeu está repleta de jogos que perduram no tempo. Desde a sua primeira edição até à final da temporada que se disputa. A noite de hoje, em Munique, entra directamente para essa galeria. Em 2009, a caminho da sua mais do que merecida consagração, o Barcelona de Guardiola humilhou o Bayern Munchen por 4-0. Hoje, a super-equipa montada por Jupp Heynckhes, aplicou a mesma dose ao projecto herdado por Villanova. Um jogo onde os alemães foram mais rápidos, mais altos, mais fortes e melhores, muito melhores, ao jogo que consagrou o Barcelona na história do futebol.

Falar em hegemonia do Barça na Champions League tornou-se um lugar comum nos últimos anos.

E no entanto, a não ser que a equipa catalã opere um verdadeiro milagre no Camp Nou - o dia do patrono do clube, Sant Jordi, era hoje - a equipa vai completar um ciclo de cinco anos com apenas dois troféus no bolso. Em 2009 foram a melhor equipa do continente com um modelo inovador, fresco, ofensivo e tão apaixonante que permitia esconder os erros de uma meia-final polémica. Dois anos depois eram mais conscientes do seu papel, mais influentes nos corredores de poder e futebolisticamente muito mais maturos. Foram duas finais brilhantemente conquistadas contra o Manchester United, que permitiu coroar Messi, Xavi, Iniesta mas também Busquets, Piqué e Alves, como os melhores do planeta. E claro, Guardiola, o homem que resgatou a herança da posessão e do estilo centro-europeio. Mas esses foram apenas dois de cinco longos anos. No mesmo período de tempo, Real Madrid, Ajax, Bayern e Liverpool venceram entre três a cinco troféus. 

Na história, nem sempre os ganhadores deixam a sua marca. Essa realidade é indismentível, particularmente no caso de selecções como a Áustria, Hungria, Holanda, França ou Brasil, gerações apaixonantes que no momento da verdade foram derrotadas pelo destino. Mas claro, essa derrota permitiu-lhes entrar no panteão pelo estilo de jogo. O Barcelona actual é um projecto ganhador - como foi o de Cruyff e Rijkaard, equipas igualmente brilhantes - e provou saber vencer em campo muitas vezes de forma magistral. Mas com três eliminações em cinco anos numa meia-final - a confirmar-se a ausência de um milagre no Camp Nou, nunca descartado - pode realmente falar-se de hegemonia futebolistica europeia? Naturalmente, não.

 

Hoje o Bayern Munchen não jogou como o Inter ou o Chelsea, equipas que deixaram a nu a dificuldade crónica do Barcelona em jogar com pouco espaço. Hoje o Bayern Munchen jogou como o Barcelona gostaria de jogar mas já não consegue. Porque fisicamente não é a mesma equipa de há dois anos. Porque o modelo se transformou, com o tempo, num vector central em direcção de Messi quando antes se sentia o espirito colectivo coral de uma geração memorável. Porque Guardiola não está - e Tito Vilanova fez o mesmo em Munique que em Milão, onde esteve ausente, ou seja, nada - e sem ele o projecto faz menos sentido. E porque o Bayern não teve medo de disputar cada bola, de procurar cada lance o espaço mas sem abdicar da sua filosofia, de controlar o ritmo de jogo com a bola e sempre numa movimentação colectiva perfeita.

Robben e Ribery defendiam como Alaba e Lahm atacavam. Javi Martinez foi omnipresente no meio-campo, permitindo a Schweinsteiger vigilar Messi e Xavi, figuras ausentes em campo, espelhos dessa condição física deplorável que também se verificou no ano passado. E Muller, ocupando o lugar de Kroos, foi demolidor, movendo-se em toda a linha de ataque, destroçando marcações e abrindo espaços. Em nenhum momento do jogo existiu a sensação de que o Barcelona podia sentir-se superior. Em nenhum momento do jogo ficou a ideia de que a vitória do Bayern estava em risco. No final surgiu em golos e em dinâmica. Mas, tranquilos, em possessão não. 

Os alemães sobreviveram a uma primeira hora que permitia relembrar semi-finais anteriores na história recente do futebol europeu. Três penaltys por assinalar em trinta minutos prometiam uma péssima exibição do húngaro Viktor Kasai, que eventualmente se confirmou. Mesmo com esse handicaap, a equipa bávara manteve-se viva e activa e antes do intervalo abriu o marcador. Um canto - a defesa espanhola nunca lidou bem com este tipo de lances - uma bola que vai de um lado ao outro da área, salto perfeito de Dante que encontra a cabeça de Muller para abrir a noite de gala. Era um resultado tímido para a hegemonia alemã ao intervalo e ao abrir do segundo tempo, Mario Gomez, tratou de ampliar a vantagem. Estava em fora-de-jogo. Talvez Kasai tivesse visto no intervalo algum lance da primeira parte. Ou talvez seja um árbitro realmente mau. O resultado já era bom mas o Bayern nunca desistiu de procurar mais. O ataque blaugrana foi inofensivo, Messi uma alma penada, a melhor oportunidade acabou por ser de Bartra e seguindo o ritmo natural do encontro, Robben marcou o terceiro e decisivo golo. O golo que tornava a eliminatória um monólogo. Minutos depois, com o relógio a dar os últimos suspiros, Muller fechou a contagem para levar o Allianz ao delírio colectivo. O 4-0 de 2009 estava devolvido e moralmente, da mesma forma que os homens de Guardiola tinham sido insultantemente superiores nesse encontro, agora era a vez de Jupp Heynckhes ajustar contas com o passado e, talvez, com o seu futuro.

 

Desde 1997 que o Barcelona não perdia por uma margem tão grande na Europa. Vencer a eliminatória não é impossível mas os próprios jogadores blaugranas têm consciência de que seria necessário uma imagem radicalmente diferente e uma eficácia tremenda para dar a volta a esta situação. Dificilmente se pode considerar o final de um ciclo para os espanhóis. Na época passada o resultado foi o mesmo. Para os alemães, sim, a vitória histórica de hoje entra na galeria das suas noites mais brilhantes nas provas europeias. E depois da brilhante campanha do ano passado, da final perdida em 2010, parece claro que hoje o Bayern Munchen pode presumir de ser a equipa mais forte do planeta futebol. Só falta um título para confirmar, simbolicamente, a qualidade desta geração. 180 minutos para completar um ciclo memorável.



publicado por Miguel Lourenço Pereira às 21:39 | link do post | comentar

25 comentários:
De Miguel Lourenço Pereira a 24 de Abril de 2013 às 15:00
PTM,

O Barça foi campeão espanhol porque o único rival desistiu de jogar à oitava jornada. Tem todo o mérito, sem dúvida, mas enquanto o Real teve de ombrear até perto do fim com a equipa de Guardiola e foi ao campo do inimigo vencer, este Barcelona não venceu um só duelo directo e beneficiou-se do clima de guerra cívil instalado no balneário do Madrid, muito por culpa de Mourinho.

O seu modelo está em crise há 2 anos. Já no ano passado os sintomas se sentiam e a equipa acabou o ano só com a Copa del Rey. Esta temporada, salvo milagre, fa-lo-á só com esta liga. É muito pouco para uma equipa que, dizem, é a melhor de todos os tempos. Eu viajo na história e vejo os registos de outros clubes que foram bem mais hegemónicos na sua era e que também tinham estilos de jogo repletos de novidades, eram equipas de ataque, apostavam na prata da casa e marcaram a história. Há leitores deste espaço fieis, porque sempre comentam, e autores de outros espaços que deixei de ler há muito, que acreditam que a Humanidade começou em 2009. Força com isso!

Guardiola foi uma aposta estética da directiva do Bayern, uma prova de força e pujança face ao futebol inglês. O clube foi moldado por um dos seus mentores, van Gaal, e haverá pouco que mudar. Robben sairá e Gotze será um misto de Messi e Iniesta. Faltará um avançado mais associativo (Lewandowski ou o próprio Muller) e um defesa com mais critério (Martinez recuado ou Hummells) e não verás nenhuma diferença com o seu Barcelona. Guardiola é um génio, até a escolher o destino!


De PTM a 24 de Abril de 2013 às 16:01
Miguel

O Barça não tem culpa do Real ter desistido de lutar pelo campeonato. O falhanço do Real será maior se não conquistar a champions que o do Barcelona. Um clube como o Real não pode atirar a tolha ao chão na 8a jornada e apostar todas as fichas na champions, especialmente quando tem adversários perfeitamente acessíveis na liga interna.

a falta de plano b no barcelona é desconfortável de observar. Mais que um purismo ideológico o que transparece é uma inaptidão de contornar dificuldades que, estranhamente, não foram contempladas


De Miguel Lourenço Pereira a 24 de Abril de 2013 às 17:45
PTM,

Naturalmente que não, fez o seu trabalho e fê-lo bem, por isso será campeão com uma vantagem tremenda. Mas isso não invalida que uma liga onde o rival, seja qual for, atira a toalha ao chão - como é habitual no Real Madrid quando é campeão europeu aliás - mas que depois leva a palma nos confrontos directos, seja moralmente menos interessante que uma disputa taco a taco até ao fim.

O Barcelona não tem plano B desde o principio. Agora que o A esgotou é que muitos se lembraram dessa realidade!


De Eugenio a 26 de Abril de 2013 às 01:58
Como quase tudo que envolva o Barcelona a sua opinião sobre Guardiola parece um pouco menorizadora...

Enfim, achar que o Guardiola vai montar a mesma coisa que tinha na Catalunha até chega a ter graça, porque, como é bem sabido, nem mesmo lá ele fez isso. Todos os anos houve mudanças estruturais tanto na constituição da equipa como no modo como jogaram. Umas funcionaram melhor que outras, obviamente, mas o Guardiola sempre olhou para a frente, sempre saiu da sua zona de conforto e trouxe noutras ideias. Pessoalmente, a minha preferida foi ter reinventado para melhor o Messi quando ele já era o melhor do mundo. Com ele chegarão à Baviera novas ideias (impensáveis para o comum adepto) para o futebol da equipa, mais uma vez e sem dúvida alguma.

Em ultima instância há que admitir que escolheu bem o sítio onde ia parar, foi pregar para onde o queriam ouvir. Ou assim era quando assinou...

Quanto à análise ao jogo, deve ser para nem levar a sério. Também é algo habitual por aqui. O que é uma pena, porque noutros temas tiro-lhe o chapéu.


De Miguel Lourenço Pereira a 26 de Abril de 2013 às 12:33
Eugénio,

Achar que a minha posição sobre Guardiola, que considero como o treinador de futebol mais importante das últimas décadas, é menorizadora, cria um sério problema aos restantes treinadores do Mundo.

Guardiola seguiu um modelo que tem 100 anos. Optimizou-o de forma genial, não só no aspecto táctico como em questões de motivação, preparação física e trabalho colectivo. O seu Barcelona, sobretudo o de 2009 e 2011 - os mais dinâmicos, verticais e ofensivos - é algo para guardar num quadro em qualquer hall of fame. Na Baviera naturalmente que encontrará uma cultura local com uma identidade muito forte mas que parte da mesma matriz centenária. A essa matriz ele aproveitará por incluir a sua visão pessoal - foi para isso que o chamaram - e por explorar a maior mina de ouro do futebol mundial actual que é o futebol alemão e o poder do Bayern sobre ele. As contratações de Kirchoff, Rode, Gotze e, eventualmente, Lewandowski provam-no bem. Mesmo que este ano o Bayern vença tudo o que há para ganhar, seguramente para o ano Pep saberá dar-lhes apetite para mais.

Quanto ao jogo, não tenho nada a dizer a não ser o que não está no texto. Cada um é livre de pensar o que quiser.


Comentar post

.O Autor

Miguel Lourenço Pereira

Novembro 2014
Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab

1

2
3
4
5
6
7
8

9
10
11
12
13
14
15

16
17
18
19
20
21
22

23
24
25
26
27
28
29

30


Ultimas Actualizações

Toni Kroos, el Maestro In...

Portugal, começar de novo...

O circo português

Porta de entrada a outro ...

Os génios malditos alemãe...

Últimos Comentários
Thank you for some other informative web site. Whe...
Só espero que os Merengues consigam levar a melhor...
O Universo do Desporto é um projeto com quase cinc...
ManostaxxGerador Automatico de ideias para topicos...
ManostaxxSaiba onde estão os seus filhos, esposo/a...
Posts mais comentados
69 comentários
64 comentários
47 comentários
arquivos

Novembro 2014

Outubro 2014

Setembro 2014

Agosto 2014

Julho 2014

Junho 2014

Maio 2014

Abril 2014

Março 2014

Fevereiro 2014

Janeiro 2014

Dezembro 2013

Novembro 2013

Outubro 2013

Setembro 2013

Agosto 2013

Julho 2013

Junho 2013

Maio 2013

Abril 2013

Março 2013

Fevereiro 2013

Janeiro 2013

Dezembro 2012

Novembro 2012

Outubro 2012

Setembro 2012

Agosto 2012

Julho 2012

Junho 2012

Maio 2012

Abril 2012

Março 2012

Fevereiro 2012

Janeiro 2012

Dezembro 2011

Novembro 2011

Outubro 2011

Setembro 2011

Agosto 2011

Julho 2011

Junho 2011

Maio 2011

Abril 2011

Março 2011

Fevereiro 2011

Janeiro 2011

Dezembro 2010

Novembro 2010

Outubro 2010

Setembro 2010

Agosto 2010

Julho 2010

Junho 2010

Maio 2010

Abril 2010

Março 2010

Fevereiro 2010

Janeiro 2010

Dezembro 2009

Novembro 2009

Outubro 2009

Setembro 2009

Agosto 2009

Julho 2009

Junho 2009

Maio 2009

Abril 2009

.Em Destaque


UEFA Champions League

UEFA Europe League

Liga Sagres

Premier League

La Liga

Serie A

Bundesliga

Ligue 1
.Do Autor
Cinema
.Blogs Futebol
4-4-2
4-3-3
Brigada Azul
Busca Talentos
Catenaccio
Descubre Promesas
Desporto e Lazer Online
El Enganche
El Fichaje Estrella
Finta e Remate
Futebol Artte
Futebolar
Futebolês
Futebol Finance
Futebol PT
Futebol Total
Jogo de Área
Jogo Directo
Las Claves de Johan Cruyff
Lateral Esquerdo
Livre Indirecto
Ojeador Internacional
Olheiros.net
Olheiros Ao Serviço
O Mais Credível
Perlas del Futbol
Planeta de Futebol
Portistas de Bancada
Porto em Formação
Primeiro Toque
Reflexão Portista
Relvado
Treinador de Futebol
Ze do Boné
Zero Zero

Outros Blogs...

A Flauta Mágica
A Cidade Surpreendente
Avesso dos Ponteiros
Despertar da Mente
E Deus Criou a Mulher
Renovar o Porto
My SenSeS
.Futebol Nacional

ORGANISMOS
Federeção Portuguesa Futebol
APAF
ANTF
Sindicato Jogadores

CLUBES
Futebol Clube do Porto
Sporting CP
SL Benfica
SC Braga
Nacional Madeira
Maritimo SC
Vitória SC
Leixões
Vitoria Setúbal
Paços de Ferreira
União de Leiria
Olhanense
Académica Coimbra
Belenenses
Naval 1 de Maio
Rio Ave
.Imprensa

IMPRENSA PORTUGUESA DESPORTIVA
O Jogo
A Bola
Record
Infordesporto
Mais Futebol

IMPRENSA PORTUGUESA GENERALISTA
Publico
Jornal de Noticias
Diario de Noticias

TV PORTUGUESA
RTP
SIC
TVI
Sport TV
Golo TV

RADIOS PORTUGUESAS
TSF
Rádio Renascença
Antena 1


INGLATERRA
Times
Evening Standard
World Soccer
BBC
Sky News
ITV
Manchester United Live Stream

FRANÇA
France Football
Onze
L´Equipe
Le Monde
Liberation

ITALIA
Gazzeta dello Sport
Corriere dello Sport

ESPANHA
Marca
As
Mundo Deportivo
Sport
El Mundo
El Pais
La Vanguardia
Don Balon

ALEMANHA
Kicker

BRASIL
Globo
Gazeta Esportiva
Categorias

a gloriosa era dos managers

a historia dos mundiais

adeptos

africa

alemanha

america do sul

analise

argentina

artistas

balon d´or

barcelona

bayern munchen

biografias

bota de ouro

braga

brasileirão

bundesliga

calcio

can

champions league

colaboraçoes

copa america

corrupção

curiosidades

defesas

dinamarca

economia

em jogo

entrevistas

equipamentos

eredevise

espanha

euro 2008

euro 2012

euro sub21

euro2016

europe league

europeus

extremos

fc porto

fifa

fifa award

finanças

formação

futebol internacional

futebol magazine

futebol nacional

futebol portugues

goleadores

guarda-redes

historia

historicos

jovens promessas

la liga

liga belga

liga escocesa

liga espanhola

liga europa

liga sagres

liga ucraniana

liga vitalis

ligas europeias

ligue 1

livros

manchester united

medios

mercado

mundiais

mundial 2010

mundial 2014

mundial 2018/2022

mundial de clubes

mundial sub-20

noites europeias

nostalgia

obituário

onze do ano

opinião

polemica

politica

portugal

premier league

premios

real madrid

santuários

seleção

selecções

serie a

sl benfica

sociedade

south africa stop

sporting

taça confederações

taça portugal

taça uefa

tactica

treinadores

treino

ucrania

uefa

todas as tags

subscrever feeds