Quinta-feira, 4 de Março de 2010

Os amigáveis de preparação são sempre terrenos de areias movediças. Vive-se na dúvida e incerteza de perceber onde está o real e onde pulula o imaginário. O campo é rectangular mas o jogo não é quadrado e a dúvida, o direito à dúvida, sempre persiste a cada golo suspeito de uma facilidade que no futuro pode não existir. No entanto as migalhas não deixam pistas e permitem entender que a maturidade competitiva é algo genético. Para o bem e para o mal.

Mergulhamos em quatro estádios ao mesmo tempo. O olhar desvia-nos a acção, os replays concentram a atenção. Quatro, melhor dito, oito realidades lado a lado que deixam pistas importantes e enganos imperdoáveis. Saber qual é qual, aí está o truque. Que poucos dominam. É possível imaginar o leitor a fixar-se apenas no resultado final e cingir-se ao números. O futebol é isso. Números puros e duros. O jogo, a estética, o sofrimento. Isso conta durante 90 minutos. Depois esvanece-se em números. Em cálculos. 0-1, 2-0, 0-2, 3-1. Quatro resultados, oito números. Muitas mentiras encobertas. Não fosse o futebol uma caixa de surpresas e poderiamos tecer já criticas e elogios, antecipar campeões e anunciar derrotados. Mas estamos a 98 dias do inicio da prova mais esperada dos últimos quatro anos. Muitas enfermarias ainda se irão encher com estrelas que nunca pisarão as relvas africanas. Muitos nomes consagrados chorarão ao não ouvir o seu nome. E muitos se surpreenderão com escolhas bem mais polémicas.

No entanto há algo que fica bem patente. A natureza das equipas está, não nos berrantes equipamentos que vão surgindo, mas no seu ADN de jogo. Na forma como encaram cada encontro, amigável ou não. A disciplina táctica, o empenho, a determinação. Essa é a madeira dos campeões, o ponto final que faz a diferença num momento de aperto. Tudo o resto é pura sorte. Pura ilusão e fantasia. Há equipas cujo o ADN está feito para ganhar. Desde sempre. Outras sofreram mutações, progressivas, e hoje são o que nunca se imaginou que seriam. E há aquelas que, pura e simplesmente, nunca mudam. Ontem vimos de tudo. Espelhos preciosos, dicas importantes, realidades imutáveis. Pelo menos em três meses.

Assim é Espanha. Assim é Portugal. Por um lado o ADN perfeito. Uma equipa com um leque de opções imensas, que se dá ao luxo de deixar no banco o melhor jogador do Mundo e, mesmo assim, mandar no jogo. Uma equipa com sorte no ADN - que o diga Ramos, que o diga Casillas - mas que a procura constantemente. Espanha controla, Espanha remata, Espanha finta. Mas, acima de tudo, Espanha deixou de ser a débil fúria. Agora é uma equipa organizada que controla os tempos de jogo. Que sabe encurtar e estender o terreno, que tanto joga em 4-5-1, dando a bola aos seus elementos mais criativos, como aposta num 4-4-2 mais vertical com o apoio dos seus extremos velozes. Com soluções tácticas e de elementos, é no entanto na mentalidade que se nota a real superioridade do jogo espanhol. O ADN da Roja é ganhador por natureza. Os jogadores trocam a bola com confiança. Com claridade. Podem enganar-se, mas assumem o risco. E é assim que desbloqueiam jogos complicados. O de ontem, frente a uma França que já foi assim, há largos anos, era um desses. E a dupla valenciana Silva-Villa assumiu o risco. Ganhou. Está-lhes no ADN.

 

Por outro lado Portugal é uma equipa sem código genético.

Uma equipa amorfa, tensa e nervosa. Não tem coragem para fazer um passe mais largo, mais arriscado. Gosta de ralentizar, de jogar em águas pouco profundas. Troca a bola com segurança numa zona que sabe que domina, pegada à linha de meio-campo. Aí é forte e segura. Atrás teme. À frente teme. Constante temor que nem uma frágil China consegue alterar. Num jogo de preparação Portugal não testou nada. Nem um sistema táctico alternativo ao imposto 4-3-3. Nem jogadores novos ao lote de eleitos. Nem uma nova mentalidade. Jogou como sempre. Lento, para os lados, sem coragem de galopar. De dar o golpe final. Cristiano Ronaldo, uma vez mais assobiado por um público que tem o mesmo ADN da equipa, foi o único a procurar a verticalidade. Mas rema só. Ninguém o segue. Ninguém o entende. É de outra realidade. O problema português não está na goleada que não o foi. Está na debilidade que nunca deixou de ser. Sem Deco (e com Micael a continuar fora dos eleitos, mesmo com a lesão a poder tapar a falta de coragem do seleccionador), Portugal é uma equipa que não pensa o jogo. Está aí, simplesmente, à espera. Nani corre muito, mas joga pouco. A bola é que se deve mover, não o homem. Um principio básico que Nani ainda não compreendeu. Talvez nunca o faça. Meireles e Tiago são macios, débeis e sem coragem para arriscar. Dão segurança no processo de contenção. Mas são como uma folha em branco. Vazios de ideias. E claro, há Hugo Almeida, essa torre só, que se dá mal com a responsabilidade. A baliza encolhe a cada golpe seu. O ADN português ainda não mudou com Queiroz. Talvez nunca mude. Há coisas que a vida não deixa evoluir.

Se a França decai a olhos vistos (a dupla atacante de ontem escalada por Domenech é a mesma que há 10 anos eliminou Portugal do Euro 2000) a Alemanha rejuvenesce de uma forma assustadoramente atraente. Perdeu, é certo. Mas estas são as mentiras de este jogos. A Argentina pode vencer, apesar de Maradona. Não graças a ele. Tem matéria-prima suficiente para estar aí, entre os melhores. A Inglaterra venceu, graças a Capello. Os ingleses começam a mutar o seu ADN. A organização e as transições de jogo capellianas adequam-se bem à raça e determinação britânicas. Talvez em 2012 os Pross sejam a melhor equipa da Europa. Estão a caminho.

Mas o caso mais curioso é mesmo o de Joachim Low. O seleccionador alemão é um case-study autêntico. Adjunto do mediático Klinsmann, trouxe uma disciplina à Mannschaft que o técnico de 2006 nunca impôs. Com ele a equipa é mais segura e determinada. E no entanto, também é mais criativa. E descarada. Low fez o que poucos seleccionadores alemães se atraveriam a fazer. Rejuvenesceu a equipa nacional. A mentalidade germânica sempre defendeu a ideia de que só uma larga carreira dava direito a um lugar na equipa nacional. Low aposta pela juventude, sem passado mas com um futuro de ouro. Nos últimos encontros - oficiais ou não - fez estrear mais de 10 novos jogadores. Todos eles de um futuro promissor. A maioria deles irá à África do Sul. E mesmo assim a equipa se mantém fiel ao seu ADN ciníco, competitivo e eficaz.

Pode ter perdido ontem, mas o futebol engana. E muito. Hoje por hoje o ADN alemão está muito por cima do ADN argentino. E quando for a doer, isso contará mais do que o talento. Assim se decidem campeões. 



publicado por Miguel Lourenço Pereira às 09:46 | link do post | comentar

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